Diário do Alentejo

Nómadas-Digitais, de mochila e computador na mão

22 de abril 2022 - 16:30
Há cada vez mais pessoas a adotar o estilo de vida de nómadas-digitais e a trabalhar enquanto viajam.

Portugal foi classificado como o melhor local nómada-digital na Europa Ocidental, com oito por cento da comunidade a residir no país, segundo um estudo realizado pelo site da especialidade, A Brother Abroad.

 

Texto Ana Filipa Sousa de Sousa

 

O clima temperado, o custo de vida mais acessível, a segurança, a facilidade e qualidade logística das infraestruturas, a gastronomia e as “gentes acolhedoras” são algumas das características que estão a colocar Portugal e, consequentemente, o Alentejo como ponto de chegada de diversos nómadas-digitais. Estes vêm à procura das paisagens alentejanas, das ondas da costa e do equilíbrio entre o sossego e a aventura que a região possui. Trazem e levam consigo o essencial para desfrutar por tempo indeterminado do que lhes é oferecido e o imprescindível para trabalhar remotamente: um computador portátil, um telemóvel, um power-bank (carregador portátil de baterias) e uma banda-larga de acesso à internet.

 

“Os nómadas digitais são trabalhadores que, por apenas necessitarem de um computador ou outro meio tecnológico para desempenharem a sua atividade profissional, estão em constante movimento para qualquer parte do mundo. São essencialmente pessoas que gostam de viajar e aproveitar o facto de trabalharem à distância para conhecer diferentes sítios de um modo mais ou menos prologado”, explica ao “Diário do Alentejo” (“DA”) o nómada-digital Pedro Lebre, que agora se encontra esporadicamente fixo em Vila Nova de Milfontes à espera do seu segundo filho. Este “estilo de vida” não pode ser comparado com o “trabalho remoto a 100 por cento” a que nos habituámos nos últimos anos, uma vez que estes “trabalhadores escolhem fazê-lo a partir de um lugar certo, normalmente a partir de casa”, enquanto os nómadas-digitais podem mudar de país a cada mês, acrescenta.

 

Este tipo de nomadismo diverge consoante a própria pessoa e a sua profissão. Segundo o mais recente estudo, realizado e publicado pelo A Brother Abroad, 83 por cento dos nómadas-digitais são trabalhadores autónomos, ou seja, como não estão ‘presos’ a uma mesa de escritório, apenas necessitam de se conectar a um ponto de internet para enviar aos seus clientes ou empresas os trabalhos realizados em modo offline, como é o caso dos designers gráficos, tradutores, músicos ou ilustradores. Por sua vez, 17 por cento são trabalhadores por conta de outrem, o que implica que cumpram horários fixos ligados a um servidor de internet, mesmo que exercendo as suas atividades laborais à distância, como por exemplo professores ou técnicos de apoio ao cliente.

 

Para Pedro Lebre, a possibilidade de viajar constantemente, a gestão entre a vida pessoal e profissional, o tempo e as despesas poupadas diariamente em deslocações até às sedes de trabalho, e a disponibilidade para outras atividades de enriquecimento pessoal e familiar, são alguns dos pontos positivos que destaca para quem segue uma vida de nómada-digital. A par destas surgem outras vantagens ambientais, económicas e populacionais que enriquecem os países. “Por exemplo, a nível ambiental, com menos trânsito e consumo energético dentro das grandes cidades, estas tornam-se ambientalmente menos sobrecarregadas, por sua vez com a fixação temporária de nómadas-digitais em zonas do interior é possível haver um maior investimento nessas áreas que combate a desertificação e estimula as regiões anteriormente paradas”, esclarece ao “DA”. Contrariamente, o técnico de apoio ao cliente que passou por sete países do sudeste asiático admite que as relações interpessoais entre colegas, a comunicação e a distinção entre vida pessoal e profissional ficam facilmente condicionadas pela instabilidade de “estarmos constantemente em viagem”.

 

OITO POR CENTO DOS NÓMADAS-DIGITAIS SÃO PORTUGUESES

Os Estados Unidos da América, Portugal, Alemanha e Brasil representam mais de metade (51 por cento) das nacionalidades de nómadas-digitais que percorrem o mundo. A nacionalidade portuguesa é a segunda, com oito por cento, das mais comuns entre os viajantes, só perdendo para a americana, com 31 por cento.

 

Pedro Lebre, de 46 anos, é um dos portugueses que, espicaçado por “uma certa rebeldia e aversão ao status quo estabelecido”, vendeu os seus bens pessoais e da estrutura empresarial onde era acionista maioritário e partiu “para um destino já planeado, mas sem uma data de regresso definida”, o sudeste asiático. A viagem, que estava estimada para quatro meses, foi alargada para nove e, após visitar sete países distintos, regressou a Portugal com a sua companheira grávida que conhecera num projeto de voluntariado no Camboja, um dos países asiáticos por onde passou.

 

“Entretanto, ficou o gosto imenso por explorar cada vez mais lugares deste mundo maravilhoso em que vivemos e surgiu a apetência cada vez maior de procurar formas de trabalho que nos permitissem viajar. No final de 2019 deslocámo-nos novamente ao sudeste asiático e aí já consegui conciliar o lazer e o desfrutar das belezas da região com o meu trabalho, efetuando na mesma os meus turnos na empresa com normalidade”, revela.

 

Condicionado em parte pela pandemia, optou por trabalhar presencialmente durante oito meses na reestruturação da empresa familiar, mas recentemente voltou ao “trabalho 100 por cento remoto que tinha anteriormente”. “Ironias do destino ou não, estamos neste preciso momento a poucos dias ou semanas de sermos pais pela segunda vez e acolher na nossa família mais um pequeno nómada e lá terei de comprar mais uma mochila”, conta, orgulhoso, Pedro Lebre.

 

COSTA ALENTEJANA ALVO DE PROJETO PARA ATRAIR NÓMADAS-DIGITAIS

O alentejano Pedro Lebre, por ser também ele conhecedor do mundo nómada e das potencialidades do Alentejo encontra-se agora a operar no seu novo projeto Southwest Coast Digital Nomads. Este, ainda em fase de “pré-lançamento”, “pretende criar uma comunidade de nómadas-digitais na Costa Alentejana através da qual se possam cruzar e trocar informações relevantes para a comunidade, principalmente pelas redes sociais, e procurar satisfazer as suas necessidades, ao mesmo tempo que se pretende ajudar a desenvolver a economia local e regional”, explica.

 

O objetivo principal passa por “tocar no coração das pessoas”, desde nómadas, a locais, a agentes políticos e económicos, uma vez que “as vantagens e os benefícios serão para todos e com uma perspetiva duradoura no tempo, especialmente numa região que possui uma economia muito dependente do turismo e da oscilação, óbvia, da sua sazonalidade”, conclui.

 

(CAIXA)

PORTUGAL ELEITO MELHOR DESTINO PARA NÓMADAS-DIGITAIS

A Kayak, empresa norte-americana de planeamento de viagens, colocou, recentemente, Portugal em primeiro lugar num ranking de 111 países como o melhor destino para se trabalhar remotamente. O estudo atribuiu-lhe uma percentagem de 100 por cento tendo como base 22 fatores, como saúde e segurança, vida social, clima e preço de aluguer de casas.

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