Diário do Alentejo

António Pais (Rosa dos Ventos) é um dos pescadores desportivos mais titulados da região

17 de fevereiro 2024 - 14:00
“A pesca liberta-nos”
Foto | Firmino PaixãoFoto | Firmino Paixão

“Comecei a pescar ainda era um miúdo. Nasci em São Domingos da Serra e, ali por perto, existia um ribeiro que tinha pardelhas, barbos e aquelas coisinhas todas, e eu andava lá à pesca com o meu pai. A partir daí, cada vez que chegava perto do mar era uma loucura. Hoje ainda sinto esse fascínio. Adoro o ar livre, a natureza encanta-me imenso”.

 

Texto | Firmino Paixão

 

O pescador António Pais da Silva, de 66 anos, atleta do Rosa dos Ventos-Clube de Pesca Desportiva do Almograve (Odemira), esteve, em setembro de 2023, na cidade de Mazatlan, no México, onde decorreu o 6.º Campeonato do Mundo de Surfcasting (fundo) em masters, regressando a Portugal com o terceiro lugar individual e o título mundial por equipas.

Nascido no concelho de Santiago do Cacém, os compromissos profissionais obrigaram-no a viver cerca de 50 anos em Lisboa, período em que António Pais representou o Sport Lisboa e Benfica, o Clube Stella Maris, de Peniche, e o Estrela da Amadora. Regressado ao Alentejo, há cerca de 10 anos, fixou-se, naturalmente, perto do mar. “Moro no Almograve, estou praticamente a cinco minutos do mar. Oiço o mar a partir de minha casa e todos os dias tenho de o ir ver. Se lá não for, falta-me qualquer coisa”, conta o pescador que, à parte o seu prestigiado palmarés, cumpriu, no México, o seu quarto campeonato mundial de masters (2017 em Espanha, 2021 na Tunísia, 2022 em Itália e 2023 no México).

António Pais nunca praticou outros desportos, a pesca foi sempre a sua modalidade de eleição. “A pesca ajudou-me muito, e ainda ajuda. À beira mar descarregamos todas as emoções, todos os nossos problemas. Na altura da pesca esquecemos isso tudo, a pesca liberta-nos”.

Voltemos ao México e a Mazatlan, a cidade que foi um bom talismã para a pesca desportiva portuguesa. Uma cidade muito quente, como recorda António Pais. “Uma coisa fora do normal, uma experiência pela qual eu nunca tinha passado na minha vida. Fazia cem metros com o material às costas, tirava a camisola, torcia-a completamente. Muito calor e uma humidade tão grande que era quase irrespirável, mas foi uma experiência muito enriquecedora”. Claro, não é todos os dias que se conquista um título mundial a tão grande distância de casa. “Foi um feito extraordinário”, admite o pescador alentejano. “Fomos competir numa zona que não conhecíamos, fomos pescar no oceano Pacífico, mas adaptámo-nos bem, talvez pela nossa grande experiência nacional, mas somos também muito bons internacionalmente, dominámos o campeonato e fomos campeões do mundo”. O título individual até esteve ali tão perto do pescador do litoral alentejano. “Até à última prova estava em primeiro lugar mas, nessa prova, apanhei uma zona de pedra, cheia de montagens perdidas e montes de resíduos, não fui bem-sucedido e caí para o terceiro lugar, mas também foi excelente, porque estávamos a pescar em águas que não conhecíamos, num país onde também nunca tinha competido. Apanhei 15 exemplares, todos de espécies diferentes, espécies que eu nunca tinha visto na minha vida”.

No seu palmarés, e enquanto capitão da seleção nacional de sub/21, cargo que exerceu durante uma década, foi várias vezes campeão mundial. Mas há mais. “Tenho 13 pódios em competições mundiais, tanto como pescador, capitão de equipa ou como selecionador nacional. Já fui campeão nacional duas vezes, vários segundos e terceiros lugares, tenho 18 medalhas em competições nacionais, são mais de 40 anos de pesca desportiva”, revela, sem esquecer as suas conquistas ao nível regional. “Normalmente, tenho sido campeão na pesca à boia, que é a variante em que eu mais gosto de pescar, não é em linha que tenho tido os melhores títulos. Normalmente, sou campeão regional, não me têm feito muita oposição, mas agora já temos por aí bons pescadores também nessa disciplina”.

António Pais foi nomeado na categoria de “Desportista masculino” do ano na última Gala do Desporto de Odemira, distinção que lhe escapou, não obstante o elevado mérito do seu percurso. A esse propósito lembra: “O vencedor foi campeão nacional e só o clube dele tem duzentos e tal atletas inscritos e como aquilo foi uma escolha do público, era sempre subjetivo, não era fácil. Eu fui campeão do mundo, enfim… mas, foi uma experiência positiva”. Porém, aproveita a deixa para enaltecer o apoio que tem recebido do município de Odemira nas suas deambulações por além-mar. “Tem sido excelente, praticamente cobrem todas as despesas das minhas presenças nos campeonatos do mundo, ao abrigo do ‘Regulamento Municipal de Apoio ao Movimento Associativo Desportivo’”.

António Pais é, também, vice-presidente da Federação Portuguesa de Pesca Desportiva, responsável pela área de mar, e já tem seguidores na modalidade, um neto com nove anos e uma neta com sete, porém, não esconde uma mágoa. “O que me deixa um bocadinho triste é a tremenda dificuldade que sentimos em trazer jovens para a pesca desportiva. Estou a tentar fixar os meus netos, mas todos temos de colaborar para conseguirmos esse rejuvenescimento. Os miúdos, hoje em dia, com as novas tecnologias, agarram-se aos ecrãs, mas é preciso insistir e continuar a fazer esse trabalho. Não podemos desistir”.

Enquanto dirigente, congratula-se com o sucesso da modalidade durante o ano de 2023, porém, deixa claro que a sua responsabilidade como dirigente federativo está a chegar ao final. “O meu mandato termina em junho deste ano. Querem que eu continue, mas não sei. Já tenho 66 anos, mais um mandato terminaria com 71, e estou decidido a não continuar. Se a federação tiver necessidade, disponibilizo-me para ser capitão ou selecionador de alguma equipa nacional. São funções em que me sinto bem e que desempenharei enquanto puder”. Porém, deixa escapar um desejo: “Gostaria de terminar o meu atual mandato com mais pescadores do que existiam quando assumi essas funções. Não perdemos praticantes, mas não tem sido fácil. É preciso acarinhar muito os jovens, manter as associações regionais ativas e sensibilizá-las para fazerem esse trabalho”. O outro desejo será a conquista de mais uma medalha, porventura de ouro, no 7.º Campeonato do Mundo de Masters, que se disputará no Chipre, entre 19 e 26 de outubro deste ano.

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