Rossana Torres, 59 anos, natural de Roménia
Nasceu na Roménia, durante o exílio político de seus pais. Estudou Artes Visuais e Cinema. Vive em Mértola, onde fundou a associação Entre Imagem, que se dedica à produção e realização de filmes e a atividades culturais e pedagógicas. Leciona fotografia e vídeo e orienta oficinas de cinema e de cinema de animação para crianças e jovens. Colabora com a associação Os Filhos de Lumière no estudo, conceção e implementação de programas pedagógicos de educação artística em cinema.
“Água Mãe”, o quarto filme realizado por Rossana Torres e Hiroatsu Suzuki, filmado integralmente em Mértola, acaba de vencer o prémio principal da competição portuguesa do Doclisboa 2025 – Festival Internacional de Cinema Documental de Lisboa.
Como nos apresenta este filme?
É uma obra poética com uma cadência harmoniosa de imagens e sons, que leva o espectador a contemplar pequenos movimentos e variações, até que cada um encontra o seu caminho, a sua leitura e interpretação para essa sucessão de imagens e sons. A sinopse – “Mértola, o rio Guadiana, um lugar com antigos moinhos de água onde se moía farinha para o pão. Um lugar onde vivem aves e pessoas relaxam (…)” – pode ajudar a percebê-lo melhor, mas só vendo o filme, numa sala de cinema, cada espectador pode interpretar o que viu e sentiu.
São as águas “encantadas” do Guadiana a principal personagem desta obra?
A personagem principal pode ser a água que ora corre furiosa, ora para e se suspende. Pode ser um dos moinhos de água, imponente e omnipresente. Pode ser a autora do texto que relata um sonho que teve, contaminando todos os planos até ao final.
Quais as características desta obra que conquistaram o júri do Doclisboa?
Não sei dizer muito sobre isso, visto não ter tido nunca como objetivo conquistar qualquer júri. Um dos objetivos era, com certeza, poder mostrar o filme em grande ecrã e poder trazer amigos e familiares da minha mãe, Manuela, num encontro em sua homenagem. A frase que o júri escreveu quando anunciou o prémio ajuda a entender melhor como o filme foi recebido, também por nós: “Uma obra elegante e corajosa que eleva o quotidiano ao sublime, convidando-nos a experienciar um mundo para lá do cinema”.
Remete-nos este filme para a possibilidade de se viver, efetivamente, para lá da cinematografia, a alegria do vagar, da contemplação?
Como realizadora não posso falar do lugar de quem vê o filme pela primeira ou segunda vez, porque no processo de montagem do filme há um trabalho intenso, repetitivo e de experiências “tentativa/erro” em que ambos mergulhámos durante cinco meses. No entanto, consigo ainda ser espectadora e continuar a ser surpreendida com novas leituras que surgem. Isso dá-me uma grande alegria.
Há um gosto especial de vencer com a “calmaria de Mértola” no bulício de Lisboa?
Gosto muito de viver em Mértola. Para mim, já é a minha terra, já vivo cá há mais tempo do que vivi em qualquer outro lugar. Ir a Lisboa só é bom durante um ou dois dias – para ir ao cinema e ver amigos. Ver filmes e levar um filme ao Doclisboa é, também, um bom pretexto para ir até lá. Mas logo no dia a seguir o que eu mais quero é voltar para a nossa “calmaria”, sim! Aproveito aqui para agradecer a todos os que felicitaram este reconhecimento, desejo vida eterna ao rio e à paisagem do Alentejo e vivas ao cinema.
José Serrano