O artigo de opinião da primeira página do número 1, “Na hora da largada”, assinado por Ilídio Perfeito, assumia também para o jornal o “objectivo de propaganda intensiva da região de que quere ser o arauto vibrante, activo, desempoeirado”. E, já nessa época distante, queixava-se do abandono a que era votada “a terra sagrada do Alentejo donde sai a maior parte do pão que nos alimenta a todos quantos nascemos nesta faixa de terreno que se chama Portugal”. Assim: “No tocante a benefícios, melhoramentos, progressos, por via dos poderes públicos, entre as restantes províncias do País, o Alentejo é a ‘terra de ninguém…’. Porque a nossa posição de intérmina planície aquém do Tejo, em verdade, presta-se até certo ponto a confusões lamentáveis, de natureza geográfica, para os não iniciados, e sabe-se, de sobejo, que o velho Terreiro do Paço não é, positivamente, um portento em corografia…”.
“Continuidade honesta”
A publicação diária do “Diário do Alentejo” mantém-se sem sobressaltos ao longo de mais de duas décadas – com uma linha editorial regionalista e independente, mantendo o formato de quatro páginas, com seis edições por semana, visado pela Censura fascista – mas, a 7 de abril de 1955, morre com 82 anos Carlos Augusto das Dores Marques, um dos dois fundadores e proprietários.
A edição do dia seguinte dá alguns pormenores sobre o seu trajeto: “estudou no Liceu de Beja” e “dedicou-se, desde muito cedo, às lides jornalísticas, principiando por trabalhar na administração do antigo semanário ‘9 de Julho’, onde escreveu também as suas primeiras composições literárias. Mais tarde, em 1906, montou uma pequena tipografia, fundando ‘O Porvir’, outro semanário local também já desaparecido”. Em 1919, estabelece sociedade com o seu “dedicado amigo” Manuel Engana e abrem uma livraria. “Exímio praticante de violino” e, quando jovem, “talentoso amador teatral”, era pai do então chefe de redação do “Diário do Alentejo” e “distinto pintor” Carlos Dores Marques. Com a morte do seu sócio e amigo, Manuel Engana adquiriu aos herdeiros de Carlos Marques “a outra metade da firma, que passou, assim, à sua exclusiva propriedade”.
O jornal continuou a ser publicado regularmente. A Censura fascista fazia-se sentir: ao longo da Guerra de Espanha e da II Guerra Mundial, raras eram as notícias sobre os conflitos, apenas se podendo ler referências sobre eles nos artigos de opinião. Mais tarde, também sobre a guerra colonial só eram publicados os comunicados oficiais com as mortes dos militares em África. Em 26 de fevereiro de 1968, novo luto, “profundo, acabrunhante”: morre Manuel Engana, um dos fundadores e então o único proprietário, que foi também “o seu mais forte sustentáculo, o seu firme dirigente, o seu mais activo e fiel servidor”, “o homem a quem o ‘Diário do Alentejo’ deve a parte principal do seu aparecimento arrojado e da sua continuidade honesta”.
Assume então as funções de diretor e editor Manuel de Melo Garrido, “jornalista de larga experiência profissional, elemento efectivo do nosso quadro de redactores desde o primeiro número e que, seu chefe de redação desde 1955, foi o mais directo e mais próximo colaborador de Manuel António Engana na sua acção directiva”. Melo Garrido, concluídos os estudos no Liceu de Beja, exercera “intensa actividade no jornalismo desportivo em dois semanários locais – ‘Ala Esquerda’ e ‘Porvir’ – e no antigo ‘Sports’, de Lisboa”, antes de entrar para o “Diário do Alentejo”, em 1932.