Diário do Alentejo

Projeto da Cáritas de Beja quer prevenir a demência

26 de novembro 2020 - 11:40
Foto | Anderson SousaFoto | Anderson Sousa

“Humanamente @ctivos-no combate à covid-19” é o mote do projeto levado a cabo pela Cáritas Diocesana de Beja. No terreno, desde maio deste ano, chega a cerca de 30 idosos, com idades compreendidas entre os 70 e os 86 anos, residentes na cidade de Beja e nas freguesias da Cabeça Gorda, Boavista e Nossa Senhora das Neves.

 

Texto Marta Louro

 

O principal objetivo do programa é a prevenção de demências, a ocupação do ócio e do envelhecimento ativo, através da teleterapia e da terapia ocupacional. “Numa lógica de intervenção multidisciplinar e com recurso a novas tecnologias”, a Cáritas “procura atenuar o isolamento da população idosa – que já acompanhava – e contribuir não só para a satisfação das suas necessidades básicas, mas também para a melhoria do seu bem-estar”. Financiado pelo Programa “Cuida” da Fundação Calouste Gulbenkian e pelo Instituto da Segurança Social tem como parceiros a Associação Alememória e a Câmara de Beja.

 

“Antes da pandemia, os idosos” acompanhados pelo Serviço de Apoio Domiciliário encontravam nas instalações da Cáritas o suporte para “atividades como a ginástica, a costura e a informática”, mas a covid-19 “tirou-lhes” essas oportunidades, lamenta Mariana Côco, diretora técnica do serviço de apoio domiciliário da instituição.

 

Para levar a cabo o projeto é preciso um ‘tablet’ equipado com matérias de treino cognitivo e uma terapeuta ocupacional que entra em casa dos idosos – uma vez por semana e de 15 em 15 dias (no caso dos utentes mais autónomos) - com todos os cuidados” recomendados pela Direção-Geral da Saúde (DGS). “Para além da ocupação, a terapeuta ocupacional tem também o papel de trabalhar a parte física e motora dos utentes. Esse trabalho é feito dentro das suas próprias habitações”, explica Mariana Côco, acrescentando que se trata de um “projeto limitado no tempo”, que irá terminar no próximo dia 31 de dezembro. “Para nós, o importante é que exista continuidade deste tipo de trabalho, porque conseguimos perceber que os idosos, para além da melhoria física e psicológica estão mais felizes, desde que a terapeuta vai a casa deles”.

 

Sara Silvério, terapeuta ocupacional, explica ao “DA” que a Cáritas “abraçou este projeto para atenuar o isolamento social dos idosos causado pela pandemia da covid-19”. O programa é desenvolvido “através de uma intervenção com suporte nas novas tecnologias e de um treino cognitivo – com recursos a cores e sons – que é personalizado tento em conta as dificuldades e as necessidades de cada utente”.

 

Segundo a terapeuta, igualmente importantes são as videochamadas feitas com os familiares. Ainda para mais numa altura em que os familiares acabam por não se visitar devido ao risco de contágio. “As pessoas acabam por se fechar um bocadinho, há uma privação ocupacional que afeta o dia a dia e se reflete na parte emocional das pessoas, porque os utentes que fazem parte do” Humanamente @ctivos-no combate à covid-19 sentem-se sozinhos, muito ansiosos e preocupados”.

 

A pouco mais de um mês do fim do projeto, Sara Silvério antecipa um balanço muito positivo da iniciativa: “A maior parte dos utentes evoluiu muito. Está a ser muito gratificante quer a nível profissional, quer a nível pessoal”. A pandemia obrigou-a a reinventar-se e mostrar uma nova realidade do seu trabalho.

 

Maria de Lurdes Vaz (80 anos) e Manuel dos Santos Vaz (90), ambos residentes em Beja, são dois dos participantes no programa. Manuel teve um acidente vascular cerebral (AVC) há quatro anos, o que o deixou com algumas dificuldades de locomoção. Desde que a pandemia começou que o antigo funcionário público “praticamente não sai” de casa. Apesar da distância em relação aos restantes membros da família, o casal diz falar “muito” com o filho e os dois netos: “O meu filho vem cá a casa muitas vezes, quando não vem telefona”.

 

“Quando vejo o telejornal, sinto-me bem ou mal consoante as notícias que há”, refere Manuel, confessando “ter medo de vir a ser infetado pelo vírus”. Aos seus problemas de saúde soma-se o facto de a mulher, maria de Lurdes, ser asmáticas e, portanto, uma doente de risco para a covid-19. “Vou passando os dias aqui por causa”. Saídas só para “ir deitar o lixo fora ou ao padeiro. Não tenho medo da pandemia, tenho é medo de sofrer e fazer sofrer os outros. Isto está de uma tal maneira que ninguém está feliz. Portugal está uma miséria”. O casal diz sentir-se “mais acompanhado e mais feliz” quando a terapeuta Sara Silvério lhes bate à porta. “Vem a nossa casa e isso é uma grande felicidade”.

 

Maria Adelina Soares, 79 anos, natural de Nossa Senhora das Neves, tem visto a sua saúde piorar ao longo dos tempos. A doença de Parkinson dificulta-lhe o andar. “Dou uns passinhos muito pequenos aqui em casa”. Sempre que pode passa a tarde de sábado com a filha e visita também a sua irmã que vive em Beja.

 

No âmbito do projeto da Cáritas, realiza atividades no ‘tablet’, “sempre com grande entusiasmo e gosta muito de concretizar o exercício, quase sempre, sem ajuda”. Participar no projeto, assegura, tem “sido muito bom, porque passo muito tempo em casa, devido ao meu problema de saúde”. A presença, habitual, da terapeuta ocupacional à sua casa é “uma mais-valia”, até para combater a solidão: “É uma companhia muito boa, falamos muito e durante essa hora e meia criamos momentos muito bons e partilhamos histórias” das nossas vidas.

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