Texto e foto Firmino Paixão
“Oh, meu Deus!”, o Nilton David é já um “alentejano dos quatro costados’”. Um “alentejano” que foi nascer na freguesia de Altura (Castro Marim), há 45 anos, mas, num primeiro momento, por questões profissionais, subiu a planície transtagana e fixou-se em Beja. Corria o ano de 1993. Num segundo momento foi “traído” pelo coração, conheceu a noiva, casou e já tem um filho bejense. Já lhe ouvimos dizer: “Nós, os alentejanos…”. “Já me sinto um alentejano”, confessa, sem preconceitos.
Adepto da atividade física, faz natação e BTT, mas diz que o atletismo é a sua grande paixão. Por convite de um primo, fez a sua primeira meia-maratona em 2006. “O trail veio depois, foi uma descoberta”, revela. “O Carlos Rocha, um amigo, também atleta, disse-me que existia uma prova de 70 quilómetros, na serra da Freita. Estávamos em 2010, já corríamos os dois, dávamos as nossas voltinhas, mas nada de muito extenso. Quando lá fui não cheguei aos 70 quilómetros, fiquei pelos 50. Foi muito duro, mas muito bonito. A partir daí fui sempre melhorando, para tentar fazer provas maiores e ver um pouco da paisagem no interior do País”.
Não tardou a aceitar maiores desafios, provas mais longas: “Sempre tentando superar-me, porque, nessas distâncias, corremos contra nós próprios. As corridas são feitas de pequenos detalhes, temos de ir afinando as coisas que nos incomodam, que nos fazem parar, afinando o corpo, para que possamos aguentar, chegando ao fim bem-dispostos, não sofrendo, nem ficando com vontade de nunca mais vermos as sapatilhas à frente”.
O que fará correr Nilton David? Uma constante avaliação da condição física, uma tentativa de superação ou competir consigo, para melhorar os registos? “Na primeira prova de 160 quilómetros que fiz tive uma recuperação horrível. Não me custou a prova, custou-me a recuperação, e, desde aí, tenho vindo a afinar o corpo para aquilo que é mais duro, nomeadamente, o frio, porque numa corrida de montanha deparamo-nos com várias dificuldades que nos limitam em termos de performance. E até na distância em si, não podemos pensar que estamos a correr aqueles quilómetros, temos de correr por etapas, até àquela árvore, até àquela fonte, chegar àquele rio, e por aí adiante. Mentalmente vamos várias vezes abaixo, mas tentamos recuperar rapidamente. É uma luta individual interessante, que exige muito de nós em termos psicológicos”.
O seu último desafio foi o Oh Meu Deus – Ultra Trail Serra da Estrela, uma prova em que só os atletas que cumpram os primeiros 160 quilómetros abaixo das 32 horas podem correr os restantes 40. “O grande desafio do ‘Oh, meu Deus!’ é saber que podemos chegar aos 160 e ficar por ali. Só uma enorme força mental nos permitirá fazer os outros 40 quilómetros, onde se levam, pelo menos, mais nove horas em prova. O meu tempo total nos 200 quilómetros foi de 41h59’, mas vamos parando nos abastecimentos. Sentimo-nos muito humildes, porque sem a ajuda daquelas pessoas a dar-nos apoio não conseguiríamos superar-nos”.