Diário do Alentejo

À Mesa: Na Mó de cima em Albergaria dos Fusos

16 de outubro 2023 - 09:45
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António Catarino

Lá no alto da colina, o alvo casario alinhado em ruas de plano inclinado lobriga-se ao longe. Antiga sede de município com pelourinho, juiz e dois vereadores, Albergaria dos Fusos foi terra pertencente ao convento bejense de Santa Clara e mais tarde comprada por 200 mil réis (um euro na moeda atual) a D. Violante Moura por D. Álvaro, senhor de Tentúgal. Uma transação confirmada por el-rei D. Manuel I em 1516, ano em que a indústria do linho ainda não tinha atingido, provavelmente, a projeção alcançada mais tarde.

 

O topónimo – fuso é o instrumento para fiar à roca – está relacionado com tal atividade outrora muito ativa na povoação, que perdeu o estatuto de sede de município em 1801.

Hoje, integra a freguesia de Vila Ruiva (Cuba) e fica nas proximidades do recente Ecopark do Alentejo e da praia fluvial que recebeu o nome de Albergaria dos Fusos. Um conjunto harmonioso, bem enquadrado em termos paisagísticos e que é uma mais-valia para a região.

No trajeto para aquela zona de lazer, na travessia da localidade, A Mó é local de boa mesa. O restaurante, construído no local onde existiu um lagar –a velha mó ainda lá está, no exterior, recordando o passado da casa – ganhou maior dimensão, com uma sala em plano superior, mas manteve o ambiente acolhedor, confortável e familiar. Aliás comum ao café contíguo.

A cozinha tradicional alentejana é a divisa da casa, onde o casal Ferreira protagoniza um vai vem bem ritmado: D. Cidália oficia com muito saber e destreza nos fogões; o marido, simpático e eficiente, é inexcedível no serviço.

Os comeres tradicionais, desde a sopa da panela ao frango de fricassé; cabidela com batatas; bochechas com batata assada; pezinhos de coentrada; sopas de cação; cachaço no forno; caldo de achigã, marcam presença mais ou menos regular na ementa do dia, necessariamente, reduzida: apenas duas ou três opções.

Ao sábado, o cozido de grão é rei, mas há outros pratos não fixos como alternativa: gaspacho com peixe frito, em particular quando a canícula aperta; migas de poejo com cação frito; caldeirada de raia ou de chocos; bacalhau na telha.

As sopas de toucinho revelaram, com todo o esplendor, meticulosa culinária, feita com saber e que proporcionou saborosa (e desejada) harmonia de sabores. Algo que se vai perdendo na voragem da cozinha rápida e assética, que vai fazendo lei, infelizmente, um pouco por toda a parte.

Na mesma bitola de qualidade das sopas de toucinho, apresentou-se a moqueca de camarão, um prato que remete para outras latitudes.Nas sobremesas, brilham o toucinho do céu e o sassarico.

Garrafeira com referências de região.

Serviço muito simpático neste restaurante onde impera a simplicidade. Funciona só por marcação e onde a comidinha que chega à mesa é um regalo para o palato e dignifica a cozinha regional.

Esta casa continua na Mó de cima.

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