Diário do Alentejo

Sofia Pica, a mais jovem árbitra de futebol do conselho de arbitragem da AFBeja

07 de setembro 2025 - 08:00
Psicologia e arbitragem
Foto | Firmino PaixãoFoto | Firmino Paixão

“Vou para o 11.º ano, na escola Dom Manuel I, em Beja. Estou na área de Humanidades. Nunca deixarei de estudar por causa da arbitragem. Quero tirar um curso superior, preferencialmente na área de Psicologia. Sempre foi uma área que me interessou bastante, sempre fui muito de ouvir as outras pessoas, de falar com elas e de tentar ajudar confortando-as com palavras. É uma área da qual eu gosto muito. Adoro mesmo”.

 

Texto Firmino Paixão

 

Uma arquitetura de futuro projetada pela jovem Sofia Pica, com 16 anos recentemente comemorados, que, enquanto não concretiza esse legítimo sonho académico, está a dar os primeiros passos na arbitragem do futebol. Será, porventura, a mais jovem entre a meia dúzia de árbitras filiadas no conselho regional de arbitragem, da Associação de Futebol de Beja (AFBeja).

Tem raízes em Serpa mas, desde muito nova, que mora em Beja e foi aqui que o interesse nasceu: “À medida que ia crescendo, comecei a interessar-me mais pela área do futebol, mais por causa do meu pai que, desde essa altura, já andava na arbitragem”. Com um sorriso fácil e uma expressão empática, Sofia Pica admitiu: “Tenho, de facto, muita facilidade em me relacionar com as pessoas, em fazer amizades e conservá-las, sim, porque os amigos e as amigas, quando são verdadeiros, ficam para sempre. Acredito que sejam fiéis e que achem que eu sou uma boa rapariga. Para já, não tenho queixas, acredito que sou uma boa pessoa, aliás, faço tudo para que seja assim, principalmente porque gosto imenso de ajudar os outros, considero-me uma pessoa muito generosa e solidária”.

Aprendeu a nadar, o que foi muito útil, mas nunca se sentiu atraída por outros desportos, porém, com a arbitragem, teve quem provocasse a ignição: “Foi algo que surgiu por causa do meu pai, Ricardo Diogo, ele já era, e ainda é, árbitro de futebol, aliás na minha família paterna existem muitos árbitros, antigos e atuais. Ouvia falar em arbitragem, desde os quatro anos que quase não ouvia mais nada senão falar em árbitros e arbitragens. Comecei a interessar-me e, ao mesmo tempo, o meu pai também começou a incentivar-me, digamos que me empurrava um bocadinho para essa área. Aos fins de semana ele ia sempre arbitrar jogos. Muitas vezes levava-me. E pronto: tomei-lhe o gosto e aqui estou. O meu pai continua a ser a minha maior inspiração. É o meu ídolo”.

Nunca pensou que isto era coisa de homens? – provocámo-la: “Não! Nunca pensei nisso. Repare que cada vez existem mais mulheres na arbitragem, o próprio futebol feminino também tem crescido imenso. Mas os homens não têm exclusividade em nenhuma das áreas, seja no futebol, como nas suas vertentes. As mulheres são tão capazes quanto os homens. Cada vez temos mais mulheres nas diferentes profissões e a desempenhar altos cargos, temos até já árbitras internacionais muito conceituadas”. Nem mais Sofia… Então vamos lá convencer mais mulheres a seguirem-lhe o exemplo. E como? “É necessário incentivar mais raparigas para aderirem à arbitragem, acho que ainda existe muito aquele preconceito, de que falávamos, de que isto é coisa para homens, e essa ideia ainda existe um pouco na nossa sociedade e não ajuda muito que elas venham. Por outro lado, aquelas que gostam de futebol vão mais jogar nos clubes e não vêm tanto para a arbitragem”.

No ano passado habilitou-se com o curso de árbitra de futebol e a classificação final até foi elevada, algo de que se orgulha: “Confesso que, antes, não percebia muito de futebol, comecei a entender mais quando comecei o curso e aprendi as leis de jogo. Fizemos quase todo o curso on line, tivemos apenas duas aulas presenciais, uma para os testes e outra em campo, para entendermos a sinalética e o posicionamento no terreno de jogo”. Testámo-la, perguntando-lhe quantas leis tem o futebol e quando é que um jogador está fora de jogo. A resposta estava na ponta da língua e foi certeira. A Sofia promete ser uma árbitra pedagoga, mas exigente no cumprimento das leis, e adiantou: “A seriedade, a honestidade, são qualidades que devem caminhar sempre ao nosso lado ao longo da vida e não só no futebol. Também não devemos ser arrogantes, nem mesmo com os jogadores, ainda que eles se dirijam a nós de uma certa maneira. Temos de ter calma, não podemos ser agressivas com eles, porque isso só pode piorar as coisas”.

Terminado o curso e enquanto a época não começa, a Sofia confessou: “Tenho continuado a minha aprendizagem, ainda não dirigi jogos, mas tenho feito de árbitra assistente. Porém, a época está quase a iniciar-se e, então, espero ser nomeada para dirigir alguns jogos. Naturalmente que espero iniciar pelas camadas jovens, principalmente no futebol de nove. Serão momentos importantes para ganhar mais experiência na sinalética e no diálogo com os jogadores, mas sinto que tenho evoluído, tenho tido muito apoio, sei que errar será uma coisa normal, estamos sempre a aprender, mesmo os grandes árbitros também, de vez em quando, têm o seu dia mau”. E a estratégia já está delineada: “Os miúdos entenderão melhor se dialogarmos com eles, mas isso não significa estimular a indisciplina. Temos de aplicar as regras com todo o rigor”.

Sofia Pica tem sonhos. Claro, aos 16 anos quem não os tem? Mas é prudente: “Sei que temos de ter sempre os pés bem assentes no chão. Temos de ter cabecinha para nos irmos valorizando e humildade para percebermos que cada jogo será um momento de aprendizagem. Estou esperançada de um dia poder atingir o patamar nacional. É isso o que mais quero. É esse o meu sonho. Ter começado cedo já me ajudou, porque a margem de progressão é maior, agora é preciso calma, serenidade e, sobretudo, disponibilidade para aprender”. Com a época prestes a iniciar-se, ou melhor, as épocas, a académica e a desportiva, a jovem admitiu que tem sido melhor aluna do que árbitra: “Sem dúvida! Mas acredito que consigo conciliar as duas coisas”. As escolhas que tem feito, o caminho que está a percorrer, proporcionam-lhe felicidade, e isso, sim, importa mais do que tudo. “Estou muito feliz e acredito que tenho feito as melhores escolhas. Por outro lado, tenho sentido muito o apoio da minha família, os meus pais ajudam-me muito, tenho um irmão mais novo, o Martim, com sete anos, mas ele quer é ser jogador de futebol”. Força, Sofia…

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