Diário do Alentejo

“A manutenção tinha dado outro impulso à nossa carreira”

05 de maio 2021 - 16:35

O treinador bejense José Luís Prazeres chegou a Aljustrel em meados de novembro do último ano, confiante em levar a bom termo o que já era a muito difícil missão de manter o Mineiro no Campeonato de Portugal.

 

Texto Firmino Paixão

 

José Luís acreditava muito que seria possível, mas, como hoje reconhece, “era preciso mais do que isso”. Contudo, sublinha que a sua ambição “refletiu-se no trabalho e ficou um amargo de boca, porque seria inteiramente justa” a manutenção. São conhecidas as afinidades do técnico com o clube mineiro, que vai entrar num processo eleitoral. Por isso, o futuro de José Luís Prazeres ainda está indefinido, assumindo que treinará em qualquer divisão, embora não esconda o sonho de vir a ser treinador profissional de futebol.

 

Se a garra e a motivação do José Luís pontuassem, o Aljustrelense não teria descido de divisão?

Não sei! O certo é que eu confio muito em mim e na minha equipa técnica. Mas só isso não chegou, era preciso mais do que isso, porque dependíamos de fatores determinantes. Foi complicado chegarmos a Aljustrel quando estávamos a oito pontos da linha de água e, sem de forma alguma querer melindrar o trabalho do José Amador [técnico anterior] de quem sou muito amigo, mas quando as coisas estão assim, já não podem existir erros. Aproximámo-nos, estivemos a três pontos do sonho e começaram a existir outras coisas de que não vale a pena falar… nos últimos oito jogos tivemos cinco penáltis contra. Não são desculpas, mas aconteceu.

 

Se tivesse chegado mais cedo teria sido possível evitar males maiores?

É subjetivo! Não quero fazer essas contas. Mas uma coisa é certa, começar do zero, em igualdade de circunstâncias com as outras equipas é diferente de começarmos com oito pontos de atraso. Não podemos errar e existe mais pressão. Em mim não, porque adoro isto. Tomara eu jogar com milhares de espetadores em todos os jogos. Era o que eu mais queria na vida. Mas existe mais pressão sobre os jogadores e um cansaço maior dos dirigentes, porque os resultados não aparecem. Não é fácil fazer essas contas, mas acreditando em mim como eu acredito, acho que é muito possível uma equipa do Aljustrelense, com o José Luís, começando de início, também com jogadores escolhidos por nós, porque apanhamos uma equipa já feita … e, atenção, só tenho que tirar o chapéu àqueles atletas.

 

O plantel, no seu conjunto, tinha qualidade para conseguir a manutenção?

Acho que sim, foi um grupo excecional, unido, cheio de companheirismo, mas a equipa tinha uma ou outra lacuna em determinada posição, que não conseguimos colmatar. Os jogadores do Mineiro têm qualidade, talvez não existisse abundância de qualidade, mas existia qualidade e veremos que muitos dos jogadores continuarão neste campeonato ou em equipas com outra dimensão. A equipa tinha qualidade e a direção fez tudo o que lhe foi possível. Não nos faltou nada. Só tenho que agradecer tudo o que nos foi proporcionado.

 

Como comenta a questão das sucessivas expulsões que o presidente do clube justificou com inexperiência dos atletas?

É uma questão difícil. Tenho muitos anos de futebol e alguns jogos nesta divisão, enquanto jogador. Nós, aqui, devemos funcionar “ao contrário”. É uma ideia que eu não me importo de partilhar. No Alentejo temos que funcionar “ao contrário” dos outros clubes que, quando chegam a dezembro, reforçam-se com nove ou 10 jogadores. Tivemos, na nossa série, diversos casos assim. Nós temos que fazer ao contrário. Gastar a maior fatia do orçamento até dezembro traz-nos qualidade e pontos, antecipadamente. Eu conheço o Mineiro e sei que, se o clube ganhar, o dinheiro aparece de todo o lado. O que traz dinheiro são os resultados. Se não houver mais dinheiro agradece-se ao jogador e ele vai para outras paragens, mas o clube já garantiu a manutenção.

 

Os jogadores locais também não abundam. Não há juniores, a formação é pouco competitiva e os clubes abastecem-se noutras paragens…

Essa é uma falsa questão. Fala-se nas universidades, a minha geração não foi de leigos que não estudaram. Mas continuámos a jogar. Acho que tudo se consegue. O que eu queria referir é o jogo de bastidores, porque quando uma equipa está em baixo, seja de que região for, é mais fácil empurrá-la e nós temos imensa dificuldade porque estamos fora de todos os centros de decisão e, quanto mais abaixo estivermos, pior será. Temos que deixar de ser os coitadinhos, que é o problema dos alentejanos.

 

A manutenção do Mineiro tinha sido importante para dar visibilidade ao treinador? Continua comprometido com o Mineiro?

Sei que o nosso trabalho foi falado mas, para mim, não foi um bom trabalho. Tenho que agradecer a todos, porque todos deram tudo. O trabalho fica marcado por uma descida de divisão a que eu estou ligado. Mas vejo treinadores da I Liga que descem todos os anos e a seguir têm bons projetos. Obviamente que a manutenção nos tinha projetado e tinha dado outro impulso para a nossa carreira. Mas não desistimos, estamos à espera de voltar a treinar já amanhã, seja em que equipa for, porque acreditamos em nós. Tenho o sonho de ser treinador profissional, é difícil, mas lutarei todos os dias para que isso aconteça. O Mineiro já sabe que serei sempre mineiro, sou-o desde o dia em que lá cheguei. O clube vai sofrer uma restruturação na sua direção, mas eu quero treinar e já disse em jeito de brincadeira que na pirâmide do futebol em cima estão os sócios, a direção, os jogadores, por fim, os treinadores, porque são mais fáceis de descartar.

 

A III Liga desqualifica ainda mais o futebol do interior do país?

Acho que não e acho que, para a nossa região, até será melhor. Mudam-se os nomes, mas voltamos ao que era antigamente com a III, a segunda bê, a II Liga e a I. Para a nossa região, afastada dos grandes investidores, é mais fácil termos as equipas a competir no Campeonato de Portugal e até com objetivos ambiciosos do que, propriamente, andarmos numa III Liga, onde acho que nenhuma equipa alentejana terá, neste momento, capacidade para andar, porque exigem uma série de requisitos. Mas a III Liga vai dividir mais o futebol e afastar-nos ainda mais do topo. Mas eu tenho sonho de deixar o distrito de Beja no mapa e, até ao último dia de vida, irei consegui-lo.

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