A seleção feminina do Projeto de Futebol de Rua-Beja conquistou o quarto título nacional em cinco edições realizadas. Na competição masculina triunfou a seleção de Aveiro. A competição reuniu na cidade de Beja, ao longo de três dias, 18 equipas masculinas e 11 femininas, entre elas, duas delegações convidadas vindas do México e da Polónia.
Texto Firmino Paixão
“Jogámos muito com coração e com a alma bejense”, confessou, ainda em lágrimas, Ana Rita Batista, a capitã da seleção de Beja, que converteu a grande penalidade com que as bejenses venceram a final, contra a equipa de Viseu, que lhes garantiu o título nacional. Porém, admitiu: “O apoio do público fez toda a diferença. Foi por aí que nós ganhámos o jogo, mas lutámos até ao fim. O que eu mais queria era ganhar, emocionei-me porque vivo muito o futebol de rua, é um desporto que as pessoas devem apoiar cada vez mais”.
Já no ocaso da carreira de futebolista, a jogadora anunciou: “Este é o meu terceiro título nacional. Este título tem muita importância para mim, porque este é um desporto que inclui inúmeras aprendizagens, por isso, tentamos trazer novas raparigas para crescerem como jogadoras e como mulheres. Mas a equipa masculina também é o nosso orgulho, estiveram sempre connosco”.
Mais à frente foi o tempo da equipa masculina de Viseu celebrar idêntico sucesso. O segundo título nacional em 13 anos, e ambos com sotaque alentejano. O responsável técnico, Bruno Sêco, admitiu: “Procurávamos este título há 13 anos. Aveiro tinha sido campeão nacional em 2012, aqui em Beja, há 13 anos que andávamos atrás do sonho e, na verdade, voltámos a ser muito felizes aqui nesta cidade”.
O conjunto masculino que representou o distrito de Beja não foi além do nono posto da tabela. Gonçalo Lourenço, técnico da equipa, considerou: “Sentimos uma dificuldade que é a inexistência de um campo para treinarmos. Achamos que estará para breve, mas isso faz toda a diferença. Quase todas as equipas treinam e quando chegamos às fases finais os detalhes custam caro”. Mas ainda admitiu: “Pecámos em detalhes, em que isso não podia ter acontecido, mas também não tivemos a pontinha de sorte que já tivemos noutras alturas. Tudo isso faz parte da competição”.
O Projeto Shave Escolhas, do Centro Social, Cultural e Recreativo do Bairro da Esperança, fechou a competição masculina no oitavo lugar, prestação que, segundo Saiming Fonta, o líder da equipa, superou as expectativas. “Não foi apenas um jogo, foi uma oportunidade de incluir, capacitar e fazer acreditar”.
O “Diário do Alentejo” cruzou-se, também, com o bejense Francisco Seita, membro da equipa técnica nacional de futebol de rua, que sublinhou: “É sempre um enorme gosto trazer este projeto que é tão especial à minha cidade, porque é uma forma de eu mostrar uma coisa de que tanto gosto, que é mostrar a minha cidade aos meus amigos e de mostrar os meus amigos à minha cidade. Ou seja, mostrar o projeto e mostrar a cidade, unindo estas duas paixões que tenho, que é a cidade de Beja e o futebol de rua”. E evidenciou também: “Foram três dias espetaculares dentro e fora de campo. Observar a forma amigável como estes miúdos se dão entre si, acabando este torneio com amizades que perdurarão por muitos anos, é muito confortante, porque, afinal, o futebol é uma excelente ferramenta quando utilizada da melhor forma”.
“Todos contam” “No futebol de rua, todos contam”, recordou Gonçalo Santos, o coordenador do Projeto Nacional de Futebol de Rua da Associação Cais, reforçando a ideia com a afirmação de que “o futebol de rua é de todos e para todos, e em Beja ainda é muito mais”.
No balanço aos três dias de competição, período em que se disputaram 90 jogos, o dirigente nacional observou: “O nível desportivo está a crescer e isso penso que é para benefício de todos e de todas. A competição feminina cresceu neste ano, com um número recorde de equipas, 11 no total, a final juntou as campeãs nacionais de 2024, Viseu com as tricampeãs nacionais. A seleção de Beja conseguiu mais um título em casa, numa final amplamente disputada por duas equipas merecedoras do título, mas, de facto, tem sempre um sabor especial que um dos troféus em disputa fique na cidade anfitriã”.
No plano social, e, que as traves mestras são a inclusão e a capacitação, Gonçalo Santos recordou: “Tivemos, como é hábito, uma agenda dividida entre o plano desportivo e atividades culturais e recreativas, promovidas pelo nosso parceiro, a Câmara Municipal de Beja, e atividades formativas promovidas por outros parceiros, nomeadamente, o Erasmos+Juventude e Desporto (IPDJ) e o BLive”.
A intenção do futebol de rua, completou: “É que todos os jovens que aqui estiveram, através das várias atividades e dos diferentes workshops, saiam de cá mais capacitados, mais ricos e com mais ferramentas para as suas vidas. Notamos hoje uma grande evolução na capacitação dos nossos beneficiários, e isto é um ecossistema que permite não só o acesso ao desporto, mas também a capacitação e o desenvolvimento pessoal e social de todos e de todas quantos nele participam. Beja é especial. Beja vive o futebol de rua e é sempre um gosto enorme voltar a Beja”.
Quanto à possibilidade de a competição voltar a Beja, distrito onde a modalidade tem mais praticantes, correspondendo à disponibilidade do município, revelada na cerimónia de abertura, o coordenador da modalidade fez notar: “Esse foi um desafio que a Câmara Municipal de Beja nos lançou logo no próprio dia do sorteio. Um desafio que nós aceitámos e confirmámos durante a cerimónia de entrega dos troféus. É essa a nossa vontade e a vontade da equipa que trabalhou connosco para erguer este evento e esperemos, então, em 2026, voltar a Beja, para sermos tão bem acolhidos como fomos em 2025”. E lembrou: “Este torneio é uma prova desportiva. Iremos ter sempre campeões e campeãs em campo. Mas o nosso objetivo é ajudar a criar campeões e campeãs para a vida, fora da quadra, fora das quatro linhas. É esse o nosso objetivo e acho que junto com os nossos parceiros temos conseguido um resultado e um impacto muito simpático”.
Os sonhos e as emoções
Bruno Sêco, técnico que esteve em Beja na dupla função de selecionador do distrito de Aveiro, mas também de selecionador nacional, terá pouco tempo para dar largas às emoções do título e cumprir o desejo de “aproveitar o estado emocional que os jogadores estão a viver após a conquista do título, pois agora é possível meter-lhes os sonhos na cabeça: o sonho de voltarem a estudar, o sonho de procurarem um emprego, o sonho de terem uma família, as emoções de voltarem a ser felizes, é isso que procuramos através destas vitórias”.
Nos dias 22 a 30 deste, Oslo (Noruega) receberá o mundial (Homeless World Cup), onde a representação de Portugal se apresentará com as escolhas de Bruno Sêco. O selecionador confessou: “Tenho as minhas escolhas feitas, mas confesso que tive muita dificuldade em escolher. Falta apenas a aceitação dos jogadores. Saber se terão disponibilidade para integrar a seleção”. Ainda assim, considerou: “Tive realmente um olhar mais amplo e concluo que o meu trabalho de selecionador está cada vez mais difícil. Cada vez surgem mais jogadores de qualidade, mais entrega e mais vontade de vencer e de dar o máximo no sentido de se conseguir alcançar os tais sonhos. É só essa a mensagem que lhes queremos passar para a vida: sonhem alto, coloquem a fasquia bem lá em cima e, passo a passo, façam o que é preciso fazer para a alcançar”.
Na sessão de abertura do torneio nacional, o município de beja homenageou Francisco Seita, técnico nacional, e todos os jogadores do distrito que já participaram em campeonatos do mundo de futebol de rua.
Resultados
Torneio seleções femininasResultados: Beja-Porto, 8-0; Beja-Polónia, 6-2; Beja--Setúbal, 7-0; Beja-Faro, 6-2; Beja-Guarda, 4-3. Beja--Viseu, 3-3 (1-0 gp.)Classificação: 1.º Beja. 2.º Viseu. 3.º Guarda. 4.º Castelo Branco. 5.º México.6.º Polónia. 7.º Lisboa. 8.º Faro. 9.º Setúbal. 10.º Açores. 11.º Porto.
Torneio seleções mistas/masculinaResultados: Beja-Setúbal, 3-3 (0-1 gp.); Beja--Polónia, 3-1; Beja-Leiria, 5-2; Beja-Viseu, 10-11; Lisboa-Beja, 2-5; Madeira-Beja, 3-2; Beja-Lisboa, 6-5. Porto-Shave/Beja, 2-3; Madeira-Shave/Beja, 6-1; Açores-Shave/Beja, 3-7¸ Shave/Beja-Coimbra, 5-1; Shave/Beja-Setúbal, 1-3.1.º Aveiro. 2.º Madeira. 3.º Guarda. 4.º Castelo Branco. 5.º México. 6.º Viseu. 7.º Setúbal. 8.º Shave/Beja. 9.º Beja. 10.º Lisboa. 11.º Braga. 12.º Porto. 13.º Polónia. 14.º Coimbra. 15.º Leiria. 16.º Viana do Castelo. 17.º Faro. 18.º Açores.
Mundiais de Futebol de Rua (jogadores do distrito): 2006, África do Sul, Nuno Correia; 2010, Brasil, Flávio Pereira; 2013, Polónia, Carlos Ferreira e Paulo Nunes; 2015, Holanda, Miguel Romão; 2016, Escócia, Fábio Pacheco; 2017, Noruega, Ruben Borrego e Luís Conceição; 2018, México, Gonçalo Lourenço; 2019, País de Gales, Tiago Dias; 2022 (Mundialito), Espanha, Ana Costa e André Quintos; 2023, Estados Unidos, André Quintos; 2024, Coreia do Sul, Mara Guerreiro e Sandro Cavaco.