“Sinto que vim de Oslo com uma mentalidade diferente. Sem dúvida que me ajudou a crescer. O projeto ajuda-nos a ter uma visão diferente do futebol enquanto desporto, mas, sobretudo, ensina-nos o que é o respeito mútuo. Valoriza-nos socialmente. Senti claramente essa evolução, esse meu crescimento. Senti que foi uma experiência que me fez crescer. Uma experiência que repetiria já amanhã”.
Texto e Foto Firmino Paixão
Uma afirmação do jovem barranquenho Rúben Costa, de 22 anos, operário de uma empresa de transformação artesanal de carnes, na sua terra natal, décimo sexto jogador do distrito de Beja a participar no Campeonato do Mundo de Futebol de Rua (Homeless World Cup), competição que teve lugar em Oslo, na Noruega, onde a seleção de Portugal se sagrou vice-campeã mundial. O melhor resultado de sempre em torneios mundiais.
“Fizemos um belíssimo torneio. Foi, sem dúvida, um grande campeonato do mundo. Ficámos a dois golos de conquistarmos o título mundial para Portugal. Perdemos a final com o Egito, por 3-2, mas fizemos história”, revelou o atleta que, na época 2015/2016, se estreou nos escalões de formação do Barrancos Futebol Clube, preparando-se para encetar a nona época consecutiva ao serviço da formação raiana. Com “repichuchi”, claro, e com um sentimento de orgulho ainda fresco.
“Sinto um orgulho enorme, primeiro, por ter sido escolhido para a seleção que representou Portugal no mundial da Noruega, depois, ainda mais orgulhoso pela brilhante prestação que a equipa conseguiu”. Uma aventura que se iniciou com a participação, bem-sucedida, de uma equipa de Barrancos no Torneio Distrital de Futebol de Rua. “Vim com uma equipa de amigos da minha terra, a prova correu-nos bem, vencemos o torneio e, seguramente, foi aí que o sonho começou a desenhar-se. Naturalmente, com a ajuda dos meus amigos, pelo que estou imensamente agradecido por isso. Sem o contributo deles talvez não tivesse sido possível concretizar este sonho”.
O talento que evidenciou ao longo da prova proporcionou-lhe o passo seguinte, o reconhecimento de Fábio Pacheco, coordenador local do Projeto de Futebol de Rua. “Mais tarde fui convocado para a seleção que representou o distrito de Beja no torneio nacional que, curiosamente, neste ano, também se disputou na cidade de Beja. Senti-me muito feliz”.
Bruno Sêco, selecionador nacional, acompanhou a competição e a performance de Rúben Costa não escapou ao seu radar, chamando-o para integrar a equipa nacional que haveria de disputar o mundial na Noruega. Uma surpresa? “Sinceramente que não esperava, apesar de o torneio nos ter corrido bem. Quis apenas viver aquele momento, porque já era importante estar na seleção distrital, agora, não escondo que tinha o sonho de poder, um dia, ser convocado para a seleção nacional e representar o meu país”, admitiu o jovem atleta, cuja pronúncia denuncia a origem e as suas vivências na raia alentejana. Quando teve conhecimento da convocatória de Bruno Sêco sentiu “um orgulho enorme”. “Fiquei muito feliz, nem encontro palavras para descrever esse momento. Senti que ia levar o nome de Barrancos mais além, o nome da minha terra e também desta região. Só posso estar orgulhoso por isso”.
A opinião que formou do selecionador nacional também foi marcante. “O selecionador Bruno Sêco é uma pessoa extraordinária, tem muito bom coração, transmite uma mensagem que nos toca profundamente. É uma pessoa que gostei muito de ter conhecido e de ter convivido durante esta minha experiência. Uma pessoa que nos proporcionou momentos inesquecíveis”. Uma experiência memorável, já se viu: “Trouxe, essencialmente, a memória de uma semana bem passada entre colegas. Não conseguimos ser campeões, algo que, desde o início, era o nosso grande objetivo, mas vivi uma experiência inesquecível, que foi a amizade, o companheirismo e o sentimento de união que conseguimos, algo que ficará para o resto da vida. Essencialmente, porque foi o futebol de rua que me abriu a oportunidade de representar o nosso país. Fomos sempre um grupo muito unido, foi uma equipa que reuniu atletas de diferentes origens, mas criámos uma relação, e um tal espírito de grupo, que parecia que já nos conhecíamos de uma vida inteira”.
O futebol de rua, para além da sua componente desportiva, “é um instrumento de capacitação, de desenvolvimento de competências pessoais e sociais”, define a Associação Cais. De que forma terá Rúben sentido isso? “Sinto que vim de Oslo com uma mentalidade diferente. Sem dúvida que me ajudou a crescer. O projeto ajuda-nos a ter uma visão diferente do futebol enquanto desporto, mas, sobretudo, ensina-nos o que é o respeito mútuo, valoriza-nos socialmente e eu senti claramente essa evolução, esse crescimento. Senti que foi uma experiência que me fez crescer. Uma experiência que repetiria já amanhã”, garantiu, de forma peremptória. Por outro lado, reconheceu: “O futebol de rua é uma modalidade pela qual fiquei apaixonado desde o primeiro dia em que a comecei a praticar. Tem muitas diferenças, além de que proporciona que alguns jovens concretizem sonhos de infância, como foi o meu caso, com esta presença no mundial de Oslo. O sonho de qualquer jovem que se inicie no futebol é poder um dia representar o nosso país e o futebol de rua deu-me essa oportunidade. Jamais esquecerei…”.
Depois, a emoção de ouvir a “Portuguesa” no início de cada jogo e, especialmente, na final, frente ao Egito. “Arrepia-nos muito. Ouvir o hino em casa, quando vemos jogar as nossas seleções, é muito bom, mas ouvi-lo com a camisola da seleção vestida e sentir que estamos ali a representar o nosso país é uma experiência marcante, é um sentimento único e emocionante”.
A sua presença em Oslo já é passado, inesquecível, admitamos, mas o futuro é já amanhã. Um tempo para colocar ao serviço do seu clube as aprendizagens que colheu em terras norueguesas. “Foi uma aprendizagem muito útil para mim, enquanto jogador do Barrancos, sobretudo, pelos valores que estão associados ao futebol de rua”.