Nesses anos 50 do século passado, em pleno fascismo, qual a estrutura fundiária e os modos de exploração da terra nos campos do distrito de Beja? Portugal na década de 1950 é um país maioritariamente agrícola e o Alentejo, nomeadamente, o distrito de Beja, é a expressão clara desta realidade.Nas duas décadas anteriores, muito devido à campanha do trigo lançada em 1929, assiste-se, a sul, a um aumento significativo da área semeada deste cereal e ao crescimento da população ativa na agricultura. Este incremento agrícola não se faz, no entanto, pela via da intensificação da produção nem pela mecanização, mas sim pelo aumento da área cultivada, onde os pequenos seareiros desempenham um papel fundamental desbravando o mato das piores terras do latifúndio com base em contratos de parceria à terça, à quarta ou à quinta. E tudo isto ocorre num quadro duma estrutura fundiária onde domina a grande propriedade, com cerca de dois por cento dos proprietários agrícolas a serem detentores de perto de 50 por cento da área agrícola do Baixo Alentejo, num contexto económico e social onde pequenos proprietários, rendeiros e seareiros, bem como os assalariados rurais, vivem mergulhados em condições de vida muito duras. Em termos de formas de exploração da terra, no distrito de Beja, domina a exploração por conta própria. No entanto, nos concelhos de piores terras o arrendamento e a parceria atingem um peso significativo, caso de Castro Verde, onde 76 por cento da terra é explorada sob a forma desta última modalidade: a parceria. A explicação reside no facto de ser, para os proprietários, mais lucrativa esta forma de exploração do que por conta própria, ou seja, com recurso a mão de obra assalariada. É de sublinhar, ainda, a existência nesta década, no Baixo Alentejo, segundo o “Inquérito Agrícola de 1952”, de 14 705 explorações agrícolas familiares, 73 por cento do total, facto bem revelador do peso social e económico importante dos pequenos e médios agricultores, os quais, apesar da pouca terra que possuem, ajudam a viabilizar os vários ofícios sediados nas vilas ligados ao trabalho do campo: ferradores, ferreiros, albardeiros, abegões, etc..
Qual a tecnologia agrícola utilizada então e que mudanças houve, nesse aspeto, nesses anos?Na década de 1950, apesar do modelo de desenvolvimento agrícola referido, assente na conquista de incultos sem alteração dos modos de produção, estar a dar sinais de esgotamento, ainda é a tração animal que domina e onde o trabalho braçal nas tarefas agrícolas (ceifa, debulha, monda, apanha da azeitona, etc.) desempenha um papel fundamental. Um bom exemplo desta realidade é a situação existente em 1948, à entrada, portanto, da década de 1950, na herdade dos Machados, um latifúndio com 6000 hectares do concelho de Moura, onde, a par dos dois únicos tratores existentes, a tração animal é fornecida por 44 mulas, 20 burros, 170 bois e 80 vacas e onde se empregam permanentemente 450 homens, a que se somam 100 a 150 mulheres na monda, 60 a 80 homens na ceifa e 250 homens e 350 mulheres na apanha da azeitona. No entanto, é nos anos 50 do século passado que o processo de mecanização começa a ter o seu incremento, atingindo valores significativos na década seguinte. Para se ter uma ideia desta mecanização real, mas muito lenta, basta referir que de 1952 a 1960, em todo o Alentejo, passa-se de 1401 a 3894 tratores e de zero ceifeiras-debulhadoras a 278.
Quem trabalhava a terra, quem eram os proprietários?Atendendo aos dados estatísticos, verifica-se que em 1950, no distrito de Beja, existem 69 679 assalariados rurais, o que significa 83,3 por cento da população ativa agrícola. Apesar da importância em número, peso social e económico das classes intermédias dos campos do Baixo Alentejo, como referido, a esmagadora maioria do trabalho agrícola é efetuada pelos assalariados rurais, aos quais se juntam em determinadas épocas do ano, nomeadamente, durante o período das ceifas, ranchos de trabalhadores – homens e mulheres – provenientes, sobretudo, do Algarve. Os grandes proprietários, os que possuem mais de 500 hectares, são poucos, não mais de dois por cento, mas as suas explorações ocupam cerca de 50 por cento da área agrícola disponível do Baixo Alentejo. Vivem, em regra, na sede do concelho em habitações bem reveladoras da posição social ocupada, e que é a cimeira numa estrutura social fortemente hierarquizada que tem na base os trabalhadores de jorna. São ainda estes grandes proprietários agrícolas que controlam todo o aparelho político e corporativo local do “Estado Novo”.