Texto e Foto Firmino Paixão
“Nunca representei o clube da minha terra, o Sporting Clube Figueirense. Quando comecei a dar os primeiros pontapés na bola, para aí com nove ou 10 anos, o Figueirense não tinha equipa do meu escalão. Treinava com os iniciados, equipa onde jogava o meu irmão e da qual o meu pai era o treinador. Mas para jogar oficialmente, fui inscrito pelo Despertar Sporting Clube, onde fiz toda a formação. Como estudava em Beringel, tinha a possibilidade de ir treinar a Beja. Só no meu primeiro ano de sénior é que mudei para o Desportivo de Beja”.
Uma confissão ou, se calhar, um lamento do futebolista João Nabor, nascido há 37 anos em Figueira de Cavaleiros, concelho de Ferreira do Alentejo, que está a cumprir a sétima temporada com a camisola no Mineiro Aljustrelense. Uma referência dos tricolores, ele sabe-o bem: “Quando permanecemos algum tempo nos clubes, é natural que nos tornemos, quase obrigatoriamente, como referências dos adeptos”. No entanto, o espírito mineiro já lá está, já mora no coração do capitão Nabor. “É um clube com uma mística muito forte, pelo fervor dos adeptos e pela sua ligação às minas de Aljustrel e nós, com o tempo em que cá vamos estando, começamos a ganhar essas raízes. É como se já fizéssemos parte dessa tradição”.
Oriundo de uma família de futebolistas, não é difícil encontrar justificação para o seu talento. “Foi um pouco como nascer com uma bola debaixo do braço”, confessa. “O meu pai foi jogador. Estava na fase final da sua carreira quando eu comecei a dar os primeiros pontapés na bola, tanto eu, como o meu irmão. Era um desporto de rua, toda a gente queria jogar à bola e foi surgindo alguma apetência para enveredarmos por este caminho. Foi um bichinho que ficou e nunca mais abalou. A prova disso é que, com 37 anos, ainda por aqui ando”.
Pois é, à beira dos 40, se calhar já se olha para o dia em que se há de “pendurar as botas”: “Obviamente que, tendo esta idade, estarei muito mais perto do final do que, propriamente, de outra coisa qualquer. É normal que, com o avançar dos anos, a nossa postura dentro do campo, e para o grupo, vá mudando um pouco e eu sinto-me muito perto já dessa mudança. Perto de passar para o outro lado, vê-los como se fosse já um treinador dentro de campo, porque, com a experiência que tenho e com o aproximar do final da carreira, começo a ver as coisas de forma diferente. Já estou nessa fase”.
Antes de chegar a Aljustrel, Nabor representou clubes como o Atlético de Reguengos e o Vasco da Gama de Sines, para além dos já referidos emblemas bejenses, Despertar e Desportivo. Assumindo não memorizar grandes histórias do passado, lembra, contudo: “A minha carreira tem sido recheada de bons momentos. Passei por bons clubes, quer ao nível no Baixo, como do Alto Alentejo. Passei sempre pelos melhores clubes e tive sempre o privilégio de ser titular, algo que, se calhar, também diz muito da minha carreira. Acho que isso quer dizer muita coisa”.
Mas quando se fala de João Nabor, o senso comum é que tinha valor para ter pisado outros palcos de maior visibilidade. Surgiram oportunidades? Privilegiou a carreira académica, pondo o futebol em segundo plano? João explica: “Houve dois ou três finais de época em que surgiram realmente propostas concretas. Recordo-me, por exemplo, do Santa Clara e de um clube do norte, o Vizela ou o Freamunde, já não sei bem, com outra proposta, ambos na segunda liga mas, na altura, estava a tirar a minha licenciatura, em Beja, e optei por ficar”.
Ainda assim, garante: “Não me arrependi. Se calhar, hoje pensaria de outra maneira, deixaria os estudos para outra oportunidade e agarrava um desses convites. Na altura decidi em consciência, foi uma coisa muito ponderada, por mim e pelos meus pais, e fiquei por aqui”.
Ficou a licenciar-se em Educação Física, na Escola Superior de Educação, em Beja e, posteriormente, tirou um mestrado na Universidade de Évora. Hoje trabalha na Vila Mineira, leciona no primeiro ciclo do ensino básico e dá Expressão Motora aos miúdos do Infantário da Santa Casa da Misericórdia de Aljustrel. No horizonte está uma possível carreira de treinador, um percurso óbvio. “É algo que está a ser ponderado. Quando estive em Beja fiz os cursos de primeiro e segundo nível, e, como disse, quando chegamos ao final da carreira já vamos pensando o futebol como treinadores e eu já penso muito assim”. Quase a completar três décadas de ligação ao futebol, João Nabor não tem dúvidas em assumir: “Sou muito feliz! Tenho atrás de mim uma família que me apoia muito, tanto a minha mulher como a minha filha, sabem os sacrifícios que faço. Mas, olhando para a minha idade e para a prestação que ainda tenho em campo, é fácil perceber que a minha alegria ainda é como se tivesse 20 anos”.
Sonhos por cumprir? Não existem! Nabor é um jogador pragmático. Mas existe, isso sim, um desejo muito forte, uma espécie de missão para cumprir antes de pôr as chuteiras de lado: “Gostaria bastante de deixar o Mineiro no Campeonato de Portugal. É uma prova com muita visibilidade e, depois disso, quando entender que já não tenho condições de dar o meu contributo ao nível em que sempre o fiz, é acabar a carreira e enveredar pela função de treinador. Então, e dependendo da forma como as coisas começarem a correr, logo veremos se existe capacidade ou oportunidade para ir mais longe do que andar aqui ao nosso nível”.