Diário do Alentejo

Distrito de Beja já terá acolhido 250 refugiados ucranianos

05 de abril 2022 - 09:00
Ilustração | Susa MonteiroIlustração | Susa Monteiro

Segundo dados disponibilizados pelos centros de apoio à integração de migrantes, e também pelas câmaras municipais, o distrito de Beja terá acolhido, até 21 de março, cerca de 250 refugiados oriundos da Ucrânia. A esmagadora maioria são mulheres e crianças de nacionalidade ucraniana que foram acolhidas em casa de familiares ou amigos.

 

Texto Nélia Pedrosa

 

O Centro Nacional de Apoio à Integração de Migrantes (Cnaim) de Beja tinha atendido até há duas semanas, 62 refugiados vindos da Ucrânia em consequência da invasão russa de 24 de fevereiro, adiantou ao “Diário do Alentejo” a alta-comissária para as Migrações, Sónia Pereira.

 

Destes refugiados, na esmagadora maioria de nacionalidade ucraniana, 61 por cento são mulheres e “cerca de um terço” são menores. Recorde-se que devido à lei marcial, os homens entre os 18 e os 60 anos estão proibidos de saírem da Ucrânia.

 

 A totalidade dos refugiados atendidos pelo Cnaim de Beja, entidade que resulta de um protocolo de colaboração entre o Alto Comissariado para as Migrações (ACM) e a Câmara de Beja, foi acolhida em casa de familiares ou amigos que já residiam na região. Embora não disponha de dados concretos, a alta-comissária sublinha que “o mais expectável” é que estes 62 refugiados tenham sido acolhidos “no concelho de Beja ou nas proximidades”. “Em zonas do Baixo Alentejo que fiquem mais distantes do Cnaim de Beja, [é possível que os refugiados] se desloquem a outros serviços”, frisa, adiantando que os dados de que o centro nacional de Beja dispõe “são efetivamente uma aproximação mais fiel àquilo que se estará a passar no concelho de Beja”.

 

Segundo avança Sónia Pereira, a principal preocupação dos refugiados prende-se com o pedido de proteção temporária, que permite aos cidadãos que o requeiram ter acesso aos números de identificação fiscal, de Segurança Social e do Serviço Nacional de Saúde, podendo assim beneficiar destes serviços e ingressar no mercado de trabalho.

 

Quinze dos cidadãos adultos atendidos pelo Cnaim de Beja já foram encaminhados para o Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP). Apesar de ainda não haver registo de colocações no mercado de trabalho, a alta-comissária salienta que existem “ofertas de emprego, muitas que também incluem alojamento”, o que considera ser “muito positivo para o processo de integração na região”.

 

 Também através do IEFP, arrancou no dia 23 de março , em Beja, a primeira turma do curso Português Língua de Acolhimento destinado aos refugiados, estando “uma segunda turma a ser organizada”, revela Sónia Pereira. Está previsto ainda, “muito em breve”, a integração de um jovem ucraniano “num curso profissional no Centro de Formação Profissional de Beja”.

 

As crianças em idade escolar, ao nível do ensino básico, foram, por sua vez, encaminhadas “para um agrupamento de escolas” de Beja, estando “já integradas”, o que “corresponde ao trabalho que está a ser feito a nível nacional de encaminhamento rápido das crianças para as escolas e sua integração escolar”, diz a responsável.

 

Há cerca de duas semanas, o ministro da Educação, citado pela Lusa, explicou que os alunos ucranianos que chegam agora às escolas são desde logo integrados numa turma, mas o primeiro passo é terem aulas de Português. “Depois, paulatinamente, vão entrando no currículo e esse é um processo que é muito comum às escolas portuguesas”, referiu Tiago Brandão Rodrigues.

 

Para agilizar a integração dos alunos beneficiários ou requerentes de proteção internacional, o Ministério da Educação definiu medidas extraordinárias para o seu acolhimento nas escolas, estando desde já assegurado o acesso ao apoio social escolar.

 

Para além do registo de pedidos de proteção temporária na plataforma do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) e do encaminhamento para o IEFP e agrupamentos de escolas, o Cnaim de Beja disponibiliza apoio psicológico e serviços de enfermagem, em parceria com a Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo. Nos casos em que se verifica necessidade “de ajuda alimentar, de vestuário, de medicamentos”, é feito o encaminhamento “para lojas sociais e outras respostas de intervenção social habituais”. A partir do momento em que lhes é atribuído um número de identificação fiscal, “podem aceder às prestações sociais que estão disponíveis através da Segurança Social para as pessoas que se encontram ao abrigo destes mecanismos de proteção internacional em Portugal”, explica a alta-comissária.

 

Aos 62 refugiados atendidos até ao dia 21 de março pelo Cnaim de Beja acrescem ainda os acompanhados pelos quatro centros locais de apoio à integração de migrantes (Claim) existentes no distrito – em Beja, Moura, Odemira e Serpa – e que resultam de parcerias estabelecidas entre o ACM e autarquias ou entidades da sociedade civil.

 

“Com a facilidade de se fazerem pedidos de proteção temporária diretamente na plataforma [do SEF] a expectativa é que os centros locais possam dar muito apoio nesse processo, sem necessidade de se deslocarem a outros serviços”, sublinha Sónia Pereira, admitindo que poderá haver refugiados que se dirijam a mais do que um centro, o que poderá originar erros na contagem do número exato de cidadãos que terão chegado já ao distrito de Beja.

 

A forma “mais fiável” de obter esse número, frisa, será através dos pedidos de proteção efetuados junto do SEF. Contactado pelo “Diário do Alentejo”, o SEF informou, no entanto, de que não dispõe desses dados por distrito.

 

Dos quatro Claim existentes no distrito, só os de Beja e Odemira tinham atendido refugiados oriundos da Ucrânia. De acordo com o Claim de Beja, que está integrado na Cáritas e que abrange ainda os concelhos de Alvito, Cuba, Ferreira do Alentejo e Vidigueira, tinham sido atendidos 41 refugiados, na esmagadora maioria mulheres de nacionalidade ucraniana. Sete eram menores. O centro sublinha, no entanto, que só oito cidadãos solicitaram registo para pedido de proteção temporária, o que significa que a maior parte poderá “ter vindo encaminhada por outros serviços, nomeadamente, o Cnaim de Beja, onde já efetuaram esse registo”.

 

O Claim de Odemira, integrado na Taipa, atendeu, por sua vez, 13 refugiados, “maioritariamente crianças e bebés acompanhados pelas mães e idosos”, tendo prestado apoio, nomeadamente, no registo de pedidos de proteção e na articulação com os agrupamentos de escolas para a inscrição dos menores.

 

O número de refugiados que terão chegado ao concelho de Odemira é, no entanto, bastante superior aos atendimentos efetuados pelo Claim. Segundo Isabel Palma Raposo, vereadora na Câmara de Odemira, terão chegado já cerca de 120 cidadãos, “maioritariamente mulheres e crianças”. Muitos “têm sido acolhidos no Colégio Nossa Senhora da Graça em Vila Nova de Milfontes” e outros ficam “com familiares e amigos da comunidade ucraniana residente no concelho”. E já há menores integrados em escolas.

 

A autarca explica que o município disponibilizou apoio ao referido colégio “para refeições e material escolar, estando a analisar outras formas de apoio”. Tem estado também “em contacto com várias entidades diretamente envolvidas nas respostas aos refugiados ucranianos”, para além de estar a preparar uma página na plataforma online do município que centraliza informação vária destinada a esta comunidade.

 

Relativamente ao Claim de Moura, integrado na Cooperativa Mourense de Interesse Público de Responsabilidade Limitada, Comoiprel, é expectável que venha a fazer o acompanhamento de refugiados nos próximos dias, uma vez que na segunda-feira chegaram ao concelho 30 refugiados, 20 adultos e 10 crianças, que foram alojados temporariamente, pela autarquia, nas Zonas de Concentração e Apoio à População de Safara, estando, progressivamente, a ser realojados em casas, adianta a vereadora Lurdes Balola.

 

A alta-comissária para as Migrações sublinha que a “coordenação entre as entidades que operam, quer a nível nacional, quer a nível local” se tem traduzido “numa experiência extraordinária” e que “contribui de forma decisiva para o sucesso desta operação” que teve “de ser montada de forma muito rápida, em contexto de emergência, já com um fluxo grande de pessoas”.

 

No caso de Beja, o denominado Grupo de Trabalho do Baixo Alentejo, liderado pelo ACM, e que integra a Autoridade para as Condições do Trabalho, IEFP, Segurança Social, SEF, Proteção Civil de Beja, Câmara de Beja e Caritas, “garante que há um acompanhamento próximo às situações que surgem para que não haja pessoas em situação de falta de proteção ou de acompanhamento”.

 

A responsável destaca ainda criação da plataforma “Portugal for Ukraine”, que visa congregar todas as ações do Estado Português em relação ao conflito na Ucrânia, assim como do site “SOS Ucrânia”, do ACM, que “permite, de uma forma rápida, disponibilizar informação útil e atualizada”, destinada não só aos refugiados, mas também às entidades que estão no terreno e “aos cidadãos que queiram ajudar”.

 

MUNICÍPIOS “SÃO ATORES CHAVE EM TODO ESTE PROCESSO”

O ACM tem estado também em “permanente contacto” com as comunidades intermunicipais “para partilha de informação e assim garantirmos que chega aos municípios, que são os atores chave em todo este processo”, realça Sónia Pereira.

 

As câmaras municipais têm tido, desde o início do conflito, um papel ativo na resposta de assistência aos cidadãos vindos da Ucrânia, através de vários tipos de apoio, em articulação com outras entidades locais.

 

Para além de disponibilizar alojamento aos 30 refugiados que já chegaram ao concelho, a Câmara de Moura desenvolveu um conjunto de medidas de apoio à comunidade ucraniana, em conjunto entidades parceiras, refere a vereadora Lurdes Balola. Segundo a autarca, algumas das propostas passam pelo “apoio ao arrendamento e crédito habitacional privado” e também nas áreas da saúde e alimentar.

 

O presidente da Câmara de Aljustrel explica, por sua vez, que a autarquia “reuniu-se, numa primeira fase, com a comunidade ucraniana residente no concelho e manifestou-lhe o seu apoio, nomeadamente, para a auxiliar no que estiver ao seu alcance e dentro das suas competências e possibilidades”. Nesse sentido, disponibilizou apoio psicológico, “tendo também colocado ao serviço destes cidadãos apoio camarário para mediar a comunicação com as respetivas famílias e com as entidades competentes”.

 

Carlos Teles sublinha que a câmara, “em articulação com as demais entidades, dará uma resposta consoante forem surgindo as necessidades, avaliando-se cada situação de emergência e dentro das suas competências e possibilidades”.

 

Até ao momento terão chegado a Aljustrel cinco refugiados, “que vieram ter com as suas famílias, que já residiam, há alguns anos”, no concelho. O presidente da câmara frisa, no entanto, “que poderão ter chegado outros cidadãos de nacionalidade ucraniana” de que não tenham conhecimento.

 

Castro Verde acolheu até há duas semanas, segundo a câmara, duas famílias de refugiados, compostas por duas mulheres e cinco menores, que se encontram alojadas em casa de familiares. Está prevista a chegada de mais quatro famílias – seis mulheres, um homem e nove menores.

 

A autarquia irá disponibilizar “todo o apoio necessário, dentro do que são as suas capacidades, nomeadamente, saúde, educação, alojamento, alimentação”, refere. Em relação às crianças em idade escolar, “foi manifestado o interesse por parte de membros da comunidade em continuar a assegurar acompanhamento online ao desenrolar das aulas na Ucrânia”.

 

Já Odete Borralho, vereadora na Câmara de Serpa, adianta que a autarquia “não tem registo oficial da chegada de cidadãos provenientes da Ucrânia”. Tem conhecimento, no entanto, que, há três semanas, duas mulheres de nacionalidade indiana, “acompanhadas por um cidadão da mesma nacionalidade residente em Serpa, estiveram na loja social da autarquia, referindo que vinham da Ucrânia”. Solicitaram “apenas roupas e outros bens de primeira necessidade”.

 

A vereadora sublinha que o Claim de Serpa, “de que a câmara é parceira, está a fazer o trabalho de levantamento de necessidades, contactando todas as famílias ucranianas residentes no concelho”, sendo que, até ao momento, “apenas uma referiu estar à espera de um familiar”.

 

A autarca frisa, ainda, que o Claim de Serpa, “que opera em Serpa, Pias e Brinches”, está vocacionada “para o acompanhamento de migrantes” e é a este serviço que recorrem, “seja no sentido de obterem informações sobre a sua legalização, cursos de línguas, emprego, entre muitas outras questões”. “Esta tem sido a ligação entre migrantes (de várias nacionalidades) e a resolução de muitas das necessidades que estes deslocados sentem”, diz, frisando que a “realidade dos deslocados de guerra será outra” e que “a informação que vai chegando às autarquias é ainda escassa”.

Ao concelho de Vidigueira terão chegado, até ao momento, duas mulheres e duas crianças de nacionalidade ucraniana, que ficaram alojadas com familiares residentes no concelho. Embora a autarquia tenha criado um gabinete de crise no início do mês de março, por despacho do presidente da câmara, e tenha colocado à disposição “os apoios necessários” para os cidadãos oriundos da Ucrânia, “até à data” ainda não foi solicitado qualquer tipo de ajuda. A câmara frisa, ainda, que “já foram identificadas empresas que operam nas áreas da indústria do vinho, agricultura e produção animal, com disponibilidade apara integrar migrantes oriundos da Ucrânia”.

 

Outros municípios do distrito onde não existe ainda registo de refugiados ucranianos, como Mértola, estão também disponíveis para implementar medidas de apoio caso seja necessário.

 

O “Diário do Alentejo” tentou ainda obter informações sobre as medidas que estão a ser promovidas pelas câmaras de Almodôvar, Alvito, Barrancos, Cuba e Ferreira do Alentejo, mas tal não foi possível até ao fecho desta edição.

 

MISERICÓRDIA DE BEJA ALOJA REFUGIADOS

A Santa Casa da Misericórdia recebeu, através da União das Misericórdias Portuguesas, duas mulheres de 29 anos e três crianças menores, entre os três e os nove anos, oriundas da Ucrânia.

Segundo Raquel Amaro, assistente social da Misericórdia responsável pelo acompanhamento dos refugiados, as cinco pessoas, que “não têm familiares em Portugal”, foram alojadas temporariamente na Pousada da Juventude de Beja, sendo que “para a semana irão para um apartamento disponibilizado pela Misericórdia”. Para além do alojamento, a Misericórdia presta “apoio ao nível da alimentação, saúde, educação e integração no mercado de trabalho”. As crianças mais novas já estão a frequentar a creche e o menor de nove anos também já está integrado numa turma. Raquel Amaro sublinha que, “até à data”, manifestam “a vontade de ficarem em Portugal”.

 

*O artigo saiu na edição de 2083 no passado dia 25 de março de 2022, os dados referentes ao número de refugiados no distrito já podem ter sofrido alterações;

Comentários