Diário do Alentejo

Crónica de Ana Paula Figueira: Não existem assuntos tabu

31 de janeiro 2023 - 09:00
Ilustração | Pedro E. SantosIlustração | Pedro E. Santos

Não existem assuntos tabu. E o silêncio nem sempre é de ouro. O que não é sinónimo de ausência de discrição ou de sensatez na referência a determinadas matérias.

 

O Instituto Politécnico de Beja (IPBeja) está a viver um período único e sui generis: a actual equipa da presidência tomou posse no final de Novembro de 2021; um vice-presidente deixou de o ser, a seu pedido, a partir do segundo semestre de 2022; posteriormente, um pro-presidente entendeu também abandonar a equipa; no início de Dezembro último, os directores e sub-directores das 4 escolas apresentaram renúncia ao cargo; chegados ao final da penúltima semana do mês de Janeiro, altura em que escrevo estas linhas, não são conhecidos os seus substitutos. Entretanto, a comunidade IPBeja recebeu alguns emails emanados, ora da presidência, ora do grupo demissionário, que ajudam a contextualizar a situação e indiciam o ambiente na instituição.

 

Tendo eu assumido responsabilidades conhecidas na anterior presidência do IPBeja e crente de que esta situação, a bem do pacifismo na instituição, seria resolvida num curtíssimo espaço de tempo, quando interpelada, escusei-me a quaisquer comentários, quer como docente na “casa” há três décadas, quer como cidadã.

 

Contudo, o conteúdo do documento remetido no início de Janeiro pelos directores e sub-directores onde são explicitadas as principais razões, sustentadas por um conjunto de anexos, que levaram ao seu pedido de demissão, como também o conteúdo, o estilo e o tom da mensagem de ano novo da presidência, enviada a seguir, são tão impactantes e perturbadores, que entendi agora abordar o assunto. Num dos espaços onde escrevo regularmente.

 

Mas não esperem juízos de valor: os emails, a esta altura já de domínio público, são esclarecedores.

 

Também não é meu propósito tomar abertamente partido, nem da presidência, nem dos colegas demissionários: sei que estar à frente de uma instituição como o IPBeja não é uma tarefa simples e fácil, apesar de isso não ser justificativa para quase tudo, ou para quase nada; tal como duvido que a insensatez tenha tolhido, de uma só vez, todos e tantos demissionários.

Albert Camus, no célebre discurso de aceitação do Prémio Nobel da Literatura, em 1957, fala de ética, de comprometimento e de cidadania, dizendo ainda que chega o momento em que é imprescindível fugir ao niilismo da época, procurando “… compreender em vez de julgar. E se houver que tomar partido, que seja aquele cuja sociedade, nas palavras de Nietzsche, não seja mais governada por um juiz, mas por um criador, seja ele um operário ou um intelectual”.

 

No início deste texto aludi ao pacifismo, “o rechaço da guerra, com a conseguinte afirmação de paz”. “Depois da tempestade vem a bonança”: tenho a convicção plena de que é isso que todos desejam (os). A bem da instituição e do melhor cumprimento da sua missão, tal como a bem de todos aqueles que nela trabalham (os). Mas, como alguém teve o cuidado de me lembrar e aproveito para citar: “o pacifismo não representa em si um bem. Por um lado, porque pode ser meramente formal e, por outro lado, porque pode impor escolhas que impedem um combate por causas justas, conduzindo à instalação de uma «paz podre», assente em regimes de servidão e domínio. Paz não é sinónimo de submissão.”

 

À data em que este texto é publicado, provavelmente já terá surgido uma resposta a este impasse, e o seu teor poderá mostrar-se, para alguns, um tanto extemporâneo. Como trabalhadora nesta “casa” desejo veementemente que apareça, o mais depressa possível, uma solução, digna, que enobreça o “nosso” IPBeja, e que valorize a almejada e necessária paz. Aquela que, tal como a matéria-prima de qualquer instituição de ensino superior - (produção de) conhecimento -, é livre por natureza.

 

A autora escreve de acordo com a antiga ortografia

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