Diário do Alentejo

António Geraldo: Exemplo

06 de março 2020 - 15:41

“Sempre me senti fascinado pela pesca. Comecei por jogar futebol, mas o bichinho da pesca estava mais desenvolvido e então, uma das melhores coisas que eu fiz foi, de facto, dedicar-me à pesca desportiva. Comecei a pescar muito cedo, ainda criança, com outros miúdos, íamos ali para os ribeiros perto da aldeia e já pescávamos. Na pesca mais a sério, de competição, estou há cerca de 10 anos, desde que presido ao Clube Bejense dos Amadores de Pesca Desportiva”.

Texto e Foto: Firmino Paixão

António Geraldo nasceu, há 54 anos, em Quintos, uma aldeia do concelho de Beja, vizinha do rio Guadiana. Não admira, por isso, este fascínio por uma atividade para a qual, ainda criança, sentiu um forte apelo: “Em conjunto com a rapaziada da aldeia ia ao futebol, mas quando não havia jogos, íamos apanhar pardelhas e barbos, outras vezes íamos aos cogumelos. O bichinho da pesca veio dessa altura e foi intensificando- se. Mais adiante, quando deixei o futebol por completo, comecei a ir mais à pesca pelo prazer de apanhar os peixes e de comer umas caldeiradas”. António Geraldo também jogou futebol: “Fiz a formação no Cabeça Gorda, depois sai para os Tribunas, porque tinham equipas nos nacionais. Fui convidado para ir para o Desportivo, ainda fui lá treinar, mas as condições não me agradaram muito, joguei duas épocas no Despertar e voltei ao ‘Ferróbico’, clube pelo qual ganhei o único troféu, uma Taça Distrito de Beja, numa final contra o Moura”. Posta sobre a mesa, a dúvida se terá sido melhor futebolista do que é pescador, o atual campeão nacional de pesca ao achigã de margem, esclareceu: “Se calhar, sou melhor pescador do que fui futebolista, porque a pesca é muito mais fácil e as condições agora são outras. Hoje, a pesca de competição também requer alguma técnica, a qualidade do material também faz a diferença, enquanto no futebol ou temos qualidade e condições para o praticar ou então não vale a pena andarmos lá a correr atrás da bola".

ODELEITE, SANTA CLARA, ALQUEVA

Sócio há um quarto de século do Clube Bejense dos Amadores de Pesca Desportiva, coletividade a que atualmente preside, confessa ter sido persistente na procura de uma conquista que o diferenciasse e até já tinha sido vice-campeão nacional de clubes: “Há 10 anos consecutivos que sou pescador federado e tenho feito pesca ao achigã de margem, mas também já tenho feito pesca ao achigã embarcado e com alguns resultados. Mas, desta vez, no achigã de margem, fui o mais regular e consegui sagrar-me campeão nacional”. Odeleite, Santa Clara e Alqueva, foi o triângulo competitivo cujos vértices teve que unir para conquistar este título. António Geraldo comentou que “Odeleite é uma barragem excecional para a prática da pesca, Santa Clara também está a esse nível, mas Alqueva tem momentos em que o peixe dá muito e outros em que não dá nada”. O pescador fez notar que, nos treinos, fazem mais capturas do que em competição, porque a pressão é maior, há mais movimento de pessoas e a concentração é diferente. No percurso para a conquista deste título nacional, além das provas nos três planos de água já citados, ainda houve lugar a uma finalíssima, na Barragem do Carril, em Tomar: “Só fomos quatro atletas e ninguém apanhou nada e, posto isto, como eu estava à frente na classificação, foi-me atribuído o título nacional”.

QUEIXUME DO PRESIDENTE CAMPEÃO

Um exemplo! Um estímulo que o presidente de um clube pode deixar aos restantes atletas, que ao seu lado competem: “Sim, foi um exemplo, porque isto não é fácil, eu dedico-me à pesca de corpo e alma, deixando para trás alguma vida pessoal, por isso, sendo presidente do clube e competindo na área do achigã de margem, fiquei imensamente feliz com o título que conquistei, porque serviu para mostrar aos atletas das outras áreas que nunca devemos desistir. É um estímulo para todos. Eles sabem que nunca abandonei uma prova. Mas, nas outras áreas da pesca, o clube também tem tido alguns êxitos e é um dos clubes mais antigos da Federação Portuguesa de Pesca Desportiva”. António Geraldo sentir-se-á confiante para, esta época renovar o título nacional? Não! E por duas razões: “A pesca é uma modalidade em que até ao último segundo tudo pode mudar. Muitas vezes, pensamos que a prova está ganha, mas pode não estar, nunca podemos ter certezas de coisa nenhuma”. Por outro lado, enquanto gestor responsável por um clube com a tradição do que representa, sabe “as linhas com que se pode cozer” e explicou: “Estamos descontentes com a federação. Os clubes não têm capacidade financeira para fazerem a pesca como eles querem. Fizeram um calendário com três zonas: Norte, Centro e Sul. Estamos a falar de dois dias por prova, deslocações, alimentação e alojamento. Os clubes não têm capacidade para suportar isto”. E não têm, porque sendo as dificuldades maiores que os apoios, “só se pode calçar um sapato à medida do pé”. Geraldo conta: “As dificuldades são enormes, temos cento e tal sócios mas as despesas são muitas, são as canas, os carretos, os engodos, enfim, temos um orçamento de cerca de oito mil euros e só contamos com a contribuição dos sócios, que chega para aí aos mil euros, e depois, a concessão do bar. O município de Beja, há dois anos que não nos atribui qualquer subsídio. Não podemos lutar com clubes como o de Mértola, o de Alvito ou o de Viana do Alentejo, que têm um bom apoio dos municípios, porque sabem o que a pesca representa para as comunidades. Nós temos é que competir com muita dedicação, para superarmos as dificuldades”. Um queixume de um presidente campeão, que foi um exemplo entre os seus pares.

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