Diário do Alentejo

Olivicultores não aceitam ser tratados "como criminosos"

26 de maio 2019 - 12:00

Texto Luís Godinho

 

“Nós, olivicultores do Alentejo, não aceitamos que nos considerem como criminosos quando estamos a ajudar a desenvolver o País”. A afirmação é de Pedro Marques. Olivicultor desde 2004, gere cerca de cinco mil hectares de olival e amendoal. Queixa-se de campanhas de desinformação. E diz que as culturas intensivas e superintensivas “não representam risco” para o ambiente.

 

Como é que começou a sua aposta na plantação destes novos olivais?Em 2004 comecei a trabalhar para um grupo espanhol que era composto por uma família de empresários sediada em Sevilha e depois comecei a trabalhar com outro grupo que se dedica à transformação e gestão agronómica de herdades. Entre 2006 e 2012, na Andaluzia e no Baixo Alentejo, chegámos a transformar 10 mil hectares de terrenos de sequeiro em olivais intensivos, sendo que algumas propriedades nem sequer tinham água de Alqueva. Era um investimento que antecipávamos, assegurando a rega a partir de furos. Em 2013 criei a minha própria empresa e hoje faço a gestão agronómica de quatro mil hectares de olival e de mil hectares de amêndoa em diversas propriedades, quase todas situadas no Baixo Alentejo.

 

No caso do olival estamos a falar de que tipo de culturas?São 1500 hectares em regime intensivo e 2500 hectares em superintensivo.

 

Presumo que o investimento feito nestas duas culturas seja decorrente da elevada rentabilidade do olival e do amendoal explorados desta forma?Acabou por ser uma aposta justificada pela rentabilidade destas duas culturas. Inicialmente comecei pelo olival em intensivo mas depois com a falta de mão de obra começámos a apostar no superintensivo. A rentabilidade dos dois sistemas é idêntica. A questão é que tenho falta de mão de obra e isso obriga-me a optar por um sistema que me deixe descansado com o meu negócio.

 

Necessita de muito menos mão de obra?Ao contrário do que as pessoas pensam, as necessidades de mão de obra não são inferiores, antes pelo contrário. No intensivo contrato uma pessoa fixa por cada 120 hectares; no superintensivo tenho uma por cada 60 hectares. Isto é, necessito de mais mão de obra fixa no superintensivo, sem contar com o período da colheita porque nessa altura do ano recorro a prestadores de serviços. Como é sabido, para a colheita só podemos recorrer a mão de obra estrangeira. Já contratámos equipas de portugueses e as coisas não funcionaram. Nem sequer há pessoas para apanhar a azeitona na altura em que o queremos fazer.

 

Daí a aposta no superintensivo. Mas não se trata de um regime com um consumo muito superior de água?A oliveira é autóctone, é do mediterrâneo, necessita de água porque nós lhe queremos dar água. É uma cultura rústica, sempre se deu bem em solos com pouca água. Agora nós, em termos agronómicos, acabamos por retirar uma rentabilidade completamente diferente se a regarmos. Ao contrário do que se diz, o superintensivo gasta muito menos água do que o intensivo. É assim em todas as minhas herdades.

 

No momento em que a rentabilidade se alterar, se algum dia isso acontecer, não corremos o risco de ficar com milhares de hectares abandonados?Os negócios que se têm feito no olival valorizam essencialmente a economia de escala, isto é, transforma-se, gasta-se um determinado valor, vêm alguns investidores e compram essa propriedade. A terra está aqui no Alentejo, o olival está aqui, não vai ser abandonado. Todos os dias somos procurados por pessoas que querem investir mais no olival. Se essa margem baixar, isso não quer dizer que se vá abandonar o olival pois são investimentos volumosos, a banca apostou muito em diversos investidores, entre os quais me incluo. Há muitos portugueses a fazerem investimentos em olivais superintensivos e em amendoais. Estamos a falar de investimentos em áreas com 200, 300 ou 400 hectares, algo que há uns anos era impensável. Muitas pessoas falam do que não sabem. Portugal não tem hoje em dia mais 70 mil hectares de olival.

 

O problema é a concentração em alguns concelhos, como Serpa ou Ferreira do Alentejo, e em algumas freguesias em concreto, onde os olivais ocupam boa parte da superfície agrícola utilizada. É por isso que se fala de monocultura.Então e na vinha no Douro? No Douro só existe vinha. Então vai-se abater a vinha porque é uma monocultura? O problema é que as pessoas entram na estrada e de Ferreira do Alentejo a Serpa, onde antigamente viam pivôs e culturas de sequeiro, em muitos casos a terra até estava abandonada, agora encontram olival e outras culturas. O olival tem de estar onde melhor se adapta, onde a sua rentabilidade é mais elevada.

 

Mas advêm daí riscos para o ambiente? São culturas muitas vezes apontadas como precisando de recorrer a elevadas doses de produtos fitofarmacêuticos.Não advêm riscos nenhuns. Pertenço à Olivum, sou um dos diretores, e todos os associados acabam por estar sujeitos a medidas de produção integrada. Nós utilizamos produtos que são homologados e que só se podem utilizar em determinadas alturas, sejam fitofármacos ou adubação. E a utilização de água é racionada. Um ano da cultura de milho prejudica mais os solos do que cinco ou seis anos de olival intensivo ou superintensivo, em termos de unidades de azoto, fósforo e potássio que colocamos na terra.

 

Sendo assim, a que é que atribui as críticas que associações ambientalistas, alguns partidos e populações têm feito a estas culturas?Nós, olivicultores do Alentejo, não aceitamos que nos considerem como criminosos quando estamos a ajudar a desenvolver o País. Temos uma taxa de empregabilidade bastante elevada. Os grandes ataques vêm de associações e de partidos ecologistas mas nós temos uma biodiversidade importantíssima nos nossos olivais, não estamos a prejudicar em nada a natureza.

 

Faz apanha noturna de azeitona?Faço.

 

Como encara a possibilidade dessa apanha ser proibida face à morte das aves?As mesmas aves que morrem num regime morrem no noutro, não podem proibir a apanha noturna porque senão ficamos na mesma. As primeiras máquinas a chegar vêm para o Alentejo, a técnica mais evoluída está no Alentejo, os sistemas de poda, de conservação de água e de solo estão no Alentejo, o azeite de maior qualidade, se calhar à escala mundial, é produzido no Alentejo. Temos potencial para evoluir mas necessitamos de um apoio mais efetivo do Estado e que não nos andem a chamar de criminosos. O que estamos a fazer é a organizar a nossa vida empresarial, a transformar herdades e a criar riqueza para o País e para o Baixo Alentejo.

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