Diário do Alentejo

À Mesa: O Túlio, rei do peixe de rio

16 de abril 2021 - 10:10

Texto António Catarino

 

No topo norte do Alentejo, com a Beira Baixa do outro lado do Tejo, a gastronomia do concelho de Nisa reflete essa proximidade do grande rio, que ali perto corre mais apertado – apenas 45 metros de largura – nas chamadas Portas de Ródão. Estas paredes escarpadas, com 170 metros de altura, foram vistas por Hipólito Raposo como “as ombreiras mutiladas de um arco do triunfo, que um capricho plutónico quisesse ter ali deixado, nas primeiras auroras do mundo”.

 

A meia dúzia de quilómetros desse geomonumento, paraíso de grifos – ali reside a maior colónia portuguesa desta ave -, milhafres reis e cegonhas pretas, em Monte do Arneiro, na freguesia de Santana, O Túlio é um restaurante marcado pela simplicidade, refletida na sala de lambris em azulejo.

 

A casa já passou por fases sucessivas – taberna, café e casa de pasto – até ter o estatuto de restaurante, onde o peixe de rio é a base de várias especialidades. Com o Tejo ali tão perto, fator sempre estimulante para os pescadores de rio, surge outra faceta, menos conhecida da cozinha tradicional alentejana. O peixe frito – barbo, carpa, achigã, enguias e lúcio - acompanhado com migas e o ensopado de enguias deram fama a esta casa onde se come bem. As sopas de peixe, confecionadas com postas de barbo, ovas de carpa, com o pão embebido no caldo em que o peixe é cozinhado, ganharam o estatuto de pitéu icónico: temperadas com alho, azeite, massa de pimento, cebola, poejo e sal, fazem as delícias de muitos que demandam tais paragens em busca de outros sabores.

 

O ensopado de enguias é um dos pratos mais apreciados, mas no topo das preferências surgem, na época própria, a açorda de sável com ovas de tomatada – o peixe cortado em postas muito finas e envoltas em estaladiço polme – e o arroz de lampreia, elaborado com um toque especial, em grande parte graças ao poejo, coentros e hortelã, que conferem um sabor único a este prato.

 

Neste autêntico reino do peixe do rio, há sempre bifes como alternativa cárnica. Para sobremesa e mantendo o cunho regional da casa, nada melhor que o famoso arroz doce ou uma tigelada.

 

Garrafeira limitada e serviço familiar, marcado pela simpatia neste restaurante que exprime a grandeza das coisas simples. O Túlio, vizinho do Tejo, é rei do peixe de rio.

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