Diário do Alentejo

Beja: Mais de três mil idosos vivem sozinhos ou isolados

12 de dezembro 2020 - 14:10

Mais de três mil idosos vivem sozinhos ou isolados no distrito de Beja. Apesar de se verificar uma redução significativa, em relação a anos anteriores, é preciso “desenvolver sinergias para mitigar os problemas da população envelhecida”.

 

Texto Marta Louro

 

No distrito de Beja existem 3 403 idosos que vivem sozinhos ou isolados. Os dados são da GNR, no âmbito da operação “Censos Sénior 2020”, e mostram que em relação a 2019 houve uma redução de 170 pessoas em idade avançada a viverem nessas condições. Quando comparado com 2017 e 2018, houve uma redução de 443 idosos e 312 idosos respetivamente. São os concelhos de Odemira, com (959 idosos isolados) e Almodôvar (516) que apresentam o número mais elevado, do distrito, de pessoas a viverem sozinhas ou isoladas. Do lado oposto, com um menor número de pessoas a viverem nessas condições, estão os concelhos de Alvito (57) e Ferreira do Alentejo (41). No concelho de Beja foram recenseados 306 idosos a viverem sozinhos.

 

 

“O envelhecimento da população propícia, um aumento de pessoas em idades avançadas e que vivem sozinhas e distantes”, diz ao “DA” a demografia Maria Filomena Mendes, acrescentando que os resultados obtidos nos “Censos Sénior 2020” podem já “ter algum efeito da mortalidade deste ano, seja provocada pela covid-19 ou outro tipo de doença. A nível nacional houve um aumento da mortalidade, esse aumento incidiu significativamente nas pessoas mais idosas, logo, provavelmente, pode ter havido uma redução do número de idosos a viverem sozinhos. O que poderá também ter acontecido é que alguns desses idosos podem ter mudado de residência para localidades mais próximas dos familiares, acabando por não estar tão isolados”.

 

Em relação aos concelhos do Baixo Alentejo que apresentam o maior número de pessoas a viver nessas condições, Maria Filomena Mendes entende que “podemos estar a falar de concelhos que têm elevados níveis de envelhecimento há muitos anos, o que vai fazendo com que as populações que vão restando nesses concelhos sejam mais envelhecidas”.

 

“Contrariamente”, prossegue, nos concelhos com menor número de idosos isolados, podemos ter “um maior número de jovens ou pessoas em idade ativa, ou seja, mesmo que [esses concelhos] tenham muitos idosos, a sua proporção dentro da população é mais baixa. Quando existe um grande número de emigrantes, a dinâmica populacional, também acaba por ser diferente”.

“A população fala muito em isolamento, mas muitos idosos que vivem sozinhos e isolados, por exemplo em montes, estão lá uma vida inteira, por isso estão habituados. Essa realidade prova que não podemos falar do isolamento como fator desencadeante para o que quer que seja”, explica Ana Matos Pires, diretora do serviço de psiquiatria da Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo (Ulsba). “A questão do isolamento na saúde mental não é algo linear. Se estivermos a falar de isolamento no sentido de falta de apoio, obviamente que é pernicioso para a terceira idade, mas também, para qualquer faixa etária”.

 

Segundo Ana Matos Pires, “não podemos, de maneira nenhuma, pensar que o isolamento geográfico é um fator de mau prognóstico. Os censos seniores [realizados pela GNR] são muito importantes porque permitem identificar todas as pessoas que estão em isolamento geográfico e permitem saber quem precisa de ajuda. O papel da GNR é muito importante para identificar as pessoas, mas não podemos dizer que o isolamento em si, desta maneira, seja um fator preditivo de má saúde mental”.

 

Neste momento, está em fase de publicação um estudo realizado pela Universidade Nova e pelo Observatório dos Comportamentos Suicidários do Serviço de Psiquiatria da Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo, que analisou três grupos de pessoas com mais de 65 anos. “O estudo vem mostrar que a incidência do risco de depressão e fatores de risco de suicido não são prevalentes no grupo das pessoas dos Censos Sénior”, refere a diretor do serviço de psiquiatria da Ulsba.

 

Maria Cistina Faria, coordenadora do Observatório das Dinâmicas do Envelhecimento, do Instituto Politécnico de Beja (IPBeja) salienta que estes registos anuais “são relevantes para uma ação concertada e continuada dos decisores políticos, autoridades de saúde, educacionais e comunidade, no sentido de desenvolverem sinergias em conjunto que permitam mitigar os problemas da população envelhecida de cada região, que vive em casa na comunidade, nomeadamente, ao nível da saúde, social, educacional, segurança, ambiente físico, inclusão e mobilidade das pessoas mais velhas”.

 

“Os dados falam por si, e a GNR mostra estar a realizar um trabalho meritório. A comunidade também tem estado atenta a esta realidade e tem investido em projetos e estruturas de apoio aos idosos que permitam ultrapassar as necessidades encontradas nesta população e promover a capacitação das pessoas mais velhas que vivem em casa”, acrescenta.

 

Para o próximo ano, diz Maria Cistina Faria, “está previsto um conjunto de ações de sensibilização, junto das pessoas idosas, no sentido da adoção de comportamentos de segurança que permitam reduzir o risco de se tornarem vítimas de crimes (situações de violência, de burla ou furto), de prevenir comportamentos de risco associados ao consumo de álcool e adoção de medidas preventivas de propagação da pandemia de covid-19”.

 

Por último, Maria Cristina Faria defende que “em segurança e pela sua saúde psicológica, física, social e ambiental, temos de nos aproximar das pessoas mais velhas e com elas encontrar estratégias que viabilizem uma vida de bem-estar, gratificante e autónoma na comunidade, mesmo em condições adversas. É importante dar oportunidade às equipas multidisciplinares especializadas em gerontologia e criar condições ao seu trabalho de proximidade com as pessoas mais velhas da comunidade, de modo a podermos observar e garantir uma sociedade longeva com qualidade de vida nos próximos anos”.

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