Diário do Alentejo

“Que venham para cá para respeitar a nossa cultura, a nossa religião”

10 de maio 2025 - 08:00
Entrevista a Rui Cristina | Cabeça-de-lista do Chega pelo círculo eleitoral de Beja

Depois de ter sido eleito deputado em 2019 e 2022 por Faro, pelo PSD, e em 2024 por Évora, pelo Chega, Rui Cristina apresenta-se a estas eleições como candidato do Chega pelo círculo eleitoral de Beja. Uma entrevista em que aborda as questões da segurança, da imigração, da Saúde e dos acessos, mas também da gestão da água e da importância da agricultura, assegurando que, se for eleito, cumprirá o seu mandato até ao fim.

 

Texto Marco Monteiro Cândido

Fotos Ricardo Zambujo

 

O que motivou a sua candidatura no círculo eleitoral de Beja, pelo Chega, depois de já o ter feito por Évora e antes por Faro, nesse caso, pelo PSD?

Antes de mais, venho ser candidato a um distrito de baixa densidade e, como sabe, fui eleito pelo distrito de Évora, que é um distrito que também sofre praticamente das mesmas carências. Sei o que é defender um distrito de baixa densidade, tenho essa experiência, e tenho experiência parlamentar. Também sei o que é fazer parte de um distrito que muitas vezes é esquecido pelo governo central e, como tal, estou cá para ser uma voz ativa na defesa intransigente das necessidades do distrito de Beja.

 

Referiu, recentemente, que foi essa experiência parlamentar que pesou na sua escolha para este círculo eleitoral. No entanto, a deputada Diva Ribeiro já tinha mostrado a sua disponibilidade para continuar…

Isso foi uma escolha pessoal do líder do nosso partido, André Ventura. Mas penso que tenha pesado muito a minha experiência parlamentar. Não sei se sabe, mas eu sou o coordenador da Comissão de Saúde, na Assembleia da República, pelo grupo parlamentar, e fomos a comissão, fomos o partido, que apresentou mais propostas naquela comissão. Tem sido um trabalho sempre de muito esforço na defesa intransigente, onde estava, dos eborenses, e agora de Beja. Porque em distritos como estes – um distrito tão grande que é o maior do País, estamos a falar de um distrito com 10 263 quilómetros quadrados –, muitas vezes quem está em Lisboa não olha com olhos de ver, ou seja, um distrito com tanta potencialidade, e que muitas das vezes não tem as infraestruturas necessárias, não é olhado com proximidade, e cabe-nos a nós, representantes deste distrito, sermos a voz mais alta lá e irmos ao encontro das necessidades que aqui há. Mas, para isso, temos de bater o pé, temos de ser fortes na nossa luta por aquilo que este distrito tanto precisa: melhores infraestruturas, mais habitação, temos de combater este despovoamento. Houve aqui um êxodo nos últimos 10 anos. Perdemos 10 por cento da população na última década, isto tem de ser combatido, mas só pode ser combatido se houver aqui pontos de atração dentro deste distrito que tem tanto para dar.

 

No que diz respeito às eleições, depois do aumento nas Legislativas de há um ano, o Chega perdeu fôlego nas Europeias e na Madeira. Quais são as perspetivas para as Legislativas de dia 18 no distrito de Beja?

As eleições europeias são muito diferentes das Legislativas, como nós sabemos. E sabemos também que a ilha da Madeira é uma realidade completamente diferente. Aqui, nós acreditamos que iremos ter um excelente resultado, estamos a lutar para sermos Governo em Portugal. Sabemos que não é fácil, mas isto só depende das pessoas. Nós temos um programa eleitoral bastante forte, iremos ter também um programa eleitoral direcionado unicamente para este distrito, e eu acredito que nós somos a verdadeira alternativa. Nós nunca governámos, nunca nos foi dado essa oportunidade, queremos, esperamos, que nos deem esta oportunidade para demostrarmos o nosso valor. Só assim é que saberemos o quanto e onde é que poderemos chegar. E eu acredito que nós somos a verdadeira alternativa.

 

No círculo eleitoral de Beja, nas Legislativas de há um ano, o Chega subiu cerca de 10 000 votos em relação a 2022. Votos conquistados, fundamentalmente, ao PS e à abstenção. Tendo em conta os casos que têm assolado o partido, a votação poderá ressentir-se, nomeadamente, em relação aos abstencionistas crónicos e aos desiludidos que votaram no Chega nas últimas eleições?

Eu não acredito...

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Deixe-me concretizar: poderão chegar à conclusão de que o Chega tem os mesmos problemas que todos os outros partidos, ou, nas palavras de muitos dirigentes do Chega, que “são todos iguais”?

Há uma grande diferenciação. Nós tivemos ali alguns casos pontuais, a comunicação social também não nos tem favorecido em nada, sinceramente. Nós não podemos comparar alguém que tem ali algum distúrbio, alguma insanidade… Eu nem sei como é que hei de descrever esses casos… Nós não podemos comparar isso com quem realmente desvia milhares ou milhões de euros do erário público. O que eu posso dizer-lhe, sinceramente, é que acho que isso não irá fazer diferença. Se as pessoas analisarem o programa eleitoral, se se aperceberem que somos um partido novo com seis anos, temos algumas dores de crescimento, como todos os partidos novos têm. Eu acho que nós, neste momento, percebemos que poderemos fazer aqui a verdadeira diferença, tanto a nível do País, como a nível da região.

 

No distrito de Beja, segundo o Relatório Anual de Segurança Interna (RASI), de 2023 para 2024, os números da criminalidade geral e violenta baixaram. Como é que encara estes dados?

Eles baixaram, mas o que é estranho, é que eu, como se sabe, sou do Algarve, conheço bem a região do Algarve, fui eleito pelo distrito de Évora, fiquei a conhecer muito bem o distrito de Évora, e aquilo que eu tenho visto, e aquilo que eu tenho ouvido, não vai ao encontro desse relatório e isso é que me indigna. No outro dia estive em Moura, para ter uma ideia, e explicaram-me como é que a etnia cigana estava integrada em Moura, e fez-me uma grande espécie, ou seja, muitas pessoas a queixarem-se que são vítimas de violência da parte da etnia cigana, que lhes fazem pressão. E perguntei: “Mas, pressão, como? Explique-me lá”. “Tenho os filhos na escola de Moura, no segundo e no terceiro ciclo, 40 por cento dos jovens são ciganos”. Tudo bem, por aí tudo bem, não tenho nada contra, não somos xenófobos, muito pelo contrário, agora, nós sabemos que esses ciganos têm uns mediadores, em que os professores estão a dar aulas, os mediadores entram porta a dentro, acabam por interromper as aulas, acabam por criar um distúrbio ali entre o professor e os alunos, coisa que nós sabemos que quem pode entrar nas aulas são só os inspetores, não deveria ser com essa liberdade. Sabemos que a integração não está bem feita, sabemos que esses alunos acabam por ocupar os cursos profissionais, mas depois não têm interesse em aprender a mexer no computador, não querem fazer estágios, como não podem fazer estágios vão ter notas negativas e acabam por ocupar o lugar de quem realmente quer aprender. E depois vêm estes estudos do RASI… Olhe, também estive em Odemira logo no início da campanha, e falei com alguns militantes e senhoras que me dizem que muitas vezes são assediadas em Odemira por indostânicos. A conversa não vai ao encontro desses dados, por isso não sei quem é que estará certo ou não, se são os dados ou se são os relatos das pessoas, não sei…

 

Mas, à partida, um relatório oficial, produzido pelas forças policiais e entidades de segurança deste país, será para levar a sério…

Pois, é para levar a sério, claro, mas não vai ao encontro daquilo que eu ouço na rua. Eu estou apenas a ser o mais sincero possível. Há aqui qualquer coisa que não bate certo. Na rua dizem uma coisa, as pessoas queixam-se. Queixam-se realmente que são vítimas, e veem-se imensos vídeos também nas redes sociais dessas pessoas de etnia cigana e mesmo de indostânicos em agressões, e depois vamos para os relatórios oficiais, não bate certo. Não entendo, há qualquer coisa aqui que não está certa. Ou são os relatórios que não estão corretos, ou são os relatos que não verdadeiros, mas isto custa-me a crer que os relatos não sejam verdadeiros. Mas não me cabe a mim dizer...

 

E não lhe custa a crer que o relatório seja falso?

Não, não vou por aí… O que eu posso dizer é que não bate certo. Não lhe sei dizer…

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De qualquer forma, a imigração é necessária aqui no distrito de Beja – muitos empresários agrícolas referem-no. Como é que se pode conciliar, na perspetiva do Chega, esta necessidade premente de imigração para o trabalho, nomeadamente, agrícola, com o “travão” à entrada de imigrantes no País, como defende o seu partido?

Temos de fazer aqui um enquadramento: nós não somos contra a imigração, somos é contra a imigração desregulada, que foi algo que aconteceu nos últimos anos. Nós sabemos que de 2017 até 2024 passámos de 421 mil para 1,6 milhões de imigrantes, mais reagrupamentos chegámos aos dois milhões. Estamos a falar de 20 por cento da população portuguesa. E agora ficamos a saber também que durante um período temporal muitos entraram cá sem nós olharmos, avaliarmos o cadastro. O que nós queremos é que eles entrem, mas entrem por quotas. Nós queremos é saber: vai entrar “x” número de imigrantes para a agricultura, “x” número de imigrantes para a hotelaria. Queremos que as pessoas que vão para a agricultura saibam aquilo que estão a fazer, tenham o mínimo de informação ou de formação para trabalhar na agricultura, e que sejam pessoas que venham para cá para respeitar a nossa cultura, a nossa religião e que não venham cá impor a cultura nem a religião deles perante a nossa. É isso que nós queremos. E queremos que haja realmente uma boa integração. Agora, não é a todo custo como foi feito pela extrema-esquerda e pela esquerda, pela “geringonça”, neste caso. Foi com o Partido Socialista, apoiado pela CDU, que é extrema-esquerda, e pelo Bloco de Esquerda, que abrimos as portas e isto foi uma sangria desenfreada, essa é a questão. Nós queremos é que seja regulada e por quotas, é isso que nós queremos, para que haja aqui um equilíbrio. Se nós olharmos, a AD diz agora que reduziu a entrada de imigrantes, mas vamos fazer contas: estamos a falar de 140 mil imigrantes ano, vezes 10 anos, dá 1,4 milhões; se a gente fizer reagrupamento familiar daqui a 10 anos, não vai ser 1,4, vai ser 1,8, ou seja, com mais estes dois milhões que já cá estão. Significa que um em cada três portugueses será imigrante. Temos de pensar nisto, não é? Não haverá aqui uma substituição demográfica a acontecer? Tudo bem que nós precisamos de imigrantes, mas será que há esta necessidade premente de entrar a todo custo ou estas portas abertas e escancaradas como estão? É isto que nós temos que pensar: qual é o custo que isto nos vai trazer. Também sei que a agricultura é um dos pilares económicos desta região – é a agricultura e é a indústria mineira, que é algo que ninguém tem falado –, e aí o Chega tem várias propostas. Temos de reavaliar o Plano Estratégico da Política Agrícola Comum (Pepac), porque não foi benéfico. Já houve três reavaliações, a AD fez agora a última reprogramação, mas esqueceu-se que andaram a obrigar, ou andaram a incentivar, que é a palavra certa, os agricultores para passar para ecorregimes, para a agricultura biológica e, depois, nesta terceira reprogramação aparece lá zero de apoios para os agricultores. Ou seja, tem de ser reprogramado o quanto antes. Estão a prejudicar os agricultores do Baixo Alentejo. Na situação da língua azul também, só querem dar 48 euros por cabeça, mas só pagam nas explorações onde houver mortes acima dos 30 por cento. Isto é injusto, não é? Disseram que iam pagar os abortos. Os abortos não vão ser pagos, afinal de contas, e em pequenas explorações faz toda a diferença. Era mais uma cabeça que iriam ter. Também temos a situação da água, a água tem de ser utilizada com equidade, o Governo tem a obrigação de sensibilizar os agricultores para que a água…

 

Como é que encara a estratégia “Água que Une”?

Foi uma coisa que eu sempre defendi. Sou engenheiro civil, mas a minha parte de especialização é a parte hídrica. Eu recordo-me que quando estava no Partido Social Democrata não queriam que eu falasse em transvases nem em autoestradas de água. Ainda fiz um artigo no “Observador”, outro no “Público”, se não estou em erro, e fui chamado à atenção para não assinar como deputado eleito pelo PSD. O Chega foi o primeiro partido a falar sobre isso, a apresentar no programa eleitoral, preto no branco. E agora o PSD vem e apresenta a “Água que Une”. Nós ficamos satisfeitos, mas o primeiro partido a falar sobre isso foi o Chega, fui eu, como deputado no PSD, e o Chega. Esta é a realidade, isso está registado. Nós achamos bem que haja este equilíbrio da água, do norte ao sul, mas a água tem de ser bem utilizada, e no nosso distrito nós temos aqui algo muito importante que é o Alqueva. Também temos o Bloco de Rega de Moura, que já há financiamento. Agora, precisamos que o de Póvoa e Amareleja também tenha financiamento, e nós estamos a favor de reativar o tal Bloco de São Bento, que é em Serpa, mas também queremos a ligação do Alqueva a Santa Clara, que isso é algo em que também já há uma promessa, mas nós queremos que isso seja efetuado. Ou seja, nós queremos que a água chegue a quem necessita dela para plantar, para os agricultores, mas queremos também que seja utilizada com ponderação e equilíbrio. Nós temos de pensar no futuro da terra. Nós sabemos que as terras esgotam, passados 20 anos, com aquela cultura superintensiva. Tem de haver aqui um equilíbrio, isso é o que nós defendemos para a agricultura. E defendemos também que haja casas agrícolas, habitação agrícola, que era algo que se fazia no passado e, como já tinha dito há pouco, o Pepac tem de ser reavaliado e tem de ser direcionado para quem realmente precisa, aqui para os nossos agricultores do distrito. E há que falar de algo que ninguém tem falado, praticamente, que é a indústria mineira. Temos aqui a Faixa Piritosa Ibérica: 250 quilómetros lineares, 50 de largura, de Alcácer, Aljustrel temos as minas, depois vamos a Neves-Corvo, também temos as minas, muito importantes. Estamos a falar de 2600 [empregos], são 1300 funcionários diretos, mais 1300 que são subempreiteiros. Mas não é só isso: além de criar este emprego direto, isto é o pulmão desta parte, Castro Verde, Almodôvar, até mesmo de Ourique. Se não houvesse esta mina, o que é que seria feito? O que eu acho é que o Instituto Politécnico de Beja devia de aproveitar, já que temos aqui duas minas de grande relevo, e criar aqui um curso ligado à geologia. Por que não? Acho que temos de formar pessoas, isto deveria de ser aproveitado, porque nós precisamos de ter a mão de obra especializada e fazer com que os nossos jovens não saiam do distrito. Esta, por exemplo, é uma solução que deveria ser adotada, a criação de um ou dois cursos que estivessem direcionados para trabalhar nesta faixa piritosa, porque nós sabemos que são minas que ajudam os municípios. É uma economia florescente que faz florescer a área circundante às minas.

 

Qual é a sua visão, e do Chega, em relação ao aeroporto de Beja? Que papel é que deve ter, antes e durante as obras do novo aeroporto de Lisboa, tendo também em conta que o aeroporto de Faro está perto de atingir o seu limite? O que fazer desta infraestrutura?

Antes desta infraestrutura, temos de falar das ligações. Nós sabemos que está a ser eletrificada a linha de Beja até Casa Branca. Eu não entendo como é que o Partido Socialista nunca interligou este aeroporto à linha férrea. Não entendo. Isto é algo que tem de ser feito. Falando, já agora, da ferrovia, tem de ser feita a ligação à Funcheira para que haja uma ligação a norte e a sul. Em caso de acidente – isso acontece noutras partes do País –, se houver um acidente tem de haver redundância na linha. Temos de apostar nisso. Outra coisa que está aqui a faltar: a A26 tem de chegar a Beja, em quatro faixas. Como é possível uma capital de distrito não ter uma autoestrada de quatro faixas? Isto tem de acontecer se queremos ter coesão territorial. Ou seja, se tivermos aqui um aeroporto, com o IP8 requalificado, mas até Ficalho, claro, faz todo o sentido. Há vários partidos que o defendem, mas nós também o defendemos e já apresentámos também uma proposta na Assembleia da República.

 

E não considera que esta requalificação que está a acontecer no IP8 poderá inviabilizar um futuro prolongamento da A26?

Não. Quatro faixas são quatro faixas, e o futuro – e nós temos de ser positivos – é que nós teremos mais população em Beja. Temos de atrair mais pessoas e, como tal, não podemos pensar a 10 anos. Temos de pensar a 20, 30 ou 40.

 

Se formos pela questão dos números, talvez o distrito de Beja não o justifique para muita gente…

Por isso é que nós temos políticos. Temos de combater, temos de criar condições…

 

Tem de haver uma discriminação positiva?

Temos de reivindicar e fazer esta discriminação positiva. Já viu o que é vir na A2, entra em quatro faixas, está com mais pressa, quer chegar aqui a horas, dentro dos limites de velocidade, respeitando, mas quatro faixas são quatro faixas. É de uma capital distrito que estamos a falar, não estamos a falar aqui de uma cidade secundarizada, estamos a falar da capital de distrito, do maior distrito do País, e ao termos este tipo de ligações, tanto férrea como rodoviária, este aeroporto torna-se muito mais valioso. Para já, dá para ampliar, como nós já percebemos, temos espaço à volta, e nós apresentámos até uma proposta na Assembleia da República para criar aqui uma estação intermodal. Aqui tem de haver ligação rodoviária, aérea e ferroviária. Para quê? Para criar aqui um porto seco, ou seja, temos de aproveitar isto a nível de logística, a nível de mercadorias de frio. Acho que poderíamos fazer toda a diferença.

 

Estás a pensar também no porto de Sines?

Também estou a pensar, claro, estamos a pensar mais à frente, com a interligação, claro que estou a pensar, acho que qualquer pessoa pensará assim.

 

E no meio disto tudo, a Base Aérea N.º 11. Trata-se de um terminal civil numa base aérea. Como é que se poderá ultrapassar esta questão?

Não tenho a fórmula mágica para isso. É tudo uma questão de negociação, de integração, de se falar. Há sempre solução. Temos espaço, falta é a vontade política de apostar nesta terra. Isto é o que eu acho.

 

Este é um distrito envelhecido e despovoado. Tendo isto em conta, na área da Saúde, como é que se podem atrair médicos para a região, para além da requalificação e modernização do hospital de Beja e dos centros de saúde do território? As autarquias podem ter um papel determinante?

Antes de mais, tudo começa com termos de infraestruturas, para podermos atrair médicos que tenham vontade de vir para cá, porque se tiverem um bom hospital, boas condições para progredir, para investigação, os médicos têm mais facilidade em vir para cá.

 

Mas, só isso não é suficiente…

Não, não é suficiente. Temos de ter habitação mais barata… Nós, no Chega, apresentámos uma proposta que é direcionada para estes territórios de baixa densidade, porque é algo que se faz nas ilhas. Temos de criar incentivos, financeiros, de deslocação, para poder atrair esses médicos para cá. Mas, depois, também há outra coisa que importa: sabemos que, no rácio, um médico costuma ter cerca de 1800, 1900 utentes. E nós apresentámos a proposta que esse rácio, no Alentejo, nestes territórios, tem de ter 1200, 1300. É a única maneira de nós podermos atrair, porque o médico às vezes não vem para cá porque pensa assim: “Eu vou para lá, mas eu não consigo atingir os 1900, por isso não vou receber aquilo a que tenho direito”. Nós temos de fazer essa descriminação positiva. Mas também teremos de lutar para que haja mais habitação, porque um casal jovem de médicos vem para cá, quer ter habitação. E nós sabemos que é escassa, e sabemos que, desde 2019, foi o distrito onde mais aumentou. Sabemos que não é a mais cara do País, nem lá perto, mas sabemos que é uma habitação que aumentou muito, e também sabemos que precisamos de creches. Trazem os filhos e querem colocá-los nas creches, ou seja, temos de criar aqui várias condições. E, claro, as autarquias têm aqui um papel muito importante e preponderante. Para já, há autarquias em vários pontos do País que acabam por ceder habitação a esses médicos para poder atraí-los para os centros de saúde. Mas há algo que me faz espécie aqui no distrito de Beja, entrando aqui noutro tema, que é o da habitação. Estive a analisar o distrito de Beja: são 14 concelhos, 10 do Partido Socialista, quatro do Partido Comunista, estes foram os dois partidos que sempre estiveram à frente das câmaras municipais. Eu sou engenheiro civil, algo em que estou dentro é o ordenamento de território, e para se poder construir, para se poder ter habitação, temos de ter os planos diretores municipais (PDM), que são esses que definem onde é que se pode construir e onde não se pode construir. E, analisando, há autarquias que desde os anos 90 que não reavaliam os PDM. Posso-lhe dar o exemplo de Mértola, de Moura, do Partido Socialista. Do Partido Comunista, Barrancos, Cuba… Depois, nós fizemos a média dos 14 e isto dá 18 anos, dá 18 anos de vigência para os PDM. E agora dizem-me assim: “Não, mas os PDM estão a ser revistos”. Claro, estão a ser obrigados a ser revistos, por causa do PRR [Plano de Recuperação e Resiliência], mas, durante estes anos todos, quem quis aumentar a sua casa, quem quis construir uma casa de banho, não o pôde fazer. Ou seja, tem de haver aqui uma integração de visão estratégica da parte dos presidentes de câmara para com o Governo. Não é só o Governo que tem aqui “a faca e o queijo na mão”. Tem de haver uma estratégia global que se entrose, e isto tem de ser feito através da Assembleia da República e de quem tem as lides do destino a nível das câmaras municipais. Isto pode parecer que é muito teórico, mas não é. Esta é a realidade nesta região e noutras, mas nesta principalmente. Desde 1990 que não se alteram PDM. E nós podemos apresentar, e estamos a apresentar, o IVA na construção reduzido para seis por cento, isenções de IMI e IMT para os jovens, mas depois não pode ser algo unilateral, unicamente da parte do Governo. Tem de haver mais, de quem está cá, com os munícipes, com os fregueses. Também têm de ter aqui uma palavra ativa e é isso que não tem acontecido.

 

A revisão dos PDM aplica-se não só a esta questão da habitação para médicos, mas para a habitação em geral, e faz parte também das estratégias locais da habitação. De qualquer forma, mesmo assim, há muitos autarcas que defendem quase um regresso ao serviço médico à periferia. E muitas câmaras municipais já atribuem casas de função, já têm regulamentos… Com isto não poderemos cair numa espécie de leilão entre os municípios?

Por isso é que, a nível de distrito, tem de haver uma estratégia. Não pode ser cada um a pensar na sua capelinha. Nós somos só um distrito e estes 14 concelhos têm de estar unidos nessa visão. As comunidades intermunicipais têm de ter uma palavra forte. Ou seja, imaginemos: o município de Odemira precisa de dois médicos, Ourique precisa de um, Castro Verde está bem, neste momento não precisa. Isto tem de haver um equilíbrio. Castro Verde não pode ir a Odemira buscar, àqueles que têm necessidade. Tem de haver uma coesão dentro do território. Mas acredito que haja boa-fé da parte dos autarcas. Agora, nós temos mais necessidades do que tem, por exemplo, Coimbra, ou do que têm outras regiões, e é por isso que temos de lutar para trazer médicos e oferecer-lhes aquilo que os médicos precisam. Ou seja, aqui temos boa qualidade de vida, mas precisamos das coisas básicas, além das infraestruturas. Espero que [a requalificação e ampliação de] o hospital aconteça, e acho que vai acontecer, é algo que é uma necessidade de há décadas. Vai ser ampliado, vai ser requalificado, eu acredito que sim. Se isso não acontecer, lá estarei, se for eleito por este distrito, se os baixo-alentejanos assim o decidirem, para bater o pé, como fiz também pelo hospital do Algarve e pelo hospital de Évora, e como farei também pelo hospital de Beja. Agora, temos de ser fortes e convictos na defesa das nossas bandeiras aqui para a região.

 

Que solução é que preconiza para a questão do Hospital de São Paulo, em Serpa?

Por acaso não temos falado sobre isso em nenhuma entrevista. Tem sido um tema secundarizado ou “terciarizado”. Somos a favor de um sistema nacional de saúde, em que haja integração, em que o público, o social e o privado estejam integrados. Nós somos a favor das parcerias público-privadas (PPP), mas não somos a favor das PPP a todo custo. Esperamos bem que isto se resolva o quanto antes entre a Santa Casa [da Misericórdia de Serpa] (SCMS) e a União das Misericórdias [Portuguesas] (UMP). Temos lá instalações que têm de ser utilizadas e não podemos deixar morrer aquele hospital, porque ainda iremos agudizar mais a coesão territorial. Se realmente não funciona, tem de passar para o público, tem de voltar ao público. Quando se terminaram em 2019 as parcerias público/privadas, o Tribunal de Contas demonstrou que eram positivas em muitos sítios, que tinha sido benéfico para o Estado e para as pessoas. Primeiro tem de ser benéfico para as pessoas, mas depois também não pode lesar o Estado, como nós podemos entender. Agora, se realmente não se conseguir, se o terceiro setor, neste caso, o social, a UMP e a SCMS não se conseguirem entender, e se realmente a SCMS não tiver condições para aproveitar o equipamento que lá tem e não tiver a força para deixar as portas abertas ao público e dar condições de acesso de saúde às pessoas, tem de passar para o público. O Estado tem de agarrar e tem de dar condições.

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A questão da UMP com a SCMS desenvolveu-se aqui há cerca de um ano e neste momento parece que está num impasse, já depois de o contrato de gestão por parte da SCMS ter sido renovado no final de 2024…

Foi renovado, mas a informação que eu tenho é que a SCMS está a tentar resolver o problema financeiro. Se resolver o seu problema financeiro, a UMP volta. Se resolver, tudo bem, continua a funcionar. Agora, a questão é que se isso não acontecer, nos próximos meses, o Estado tem de se chegar à frente e tem de agarrar aquele equipamento e tem de lhe dar condições, porque neste caso estamos a falar de um equipamento que faz muita falta a este território.

 

E as autarquias – Serpa, onde está localizado, mas também Moura, Barrancos ou Mértola –, poderiam ter algum papel neste processo?

Vejo difícil ter um papel neste momento, porque isto agora está nas mãos da SCMS, que é quem tem de resolver aquela situação. Eu estou a ver aqui o Estado, o Governo, a ter muito mais condições para resolver a situação, se isto não for resolvido pelo terceiro setor. Muito honestamente, acho que esta é a solução.

 

No “Expresso” de 29 de janeiro foi noticiado que Rui Cristina seria candidato autárquico em Albufeira. Essa candidatura mantém-se, caso seja eleito deputado por Beja, ou isso nem sequer está no seu horizonte?

Isso não está no meu horizonte. Isso foi uma suspeição que foi lançada, na altura. Não estou a pensar, minimamente, em autarquias. A minha missão neste momento é única e exclusivamente ser a voz dos baixo alentejanos na Assembleia da República.

 

Caso seja eleito, o mandato é para cumprir até o fim?

É para cumprir. É isso mesmo, nem mais, nem menos.

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