Diário do Alentejo

Com o foco na seleção

22 de junho 2025 - 08:00
Margarida Guerreiro, a futebolista bejense que já ganhou o estatuto de profissional do Torreense
Foto | Firmino PaixãoFoto | Firmino Paixão

“Não joguei a final contra o Benfica, mas vivi essa proeza, essa conquista, com a mesma intensidade como se tivesse estado dentro das quatro linhas a defrontar as encarnadas. A emoção estava toda lá. Vencer uma Taça de Portugal, aos 19 anos, foi um sonho e eu só tenho que agradecer ao Torreense por me ter dado essa oportunidade”.

 

Texto | Firmino Paixão

 

Margarida Guerreiro é natural da freguesia de São Matias (Beja), povoação onde viveu a infância e adolescência, até completar o décimo segundo ano. Cedo se inspirou no futebol, de uma forma natural e sem influência de ascendentes.

O Sporting Clube de Cuba foi o seu primeiro clube, representou o Externato António Sérgio, de Beringel, e rumou ao Ourique Desportos Clube. Competiu numa seleção jovem da Associação de Futebol de Beja, onde foi observada pelo selecionador nacional, despertando também o interesse do Sport Clube União Torrense, de Torres Vedras, clube que a integrou na equipa sub/19, ascendendo, por mérito próprio, à equipa principal do clube que ficou a um ponto do pódio na Liga BPI e que conquistou a Taça de Portugal da última época desportiva, numa final com o Benfica.

“Nasci em Beja, claro, mas sempre morei em São Matias. Comecei os estudos na escola primária, aqui em São Matias, e foi aqui que, pela primeira vez, tive algum contacto com o futebol. Jogava nos intervalos, com os rapazes, e como ganhei um gosto muito intenso pela modalidade comecei a insistir com os meus pais para me inscreverem num clube”.

Como reza o provérbio, “água mole em pedra dura… “Pedi-lhes muito, até que consegui chegar ao Sporting Clube de Cuba. Porém, como me foram diagnosticados alguns problemas no coração, joguei pouco tempo e acabei por ser intervencionada. Quando recuperei da operação ingressei no Externato António Sérgio, em Beringel, e ali construímos uma equipa da escola para participarmos num torneio de futebol feminino que acontece todos os anos”. O passo seguinte foi a seleção regional, contou. “A Associação de Futebol de Beja começou a convocar-me para a seleção distrital e ganhei outra visibilidade, porque comecei a participar em inúmeros torneios e até num interassociações, em Castelo Branco, onde fui observada pelo selecionador nacional que, mais adiante, me chamou a um estágio da seleção nacional de sub/15”.

Luís Caixinha treinava a equipa do Ourique Desportos Clube e estava atento ao que se passava à sua volta. “Estive cinco épocas em Ourique e aí as coisas começaram a ganhar outro rumo. Comecei a perceber que, se calhar, teria um bocadinho de jeito para a bola. Senti que conseguiria evoluir e que, eventualmente, seria uma coisa que eu queria levar para a vida”. Com tamanha confiança em si própria, percebia-se que a ambição era crescente e então, relatou a jovem: “O Torreense já tinha manifestado o interesse em mim há algum tempo, só que os meus pais queriam que eu acabasse aqui o décimo segundo ano”. Quando isso sucedeu e porque o interesse se mantinha: “Pensei que esse seria o momento e decidi que também poderia continuar os estudos. Integrei a equipa sub/19 do Torreense, tive um destaque de todo inesperado para mim, porque fui a melhor marcadora do campeonato nacional e esse foi o boom para que investissem mais em mim e me promovessem à equipa sénior. Nesta época já disputei a Liga Feminina e, sempre que possível, ainda fazia alguns jogos na equipa sub/19”.

Recordando as pessoas que, à sua volta, contribuíram para a sua afirmação como futebolista, Margarida Guerreiro lembrou o treinador Luís Caixinha: “Foi um mister que sempre acreditou em mim e me fez crescer, porque, em certos aspetos, eu era ainda um pouco criança. Agora, também João Ferreira, treinador das sub/19 do Torreense, que fez um trabalho espetacular comigo, e devo referir o mister Gonçalo Nunes, da equipa sénior, pois tem acreditado em mim, tem-me ajudado a crescer e com ele espero continuar a evoluir”. Estará, então, o sonho de Margarida concretizado? “Ainda não! Só começou agora. Comecei a dar os primeiros passos como profissional, estou no primeiro ano e ainda não conquistei nada daquilo com que sonhei. Gostava de fazer carreira no futebol profissional e de conseguir chegar à seleção A de Portugal e, se possível, sem menorizar a Liga Portuguesa, gostaria de poder jogar noutras ligas profissionais”.

Tem referências e não serão poucas, mas destaca as jogadoras com quem trabalha todos os dias, Carolina Correia, Samara Lino e Bárbara Lopes, um trio que, recentemente, vestiu a camisola das quinas. Um dia chegará a sua vez: “Sim, trabalho todos os dias para que isso aconteça, tenho de manter essa esperança”. Até porque, convidada a fazer a sua autoavaliação, não hesitou: “Acho que sou uma jogadora muito persistente, nunca dou um lance por perdido, sou aguerrida, trabalhadora, trabalho para o coletivo e sou amiga das minhas colegas”. A adaptação a uma nova realidade não foi fácil, porém, contou com a entreajuda de colegas que estavam a passar pela mesma experiência. “Criámos um grupo, diria mesmo, uma família, e tem sido um tempo inesquecível, porque fiz muitas amizades. Agora, o apoio da família é sempre fundamental, os meus pais sempre que podem vão ver jogos, os meus tios também e os amigos. Tenho sentido muito o apoio da família”.

O momento alto desta ainda curta carreira de profissional de futebol elege-o com naturalidade. “Foi a recente conquista da Taça de Portugal. É sempre algo com que sonhamos, e em que acreditamos, mas que não estamos à espera que aconteça. Com o percurso bem-sucedido que fizemos até atingirmos a final, fomos defrontar o Benfica com a ideia de que teríamos que vencer, respeitando, naturalmente, as adversárias. Mas nós acreditávamos muito no trabalho que vínhamos fazendo e conseguimos essa conquista”. Fora das quatro linhas, Margarida Guerreiro procura outro futuro, o académico. “Já fiz o primeiro ano da licenciatura no curso de Desporto mas, neste segundo ano, porque comecei também a treinar de manhã, tem sido mais difícil conciliar horários. Está difícil, mas não desistirei”.

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