É, agora, claro que “a baixa de natalidade registada durante os anos da troika” se está a fazer sentir. Segundo a Dgeec, no ano passado, assistiu-se a uma diminuição de cerca de cinco mil alunos no 1.º ciclo, e a previsão é de que até 2020/21 as escolas públicas percam cerca de 100 mil estudantes, em relação aos números de há cinco anos. Na região do Alentejo, no início do século os alunos matriculados foram 75 996, número que compara com os 54 334 que por estes dias começam mais um ano letivo: menos 21 mil, uma redução de 29 por cento. Pior só no Baixo Alentejo, onde a percentagem aumenta para os 34 por cento: em 2000/01 inscreveram-se 20 140 alunos, e agora são apenas 13 376.
Josefa Lopes, dirigente do Sindicato Democrático dos Professores do Sul, diz que, apesar dos números registados serem “preocupantes”, estão em linha com a média nacional. Para a sindicalista, estes valores não são ainda piores porque “a escolaridade obrigatória aumentou para 12 anos”, e, “felizmente, tem-se assistido a uma redução do abandono escolar”.
Manuel Nobre, do Sindicato dos Professores da Zona Sul, concorda que o aumento da escolaridade “disfarçou” a questão, mas não a resolveu. Em sua opinião, “o problema não é só do Alentejo, mas reflete uma realidade que é de todo o País, e, em particular, do interior”, e que resulta das “políticas erradas” que têm sido seguidas.
“Em 2002 o investimento na educação era de 5,8 do PIB; em 2018 foi apenas de 3,7”, denuncia Manuel Nobre, tentando mostrar o “desinvestimento” nesta na área que “é preciso inverter”, nomeadamente, repondo os serviços públicos que foram eliminados (CTT, GNR, juntas de freguesia, serviços de finanças, etc.) e “contribuíram para o despovoamento destas regiões”. Josefa Lopes afina pelo mesmo diapasão. “Fecharam muitas escolas, principalmente, do 1.º ciclo, prejudicando seriamente as pequenas comunidades”.
Maria Filomena Mendes, professora da Universidade de Évora, com doutoramento em Demografia e Sociologia, diz que esta realidade “agora é difícil de contrariar”. “No caso do Baixo Alentejo tem havido alguma recuperação, mas a redução foi tão grande que mesmo atingido uma taxa de natalidade de 2,1 [aquela que permite a substituição de gerações] não irá ser suficiente”, conclui. É que “desde os anos 80 que as gerações são menores”, e, nos últimos anos, a saída de casais jovens para o litoral ou para o estrangeiro “veio agudizar o problema”.
Para a investigadora, a solução pode passar pela imigração, mas também (ou acima de tudo) por “uma política de incentivos à fixação de jovens, que tem de ser equacionada e ser efetiva, de forma a motivar os jovens casais que estão no litoral a regressarem, e os que cá estão a permanecer”.
MENOS PROFESSORES, FUNCIONÁRIOS E ESCOLAS
A quebra do número de professores, desde a pré-primária ao secundário, entre 2008/09 e 2017/18, foi de 31 147, um valor que Josefa Lopes considera não estar em “conformidade com a redução do número de alunos”, e que Manuel Nobre corrobora. “Em 10 anos perderam-se 16 por cento dos docentes”. Isto aconteceu porque, segundo os sindicalistas ouvidos pelo “DA”, as escolas foram concentradas em mega agrupamentos, esquecendo as escolas de proximidade, houve um aumento do número de alunos por turma, e um aumento da carga horária dos professores.
Luísa S., professora do primeiro ciclo há 26 anos num pequeno agrupamento escolar do Alentejo, considera que “toda esta situação cria uma insegurança e uma instabilidade profissional e pessoal nos professores”. “Desde o ano 2000 que se tem assistido ao encerramento de muitas escolas do primeiro ciclo. Esse encerramento era inevitável, uma vez que os alunos precisam de pares para crescer social, afetiva e pedagogicamente. Por outro lado, as aldeias veem-se privadas das suas crianças perdendo toda a alegria e energia dos miúdos”, diz. Receando que “professores que estão integrados há muitos anos”, de repente, se possam ver na eminência de “terem de começar tudo de novo”.
Quanto ao segundo e terceiro ciclos, a questão é mais preocupante devido ao reduzido número de alunos e, consequentemente, de turmas, o que a médio/longo prazo levará certamente ao encerramento de alguns agrupamentos que serão absorvidos por outros maiores. “Este afastamento irá reduzir o tempo que estes jovens têm para si: tempo para o estudo, para a brincadeira, para a prática de atividades”, conclui Luísa Sousa.
Apesar de este ano o Governo ter decidido reduzir o número de alunos por turma, nos primeiros anos de cada ciclo, Josefa Lopes diz que a medida “algum impacto terá, mas será pouco significativo”. Já Manuel Nobre defende que o Governo, “sem criar uma despesa adicional, devia reduzir ainda mais o número de alunos”, o que traria ganhos evidentes em termos de aprendizagem.