Diário do Alentejo

Vigilantes

05 de agosto 2023 - 12:30
Jovens do distrito de Beja participam em programas de preservação ambiental promovidos pelo Instituto Português do Desporto e Juventude
Fotos | Ricardo ZambujoFotos | Ricardo Zambujo

Durante os meses críticos de verão, em que as ondas de calor invadem o Alentejo, oito dos 14 concelhos do distrito de Beja têm em permanência campanhas de vigilância, com jovens no terreno, para alertar e prevenir possíveis riscos de incêndio. O “Diário do Alentejo” esteve no Parque Biológico da Cabeça Gorda, no concelho de Beja, e no santuário de Nossa Senhora do Castelo, em Aljustrel, a acompanhar dois dos turnos de vigia.

 

Texto Ana Filipa Sousa de Sousa

 

Junto à torre de vigia do Parque Biológico da Cabeça Gorda, no concelho de Beja, Inês Matias, Margarida Pires, João Pinheiro e Rodrigo Zeferino, voluntários do programa “Preservar o nosso Parque Biológico”, da responsabilidade da junta de freguesia, começam a juntar-se para mais um turno.

 

A tarde adivinha-se longa e calorosa, embora a brisa, que de vez em quando passa, ajude a amenizar a força do sol. Com as garrafas de água frescas nas mochilas e os chapéus cremes na cabeça seguem por uma das inúmeras estradas de terra que atravessam todo o perímetro florestal.

 

“Normalmente, quando entramos [no parque], damos uma voltinha para ver se está tudo em ordem e começamos a apanhar o máximo de lixo que encontramos”, começa por explicar, ao “Diário do Alentejo”, Inês Matias, de 17 anos.

 

“Mais tarde, voltamos a dar mais algumas voltinhas para confirmar se está tudo em ordem, e se não estiver ligamos à junta ou, em caso de incêndio, aos bombeiros para ver se resolvemos o problema”, acrescenta.

 

Pela frente, os quatro voluntários, que agora iniciam a sua quinzena, têm cinco horas de alerta e vigia de possíveis focos de incêndio, assim como de limpeza de algumas zonas do recinto. “Nos últimos dois anos não tem havido problemas o que significa que há trabalho bem feito por trás”, garante, de seguida, João Pinheiro, de 17 anos, um dos voluntários que se inscreveu no programa pelo segundo ano consecutivo.

 

A iniciativa, da responsabilidade central do Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ) e levada a cabo por diversas entidades, visa promover “práticas no âmbito da proteção da natureza, florestas e respetivos ecossistemas, através da sensibilização das populações em geral e da preservação contra os incêndios florestais e outras catástrofes com impacto ambiental, da monitorização e recuperação de territórios afetados”.

 

Multimédia0

 

Na aldeia de Cabeça Gorda, face à vasta mancha florestal de 324 hectares, este tipo de programas de preservação e sensibilização do público jovem decorre “há mais de 10 anos”, principalmente, pela “preocupação” existente em torno do seu “oásis”, o Perímetro Florestal de Cabeça Gorda/Salvada.

 

“O nosso intuito é fazermos aqui uma vigilância nestes meses de verão em que o perigo de incêndio é mais iminente, [porque] nós temos o que para nós, e posso parecer um bocadinho vaidosa demais neste aspeto, é um oásis, sendo das poucas freguesias que tem este espaço de montado”, revela a presidente da junta de freguesia, Lucília Simão.

 

Neste ano, à semelhança do que tem acontecido nas edições anteriores, o programa está dividido em quatro quinzenas, entre 1 de julho e 15 de setembro, com dois jovens por cada período, que se juntam durante as horas mais críticas, entre as 14:00 e as 19:00, para fazer face aos possíveis perigos de incêndio.

 

“Não tem sido muito difícil [arranjar jovens voluntários], porque na freguesia eles conhecem-se uns aos outros e agrupam-se, existindo já aquele espírito de comunidade. Assim, o objetivo é que sejam desenvolvidas atividades de vigilância fixa, através da torre de vigia, e móvel, feita a pé ou de bicicleta, com os jovens a percorrerem todo este espaço com o intuito de nos salvaguardarmos de algum fogo que possa ocorrer”, realça a autarca.

 

Multimédia1

 

“UM SERVIÇO PARA A COMUNIDADE”

A cerca de 50 quilómetros do Parque Biológico, no mesmo período da tarde, Inês Filipe, Margarida Camacho, Isabela Pardal e Bernardo Cascalho também completam o seu turno no santuário de Nossa Senhora do Castelo, em Aljustrel. Contrariamente ao primeiro grupo, este está prestes a terminar a sua quinzena no “Por uma Floresta Segura” que, embora com um “pequeno susto”, foi sossegada.

 

“Desde que estamos cá só tivemos um incêndio, no sábado passado, mas de resto não tem acontecido grande coisa. Quando olhamos aqui de um ponto específico [do santuário], como quem vai para Montes Velhos, vemos que há duas fábricas e então, normalmente, localizamo-las para saber se está tudo bem. Nesse dia, por exemplo, começámos a ver um bocadinho de fumo, mas era num sítio muito perto das fábricas e ficámos com algumas dúvidas.

 

Quando conseguimos confirmar que se tratava de um incêndio, e como foi urbano, quando íamos avisar os bombeiros começaram-se a ouvir as sirenes”, recorda Isabela Pardal, de 16 anos.

 

E completa: “Mas, no geral, as pessoas têm ganho muita noção [dos perigos de incêndio], principalmente, do risco de fazer queimas. Agora nota-se que existe o cuidado de ligar [aos bombeiros e à policia] a avisar e, por isso, não têm ocorrido grandes situações de relevo”.

 

Ainda que a vigia, que neste ponto é fixa, se circunde ao santuário, abrange ainda o moinho do Maralhas, outro ponto turístico do município que carece de atenção.

 

“Temos a partir destes dois pontos uma visão ampla do concelho e dos concelhos vizinhos, tendo inclusive sido possível, no ano passado, detetar a partir daqui [do santuário] um incêndio em Beja. Para além disso, ao mesmo tempo que fazem este trabalho de vigia dos focos de incêndio desenvolvem também ações de sensibilização, através, por exemplo, da entrega de folhetos informativos, para a comunidade local e para os próprios visitantes”, esclarece a vereadora do município, Liliana Mendes.

 

O programa coordenador “Voluntariado Jovem para a Natureza e Florestas”, do IPDJ, além do papel ambiental que envolve toda a sua atividade principal, surge também como dinamizador e promotor social, ou seja, como um motor de sentido de pertença e de responsabilidade perante a comunidade.

 

“O objetivo principal é, precisamente, essa preservação e essa deteção imediata de incêndio, [assim como] motivar os jovens a adotarem comportamentos mais sustentáveis, desenvolverem competências ao nível do meio ambiente e aumentarem o seu espírito de iniciativa, sentirem que estão a fazer um serviço para a sua comunidade e envolve-los, justamente, nestas questões da proteção do ambiente”, refere.

 

Neste ponto, Lucília Simão também está de acordo. “É importante que os jovens tenham aqui a sensibilidade para saber o que está ao nosso alcance e o que podemos fazer e, por outro lado, permitir que adquiram algumas competências ao nível do voluntariado, que é muito importante, seja nesta parte das florestas ou noutras atividades. De certa forma, capacitar os jovens para que fiquem despertos para estas tarefas voluntárias”.

 

Para os jovens estas mais-valias subjacentes também são notórias. Isabela Pardal acredita que esta “primeira interação com o voluntariado e com o próprio mundo do trabalho” permite-lhe, enquanto estudante, começar a ter contacto com “horários de trabalho” e sentido de “responsabilidade”, ao mesmo tempo que uma maior consciência de preservação dos espaços verdes.

 

“Profissionalmente, no futuro, [a área da natureza] não é algo que gostasse de seguir, mas acho que todos nós temos o dever de nos preocuparmos um bocadinho, [porque] tudo isto é nosso também”, realça a sua colega Margarida Camacho, de 18 anos.

 

E Inês Matias corrobora: “[Este projeto] dá-nos sempre a oportunidade de fazermos mais exercício físico, [assim como] conhecer ainda melhor o recinto e ver determinados animais, como veados. Estamos a ajudar a aldeia e, ao mesmo tempo, também nos estamos a ajudar a nós”.

 

O projeto “Preservar o nosso Parque Biológico”, destinado a jovens entre os 17 e os 30 anos, tem data de conclusão prevista para 15 de setembro, enquanto que o “Por uma Floresta Segura 2023”, para jovens com idades compreendidas entre os 16 e os 30 anos, para o final do presente mês.

 

Multimédia2

UM EXEMPLO A SEGUIR

Para Lucília Simão, presidente da Junta de Freguesia de Cabeça Gorda, a participação neste tipo de projetos, normalmente, desenvolvidos pelos municípios, deve servir para outras freguesias mais pequenas como um “exemplo a seguir”.

 

“Significa que nós somos mais pequenos, mas que trabalhamos e, como tal, fazemos alguma diferença. A nossa participação [no “Voluntariado Jovem para a Natureza e Florestas” do IPDJ] é também importante”, assegura.

 

À sua semelhança, também a Junta de Freguesia de Pedrogão, no concelho de Vidigueira, está a desenvolver a iniciativa “Jovens pela Floresta 2023” com o intuito de “limpar as áreas listadas como necessitadas” e, posteriormente, a partir de dia 15 deste mês, atuar a nível local na sensibilização das populações com “ações de educação florestal, conhecimento da fauna e da flora local através de quizzes, vídeos e folhetos”.

 

A autarquia também já desenvolveu, no mês passado, atividades de vigia e prevenção “para a inexistência de fogos”.

 

A associação Montícola, sediada em Mértola, também tem a decorrer a iniciativa “EcoCircular”, em que se pretende “formar para hábitos e estilos de vida mais sustentáveis e saudáveis” com a “manutenção da horta da Badocha”, a criação de infraestruturas ecológicas para a fauna auxiliar, a formação em cozinha sustentável e saudável e o “apoio e participação em atividades de educação e sensibilização ambiental”.

 

Multimédia3

OUTROS MUNICÍPIOS ENVOLVIDOS

À semelhança do que tem ocorrido em outras edições, a forte adesão dos municípios aos projetos de voluntariado ambiental manteve-se neste ano.

 

Assim, até ao final do mês, estarão a ser desenvolvidos o “Ourique mais Verde” (14 aos 30 anos), em Ourique, e “Jovem Natur’Almodôvar” (16 aos 22 anos), em Almodôvar.

 

Paralelamente, até setembro, decorrem os programas “Floresta Viva 2023” (18 aos 30 anos) e “Amigos da Floresta 2023” (14 aos 17 anos), em Vidigueira, “Cuidar da Floresta é Cuidar do nosso Futuro” (14 aos 17 anos), em Barrancos, “Beja Safe Florest’23” (16 aos 30 anos), em Beja, e “Juventude Verde” (14 aos 30 anos), em Castro Verde.

 

A 15 de outubro terminará o “Preservar a Floresta 2023” (18 aos 30 anos), também da autarquia barranquenha. Os jovens interessados podem inscrever-se até cinco antes da data de início de cada quinzena no site do IPDJ.

 

Comentários
Recomendamos