Diário do Alentejo

Débora Água-Doce: “Sem o Alentejo não sei se seria quem sou, nem sei se as minhas palavras teriam afeto e emoção”

16 de outubro 2022 - 13:20
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Nasceu em Beja no ano de 1984 e cresceu num monte, rodeada de Natureza. “Vivia com os meus pais, uma avó e uma bisavó, ambas paternas, mais tarde, aos 10 anos, nasceu o meu irmão e passámos a ser mais completos.”

 

Diz recordar com carinho a vida rural, as brincadeiras na rua, onde corria pelos campos, em plena primavera, e apanhava florinhas, onde vivia rodeada de animais, de vida, de ar puro. “Tive uma galinha que foi minha companheira de parque e baloiço. Os animais sempre foram segurança e conforto.”

 

O percurso académico, e depois o profissional, resgataram-na do coração da planície e plantaram-na em Lisboa, onde vive atualmente, onde construiu toda a carreira e onde diz ser feliz com o propósito de vida que escolheu. “Sou Psicóloga Clínica, uma missão que abraço com respeito e dedicação, uma missão de Amor, de cura através das palavras. Gosto de Natureza. Gosto de Pessoas. Gosto da Lua. Gosto de gostar de viver. Amo animais e tenho um ser pequenino de quatro patas, o Óscar Maria, como companheiro de todas as “viagens”.

 

Eis, na primeira pessoa, Débora Água-Doce, fundadora da Clínica da Autoestima, blogger e autora de textos literários.

 

Texto Luís Miguel Ricardo

 

Quando e como foi descoberta a afinidade com as letras? Desde muito cedo, a escrita foi a minha companheira de pensamentos infindáveis sobre o que existiria para além do monte, para além das pessoas e lugares que conhecia. Foram vários os diários que escrevi religiosamente durante alguns anos. Mais tarde, com o surgir da internet na minha casa, criei o meu primeiro blog, de forma anónima, onde dava vida às palavras através do que existia dentro de mim, através das emoções que transbordavam em mim. Foi assim, noites e noites, tendo a lua e as estrelas como companhia, que as palavras ganharam forma no meu diário digital, que passara a ter leitores assíduos.

 

Quais as motivações para escrever? A escrita sempre nasceu das minhas emoções, da minha curiosidade pelo desconhecido, da minha capacidade de sonhar e, não obstante, da minha necessidade de arrumar e conter sentimentos. Poderei dizer, que foi minha companheira e terapeuta. Hoje, continuam a ser as emoções a força motriz da minha escrita, mas também as vivências dos que se cruzam comigo, dos que imagino na rua, dos que imagino existirem.

 

Que papel desempenha o Alentejo na escrita de Débora Água-Doce? Foi a solidão e o silêncio do meu monte, daquele campo infindável, que potenciaram a necessidade de criar, de transbordar o que ecoava em mim. Sem o Alentejo não sei se seria quem sou, nem sei se as minhas palavras teriam afeto e emoção.

 

Há influência da valência profissional na produção escrita de Débora? Sem dúvida. Com o exercer da minha prática clínica, a minha escrita mudou substancialmente. Passou de poesia e desabafos, para palavras que adoçam corações, palavras que transformam dor em Amor. Neste momento, entrelaço emoções nas palavras que ecoam dentro de mim, dentro de nós.

 

Que papel tem o voluntariado na construção da Débora psicóloga e da Débora autora? O voluntariado é uma experiência incrível de ser-se humano. É dar e receber sem esperar. É acrescentar e voltar ainda mais completo. Sem dúvida, que enquanto voluntária, acedo a partilhas que enriquecem a emoção das minhas palavras. Tornam tudo mais autêntico e cru. Afinal, é na vulnerabilidade que somos mais, e mais reais!

 

“A Psicóloga que também é Blogger”. Que projeto é este? Foi em 2013 que iniciei este projeto “A Psicóloga que também é Blogger”, um desafio imensamente gratificante por tudo o que me trouxe, uma partilha quase diária onde as emoções refletiam os casos clínicos que surgiam no meu sofá terapêutico. Foi assim que começou a minha jornada de vos chegar através de palavras escritas. Neste momento já não existe “A Psicóloga que também é Blogger”. Existe uma partilha, mais adulta, um novo espaço que abraça a minha paixão pela escrita, onde partilho a minha liberdade de expressão. Nem tudo é Ciência, nem tudo é realidade, é sim Amor em cada palavra. Podem ler-me nas minhas redes sociais e às vezes em deboraaguadoce.pt, ainda que já há algum tempo não produza novos conteúdos.

 

De uma Mulher para Mulheres que Amam Demais? Que livro é este? De uma Mulher para Mulheres que Amam Demais foi lançado em 2014. Nesse momento, a sua base de construção residiu nos textos publicados no blog – “A Psicóloga que também é Blogger” – mas especialmente selecionados e pensados para as mulheres que amam demais. As mulheres que amam demais, surgiu na minha vida em janeiro de 2014, no decorrer do meu percurso clínico, onde criei um método terapêutico para esta temática. Nesse caminho surgiu este pequeno livro, carregado de afeto. O afeto de quem escreve o seu primeiro livro com um brilho no olhar! Não é um livro de autoajuda, nem um livro técnico ou científico. É apenas um conjunto de páginas escritas, por uma pessoa que não é escritora, mas que sonha ser um dia, que escreve com amor, numa tentativa de adoçar corações com esperança de despertar em quem o ler, a capacidade de sonhar, de gerar amor próprio e autonomia. O livro De uma Mulher para Mulheres que Amam Demais é pensado para as mulheres que se maltratam e deixam maltratar emocional e psicologicamente, numa procura incessante de um «amor impossível de conto de fadas» em que continuam a acreditar que o homem que encontraram é o seu príncipe fantasiado desde sempre. Mesmo que comece a surgir o sapo por trás das vestes principescas, a crença é que são sempre elas as culpadas dessa transformação! Assim, suportam e submetem-se por culpa e por se amarem de menos. De uma Mulher para Mulheres que Amam Demais é para mim a confirmação de que quase todas nós em algum momento da nossa vida (e muito por “culpa” dos contos de fadas) amamos demais, mas que também temos a possibilidade de fazer diferente e não nos anularmos, pois, o Amor não é isso!

 

Em que medida as palavras podem assumir um papel terapêutico? A escrita é terapia. Permitem-nos falar do que existe dentro de nós, sem julgamentos ou olhares incompreensíveis. Permitem-nos “ouvir” o que sentimos e dar significado ao invisível. Permite arrumar e desarrumar. Potência a capacidade de conter e reparar.

 

O que está na “manga”? Está um livro inacabado. Escrevo e rescrevo. Acredito que tudo tem o seu tempo e este livro terá o seu tempo e a sua verdade. 2023 Talvez seja o ano em que volto a dar autógrafos.

 

E projetos a longo prazo? A longo prazo, imagino-me a reduzir a carga horária em consultório e dedicar o meu tempo à escrita, à partilha do que aprendi ao longo da minha carreira e à vida! Mas para isso ainda me faltam uns 15 aninhos. Serei sempre a Psicóloga que transforma dor em amor através de palavras, afinal, o amor cura, não obstante, sem amor não existimos.

 

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