Diário do Alentejo

O que é hoje o comer? : Caldeirada de peixe do rio

04 de outubro 2025 - 08:00
Foto | Ricardo ZambujoFoto | Ricardo Zambujo

Texto | Ana Filipa Sousa de Sousa  Fotos | Ricardo Zambujo

 

José Santana61 anosPedrógão do Alentejo (Vidigueira)

 

De rede branca na mão, José Santana entra no rio. Apesar do calor que se tem feito sentir nos últimos dias, a manhã e a companhia dos amigos são convidativas para a pesca da tarrafa – uma técnica de pescar com uma rede circular com pequenos pesos distribuídos em torno de toda a circunferência da malha. Mas embora o clima seja de convívio, o “silêncio” é o segredo “para a apanha” do peixe e a algazarra fica guardada para mais tarde. Em tempos, conta ao “Diário do Alentejo”, “o peixe dava sempre”, principalmente, barbo, boga, achigã, pardelha, saramugo e verdemã, mas, com o passar dos anos, as mudanças sofridas no rio e, consequentemente, as alterações das espécies, foram fazendo com que a pesca em água doce, naquela zona, fosse perdendo praticantes.“São os novos tempos. [Os mais novos] já não querem, ainda há uns mocinhos que pescam à cana, mas...”, diz. José Santana recorda que começou a pescar “sozinho”. “Foi de noite, quando a barragem estava cheia [e] debaixo da ponte. Fui lá com um moço e [pedi-lhe para me] deixar fazer um lance [e] comecei a partir daí. Comecei a encegueirar-me e depois fui aperfeiçoando”, admite. Após quase uma hora a percorrer as águas límpidas da ribeira do Odiasse, na localidade de Pedrógão do Alentejo, no concelho de Vidigueira, José Santana e o sobrinho saem, finalmente, do rio e começam a preparar a bancada improvisada na carrinha de caixa aberta. Com os taipais para baixo, colocam o fogão e a garrafa de gás em cima da viatura que, de repente, se transforma numa autêntica cozinha ao ar livre. O calor começa a apertar, e entre um copo e outro de vinho branco o grupo de amigos olha atento para José Santana, que coloca mãos à obra na preparação do almoço. “Sempre gostei de cozinhar, já a minha avó era cozinheira e a minha mãe gostava da cozinha. E eu, também, logo em pequeno, ia para o rio com uma mochila às costas com a tarrafa, apanhava peixe e fazia a caldeirada sozinho”, lembra. Com o refogado ao lume – com cebola, azeite “do verdadeiro”, poejo, sal, tomate e pimento verde –, José Santana diz, com um sorriso, que as filhas e o sobrinho têm vindo a aprender a receita do seu prato de caldeirada com peixe do rio e que é um gosto fazê-lo para os seus amigos e familiares. Enquanto o refogado abre o apetite, o cozinheiro de serviço dá início à preparação do peixe, desta vez barbo. “Desde que o fogo esteja feito não demora muito. Mais ou menos, meia hora ou 40 minutos. Ao fim e ao cabo o que demora mais tempo na caldeirada é a preparação”, assegura. Depois de arranjado, o peixe é deixado “em vinagre”, para “amolecer as espinhas”, cerca de 10 minutos e, enquanto isso, José Santana acrescenta três piripiris para “ajudar a dar sabor”. O aroma do cozinhado espalha-se no ar. À volta da pequena bancada improvisada, os amigos fazem perguntas sobre os ingredientes e o ofício da pesca e abordam um ou outro assunto corriqueiro. “Neste caso aqui, para este tacho, acho que tenho de meter uns quatro [litros de água], porque somos muitos”, explica. Enquanto o prato apura, é hora de se fatiar o pão caseiro – “um pão mais consistente e que se aguenta” – para as tradicionais “sopas”. “Não costumo comer pão assim, porque como eu costumo dizer: pão fatiado é pão à malandro”, graceja. Com o peixe adicionado ao preparado – “o peixe coze muito rápido e mais cinco minutos e está pronto” –, finaliza-se com um pouco de vinho branco “para ficar com aquele sabor”. À sua espera e, especialmente, do almoço que acabou de preparar, os companheiros apressam-se a colocar a mesa e a encher, uma vez mais, os copos de vinho. “[E aqui está] a minha caldeirada de peixe do rio, feita mesmo junto ao rio”, ri, enquanto pousa a travessa.

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