Diário do Alentejo

CIMBAL apresenta medidas "urgentes" para mitigar a seca

09 de fevereiro 2022 - 16:00

Decorreu durante o dia de hoje (09/02) uma reunião do conselho intermunicipal da Comunidade Intermunicipal do Baixo Alentejo (CIMBAL) que juntou 13 dos 14 concelhos do distrito de Beja de onde resultou de um conjunto de medidas “urgentes” e a “médio prazo” para mitigar os efeitos da seca.

 

“Resultante dos contactos estabelecidos” pelos autarcas “com algumas das associações mais representativas do setor”, é proposto “um conjunto de intervenções e de apoios de forma a mitigar” e “proporcionar condições para que a atividade agrícola e agropecuária consiga ultrapassar este dificílimo momento”, sublinha a CIMBAL, afirmando que as mesmas serão entregues ao Governo.

 

Entre as 12 medidas urgentes propostas pelos municípios surgem a concessão de ajudas a fundo perdido para construção de charcas, para a aquisição de depósitos de água e para suportar os custos da distribuição da água, para a autorização para pastoreio de pousios e culturas anuais e a atribuição de apoios a fundo perdido à pecuária, “nomeadamente no transporte de água e equipamento de abeberamento de animais”, assim como às culturas de outono-inverno.

 

Os municípios pedem ainda que seja autorizado “o acesso à água para abeberamento de gado e a rega de sobrevivência das culturas” nos aproveitamentos hidroagrícolas e a aquisição temporária “de alimentação convencional” nas explorações pecuárias em modo de produção biológico. Bem como,  permitir o alargamento do “intervalo entre partos” nas fêmeas de espécies pecuárias de modo “a não penalizar os prémios aos criadores” e considerar “a elegibilidade de fêmeas jovens para prémio” são outras das propostas.

 

Os autarcas alentejanos querem igualmente que seja reduzido “o período de retenção dos animais no âmbito das ajudas comunitárias” e antecipado “o pagamento dos apoios aos agricultores” no âmbito da Política Agrícola Comum (PAC). É também solicitada a definição de um preço para a água de Alqueva para 2022 “de modo a garantir a sustentabilidade e sobrevivência de culturas já instaladas” e a agilização do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), “de modo a apoiar a instalação de painéis de energia fotovoltaica”.

 

Entre as medidas de médio prazo a propor ao futuro governo surgem a criação de “condições para implementar” seguros agrícolas que “considerem também a seca” e a reativação da eletricidade verde, “definindo uma taxa de apoio que compense efetivamente os agricultores pelos aumentos do custo da energia”. Assim como, a ligação da barragem do Roxo, no concelho de Aljustrel, à albufeira do Monte da Rocha, no concelho de Ourique, e a constituição de uma “rede hidrológica nacional”, que ligue “o norte ao sul” e “garanta água para os vários usos e uma gestão mais sustentável”.

 

Relembre-se que o ‘Diário do Alentejo’ já tinha noticiado que o presidente da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), Eduardo Oliveira e Sousa, já tinha criticado o Governo por tomar medidas “sempre em cima do joelho” e, por isso, nunca serem “suficientes”.

 

O PROBLEMA DA SECA É “GRAVISSÍMO”

O presidente da CIMBAL, António Bota, reconheceu também que o problema da seca na região é “gravíssimo” e espera que o futuro Governo encare a situação “com olhos de urgência”, porque o Alentejo precisa de água "nomeadamente para o pastoreio e para a atividade agro-pastoril”.

 

Segundo António Bota, o Baixo Alentejo “é das regiões do país mais secas” e “com menos água distribuída, não obstante a barragem do Alqueva servir alguns concelhos”. E a situação “é preocupante no imediato porque os agricultores não têm pastagens para os animais” nem “reservas de cereais, fenos, silagens ou palha”, alerta.

 

O autarca alentejano diz mesmo que “aquilo que se avizinha a médio e longo prazo não é muito agradável de observar”, pois “se não chover também coloca em risco as culturas do próximo ano”.

 

Nos últimos anos, face às “alterações climáticas estamos sempre com o ‘coração nas mãos’ e urge tomar medidas rápidas”, que “não podem ser ‘empurradas’ com a barriga” e que “têm de ser executadas já”, reforça. Afirmando que o Governo tem de olhar “para o Baixo Alentejo com ‘olhos de urgência’”, caso contrário “daqui a pouco tempo vamos ter turistas a ver mais um deserto que fica a sul de Beja, porque não há possibilidade de continuar a produzir nestes terrenos”, conclui.

 

Também o investigador Francisco Cordovil avisa quanto á gravidade da situação de seca que se faz sentir em todo o território, mas especialmente no Alentejo, que que vai continuar “nos próximos anos”.

Para o professor aposentado do Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE) é urgente adaptar a agricultura e a floresta a este “contexto muito difícil”, uma vez que além das demonstrações de “solidariedade para com as pessoas que estão a ser atingidas agora e que precisam de ser apoiadas” temos enquanto população de “adaptarmos a nossa vida a estas circunstâncias, nomeadamente na agricultura”.

 

Segundo Francisco Cordovil, Portugal precisa de desenvolver “uma agricultura que respeite muito a utilização da água, de uma maneira que chegue a todas as pessoas”, mas também produzindo culturas que “possam resistir a condições climáticas mais duras”.

Alertando também para “o problema dos incêndios florestais”, cujo risco “vai aumentar muito” devido à seca num prazo “relativamente curto”, pois “os incêndios, que normalmente começavam no verão, vão começar na primavera”, e, por isso, é preciso “manter a agricultura nas zonas que atualmente têm maior arborização, porque, sem isso, a floresta é muito vulnerável”.

 

“A mensagem principal é adaptar a paisagem e o tipo de agricultura que temos a um contexto muito difícil de seca”, alerta, avisando que “não podemos ter uma floresta tão contínua de espécies altamente inflamáveis, precisamos de ter maior compartimentação”.

 

Francisco Cordovil sublinha ainda que a “curto prazo”, deve-se apoiar os agricultores para haver agricultura “nos territórios vulneráveis”, porque “grande parte deles tem muito pinhal e muito eucaliptal e, sem uma agricultura de interposição, ficam muito expostos”. Da mesma forma que, é importante olhar sobretudo a agricultura “pequena e de proximidade, a qual “cria interposição entre os meios florestais e, normalmente, uma cintura verde em torno das povoações”, o que “também é um fator de segurança”.

 

Quanto ao regadio, o investigador reconhece que “é fundamental numa agricultura mediterrânica, mas levanta problemas sérios em relação à questão da água”. Por um lado, é preciso “ver até que ponto” existe “água suficiente para o regadio” que se está a criar no país e, por outro, “a utilização da água em agricultura” até pode “ser mais eficiente em culturas de outono-inverno”.

E a instalação de regadios “envolve uma despesa grande financiada pelos contribuintes”, pelo que o professor sugere que os proprietários agrícolas que beneficiam das infraestruturas de rega, sobretudo os grandes, possam “ir pagando, não só com impostos correntes, mas também com taxas, uma parte do que foi o custo do investimento inicial”.

 

 

 

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