Diário do Alentejo

“Estamos a preparar o futuro, envolvendo a comunidade na definição de uma estratégia coletiva”

29 de abril 2023 - 11:00
Rui Raposo, José Miguel Almeida e Ana Paula Cardoso olham para o concelho de Vidigueira em 2023
Fotos | Ricardo ZambujoFotos | Ricardo Zambujo

O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, considerou, no dia 1 de janeiro, na tradicional mensagem de Ano Novo, que “2023 pode vir a ser, no mundo, na Europa e em Portugal, o ano mais importante até 2026, se não mesmo até 2030”, e que, assim sendo, Portugal entra em 2023 obrigado “a evitar que seja pior do que 2022”, que “não foi o ano da viragem esperada”. No âmbito deste comunicado, o “Diário do Alentejo” apresenta, nesta semana, o retrato atual do concelho de Vidigueira a partir das perspetivas de Rui Raposo, presidente da câmara municipal, de José Miguel Almeida, presidente da Adega Cooperativa de Vidigueira, Cuba e Alvito, e de Ana Paula Cardoso, presidente da Comissão de Proteção de Crianças e Jovens de Vidigueira.

 

Texto José Serrano

 

O presidente da Câmara de Vidigueira sublinha os esforços realizados no reforço do programa estratégico de reabilitação urbana, no sentido de responder às insuficiências do concelho em matéria de habitação. O autarca, considerando o papel do município a que preside “na luta pela erradicação ou atenuação da pobreza e da exclusão”, realça a promoção de “dinâmicas de planeamento estratégico” implementadas no território, capazes de garantir “uma maior eficácia no conjunto das respostas sociais". Rui Raposo evidencia, ainda, a candidatura do processo tradicional de produção de vinho de talha à lista do Património Cultural Imaterial da Humanidade da Unesco, manifestando o desejo de que a produção vinícola se torne, “cada vez mais, um farol de Vidigueira, para o País e para o mundo”.

 

Considera que 2023 deverá ser um ano essencial, no decurso da década, para o desenvolvimento do concelho a que preside?

O ano de 2023 será marcado pelo início e conclusão de várias obras e projetos que integram a abordagem de proximidade e melhoria de qualidade de vida que o executivo tem projetado para Vidigueira. Destaca-se, no decorrer de 2023, a conclusão do parque verde urbano, um projeto que incide na malha urbana da sede de concelho e possibilita o acesso de toda a comunidade a equipamentos de desporto e lazer. No prolongamento dos referidos eixos de estratégia do município, evidencia-se a preocupação com a fixação de pessoas e, nesse sentido, será implementada a estratégia local de habitação – arrendamento a custos controlados e igualmente a custos acessíveis –, que irá abranger a reabilitação de edifícios habitacionais, propriedade do município, e a construção de novas habitações, na proximidade do parque escolar. Tendo em conta que o quadro comunitário Portugal 2030 já se encontra em execução e com disponibilização de várias linhas de financiamento, é intenção do município apresentar candidaturas para diversos projetos a realizar nas freguesias. No que se refere ao trabalho que tem sido desenvolvido, concretamente, de divulgação e promoção, estima-se que em 2023 se intensifique a alavancagem económica do território, que já se verificou em 2022, com as diversas iniciativas relacionadas com o produto endógeno de maior potencialidade – o vinho e, em destaque, o vinho de talha.

 

Devido a circunstâncias várias, nomeadamente, a guerra na Ucrânia e a elevada taxa de inflação que se verifica nos países da Zona Euro, colocam-se, atualmente, inesperados e agravados problemas sociais e económicos aos territórios e aos cidadãos, se compararmos com 2021, ano em que tomou posse, do seu segundo mandato, como presidente da Câmara Municipal de Vidigueira. Face a esta nova conjuntura, quais as novas necessidades surgidas no concelho e de que forma as equaciona colmatar ao longo deste ano de 2023?

 

HABITAÇÃO

O município de Vidigueira tem tido a preocupação de alicerçar as respostas para as carências habitacionais num planeamento global, integrado e multidisciplinar, uma vez que é necessário articular questões de natureza urbanística, de construção, de reabilitação e, fundamentalmente, de natureza social. Neste sentido, ao longo dos últimos anos, o município tem realizado diversos esforços para responder às insuficiências em matéria de habitação, investindo em planos e programas para reforçar o programa estratégico de reabilitação urbana.

 

ÁREA SOCIAL

Não só na habitação a autarquia abraça a causa social. O município de Vidigueira tem cumprido com o objetivo de elevação social das pessoas e famílias alvo, fruto da vontade política, da capacidade técnica e da participação solidária. Os nossos serviços, que desde dia 3 de abril assumiram a coordenação do serviço de atendimento e acompanhamento social, decorrente da transferência de competências para os órgãos municipais no domínio da ação social, abraçaram e reforçaram a missão constante na luta pela erradicação ou atenuação da pobreza e da exclusão, com vista à promoção do desenvolvimento social, desenvolvendo uma cultura de parceria efetiva, promovendo dinâmicas de planeamento estratégico garantindo assim uma maior eficácia, no conjunto das respostas sociais.

 

INVESTIMENTO EMPRESARIAL

O desenvolvimento de uma política local, promotora da dinamização da atividade económica do concelho, não dissociada do setor vinícola, passa, de modo incontornável, pela implementação de medidas de apoio ao investimento e à criação de emprego. O município de Vidigueira vem desenvolvendo esforços no sentido de criar um conjunto de instrumentos e medidas de apoio ao investimento empresarial no concelho, com o objetivo de atrair investimentos e novas iniciativas que complementem estruturalmente o seu desenvolvimento, estimulem a fixação da população e propiciem a criação de emprego.

 

EDUCAÇÃO E SAÚDE

A educação e a saúde são áreas em que, mesmo antes da transferência de competências, o município, através da concretização de políticas educativas e sociais, tem investido, para a promoção da qualidade de vida e bem-estar dos munícipes. A missão da autarquia, neste âmbito, é assegurar a gestão integrada das infraestruturas escolares, identificar carências, fomentar e dinamizar a criação de condições favoráveis ao desenvolvimento social das populações e contribuir para a melhoria da prestação de cuidados de saúde. A construção do moderno edifício do Agrupamento de Escolas de Vidigueira e, atualmente, a construção do novo edifício para o centro de saúde, são disso exemplos. Deliberar no domínio da ação social escolar, designadamente, no que respeita à alimentação e atribuição de auxílios económicos a estudantes, tem sido, também, uma constante da nossa política. Estamos a preparar o futuro, envolvendo a comunidade na definição de uma estratégia coletiva que respeite os nossos compromissos eleitorais, acolha os contributos dos vários setores da sociedade civil e alinhe as nossas prioridades com o cumprimento dos objetivos de desenvolvimento sustentável.

 

AMBIENTE

Na área ambiental, Vidi-gueira, mais do que encontrar soluções para tratar os resíduos diariamente produzidos em nossas casas, aposta na redução dos mesmos, através da reciclagem e da alteração dos padrões de consumo. Nesse sentido, o município de Vidigueira, no âmbito da Associação de Municípios do Alentejo Central, tem sido pioneiro nessa frente, apostando, entre outros, no programa “Separar sem parar”, que consiste na recolha semanal, por parte dos serviços municipais, de plástico, metal e papel, com distribuição à população de contentores próprios.

 

CULTURA

O município tem vindo a apostar na área cultural de forma gradual e sustentada, projetando e apoiando um conjunto de práticas culturais de relevância – no domínio do livro e da leitura, da expressão plástica, do teatro, da dança e da música –, desempenhando uma contínua função educativa, mobilizadora de diversos tipos de públicos, que visa formar o gosto, festejar o lazer e contribuir para vivências sãs, que satisfaçam e motivem quem nelas participa.

 

TURISMO

A cultura afirma-se como alternativa, mas também como complemento aos produtos turísticos tradicionais do nosso concelho, como é o exemplo do enoturismo. Reforçando este desígnio, pretendendo que a produção vinícola, grande motor de desenvolvimento, se torne cada vez mais um farol de Vidigueira, para o País e para o mundo, o município idealizou a candidatura do processo tradicional de produção de vinho de talha à lista do Património Cultural Imaterial da Humanidade [da Unesco]. Com o propósito de preparar a instrução do processo de apresentação, Vidigueira tem promovido reuniões institucionais e técnicas envolvendo os representantes de 22 municípios da região Alentejo, criando, assim, uma dinâmica que projeta globalmente a nossa região, reforçando a articulação entre vinho, gastronomia e cultura, imagens de marca que nos identificam.

 

Multimédia0Foto | Rui Raposo, presidente da Câmara Municipal de Vidigueira

 

OUTRAS PERSPETIVAS SOBRE O CONCELHO DE VIDIGUEIRA

OS OLHARES DE JOSÉ MIGUEL ALMEIDA, PRESIDENTE DA ACV, E DE ANA PAULA CARDOSO, PRESIDENE DA CPCJ DE VIDIGUEIRA

 

Sublinhando o compromisso da entidade com a sustentabilidade da região e considerando a necessidade da conclusão, até 2025, do Bloco de Rega de Vidigueira, José Miguel Almeida evidencia o papel da cooperativa a que preside, afirmando ser esta o “garante da atividade vitícola de centenas de pequenas explorações”, rede fundiária “fortemente alicerçada na tradição do território”, com relevante significados económico e social para o concelho. Por sua vez, Ana Paula Cardoso realça o papel preponderante das ações de sensibilização e prevenção da CPCJ de Vidigueira, em articulação com as demais entidades do concelho com representação na comissão, na diminuição de comunicações de situação de perigo e no crescimento e desenvolvimento saudáveis das crianças e jovens do concelho.

 

“[2023] É MUITO DESAFIANTE PARA O SETOR VITIVINÍCOLA DA REGIÃO, QUE VOLTARÁ A PÔR À PROVA A RESILIÊNCIA DOS DIVERSOS AGENTES ECONÓMICOS”

A Adega Cooperativa de Vidigueira, Cuba e Alvito (ACV) conta, atualmente, com 261 cooperadores que exploram um total de 1350 hectares de vinha, tendo a empresa comercializado, em 2022, cerca de quatro milhões e meio de litros de vinho, na quase totalidade no mercado nacional.

 

José Miguel Almeida, presidente da ACV, refere que a cooperativa representa “o garante da atividade vitícola de centenas de pequenas explorações”, representando estas “uma ampla rede fundiária que, para além de estar fortemente alicerçada na tradição do nosso território, tem relevante expressão económica e social”.

 

Em paralelo, reforça: “A adega atua junto das comunidades envolventes através de apoios ao movimento associativo, cultural e social, o que demonstra, de sobremaneira, o seu compromisso com a sustentabilidade do território”.

 

Manifestando que “cada ano é decisivo” para o desenvolvimento vitivinícola do concelho de Vidigueira, o responsável da ACV considera, no entanto, que 2023 se encontra envolto num “contexto muito desafiante para o setor na região, que voltará a pôr à prova a resiliência dos diversos agentes económicos”.

 

Uma opinião que se relaciona com o facto de o presente ano ser de “reincidência de elevadas taxas de inflação, que não deverá descer, em média, dos cinco por cento ao longo do ano, o que não se traduzirá numa redução dos preços das matérias-primas e dos fatores de produção necessários à atividade agrícola”, comprometendo-se, todavia, a cooperativa, em “fornecer produtos de elevada qualidade a preços competitivos”.

 

Desta forma, os maiores desafios que se colocam neste ano na região, na ótica dos associados da ACV, encontram-se relacionados, “por um lado, com os preços das matérias-primas e dos fatores de produção e, por outro, com a gradual perda de poder de compra dos consumidores”.

 

Assim, José Miguel Almeida considera crucial “que as entidades competentes atuem convenientemente na fiscalização dos preços das matérias-primas, as quais, ‘a pretexto da guerra’, dos ‘custos dos combustíveis’ e de outros ‘chavões’ vulgarmente utilizados, assumem valores deveras elevados”.

 

Relativamente às medidas, governamentais ou camarárias, que gostaria de ver implementadas até ao final de 2023 no sentido de beneficiar a atividade vitivinícola do concelho de Vidigueira, o presidente da ACV elucida: “Deixaria aqui uma palavra acerca do avanço necessário do Bloco de Rega de Vidigueira, que já está a avançar, mas que terá de dar passos muito rápidos e firmes para que em 2025 esteja na fase de conclusão prevista. A nível municipal, mais concretamente, dos municípios que compõem a sub-região de Vidigueira, Cuba e Alvito, relevo algo que apresentei recentemente no âmbito do evento Vidigueira Vinho: a criação da plataforma de acompanhamento para a sustentabilidade do setor vitivinícola para o nosso território, um projeto estruturante e importante a médio e longo prazo”.

 

Multimédia1Foto | José Miguel Almeida, presidente da Adega Cooperativa de Vidigueira, Cuba e Alvito 

 

“O TRABALHO DE ACOMPANHAMENTO E PREVENÇÃO REALIZADO ESPELHA-SE NA ATUAL DIMINUIÇÃO DE COMUNICAÇÕES DE SITUAÇÃO DE PERIGO”

As comissões de proteção de crianças e jovens (CPCJ) promovem os direitos da criança e do jovem de forma a prevenir ou pôr termo a situações de perigo suscetíveis de afetar a sua segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento integral.

 

“Desta forma, as CPCJ encontram-se num patamar intermédio entre a sociedade civil e o ministério público”, esclarece Ana Paula Cardoso, presidente da CPCJ de Vidigueira, “possibilitando o acompanhamento de situação considerada como de perigo para a criança ou o jovem, até aos 18 anos, com um acordo de promoção e proteção, onde sejam integrados os intervenientes considerados como necessários (familiares e técnicos) na remoção do perigo identificado”.

 

Com esses mesmos objetivos, a CPCJ de Vidigueira, a funcionar desde 2007, possibilita a articulação entre diversas entidades do concelho, com representação na comissão, pretendendo “envolver e responsabilizar cada elemento pelo cumprimento dos objetivos contidos no plano anual de ação da comissão. Plano esse elaborado em equipa, por forma a envolver as entidades representadas e sensibilizar a comunidade do concelho”, elucida a presidente.

 

Desta forma, o plano, contemplando a elaboração de atividades para e com a comunidade, tem, de acordo com a responsável, o objetivo de: promover ações de sensibilização no âmbito da prevenção, divulgação e alteração de comportamentos de risco, de forma a facilitar uma visão integrada das situações de risco/perigo; responsabilizar as famílias na vida escolar, pessoal e social dos filhos/educandos; dar continuidade à divulgação da CPCJ junto da comunidade (enquadramento, contactos, tipo de sinalizações); promover ações de sensibilização anti bullying; reforçar o papel dos adultos e das instituições na promoção e proteção da Convenção dos Direitos das Crianças; sensibilizar para a prevenção dos maus-tratos na infância e juventude e abordar a temática do abuso sexual das crianças.

 

Na última década, em Vidigueira, concelho constituído, de acordo com os Censos 2021, por 5175 residentes, dos quais 663 são crianças dos zero aos 14 anos e 245 são jovens entre os 15 e os 19 anos, “o volume processual foi oscilando entre diferentes valores de comunicações de situação de perigo, com anos com um número menor (45) e anos com elevadas comunicações/entradas (107)”, diz Ana Paula Cardoso.

 

“Esta oscilação não tem uma explicação única que a justifique”, sendo que, “as comunicações de situação de perigo enviadas, maioritariamente pelas forças de segurança e estabelecimentos de ensino”, identificam várias problemáticas comprometedoras do bem-estar e desenvolvimento da criança. Nomeadamente, a violência doméstica, a negligência ao nível educativo, com falta de supervisão e acompanhamento familiar, e os comportamentos antissociais e de indisciplina, registados em maior número nos anos em que ocorreu a pandemia, período no qual “a CPCJ esteve sempre presente física e digitalmente, possibilitando a rápida capacidade de resposta, adequada à problemática apresentada”, informa Ana Paula Cardoso.

 

A presidente da CPCJ de Vidigueira sublinha que as medidas urgentes a serem implementadas na região, para que as situações de vulnerabilidade social possam ser eficazmente combatidas e debeladas, “são de carácter estrutural e nacional, já que, a nível local, se procura dar as respostas necessárias para a remoção da situação de perigo identificada de acordo com os meios disponíveis”.

 

E avança: “Importa salientar que a ausência dos referidos fatores estruturais, a nível nacional, repercutem-se localmente nas dificuldades de suporte e acompanhamento parental, de estabilidade de vínculo laboral, do respeito pelos horários de trabalho que permitam o fundamental acompanhamento familiar, de acesso gratuito a serviços de saúde e de resposta aos cuidados de saúde primários e de os pais e cuidadores poderem usufruir de tempo útil, familiar de vivência cultural com os seus descendentes”.

 

Todos estes fatores são, acentua a responsável, “de risco na construção e vivência integral dos direitos das crianças, promovidos pela comissão nas suas ações de sensibilização e prevenção, já que é inegável a importância da defesa dos mesmos para o crescimento e desenvolvimento saudáveis das nossas crianças e jovens”.

 

Relativamente aos desafios que se colocam neste ano à CPCJ de Vidigueira, Ana Paula Cardoso considera como essencial a continuidade da capacidade de resposta da instituição, em estreita colaboração com as entidades de primeira linha locais, nas suas áreas de competência (saúde, educação, serviço social, apoio municipal…), às situações identificadas, sendo que “o trabalho de acompanhamento e prevenção já realizado espelha-se na atual diminuição de comunicações de situação de perigo enviadas para a CPCJ de Vidigueira”.

 

Multimédia2Foto | Ana Paula Cardoso, presidente da Comissão de Proteção de Crianças e Jovens de Vidigueira

Comentários