O Centro de Alojamento de Emergência Social (CAES), gerido pela Cáritas de Beja desde 2023, vai encerrar no dia 31 de outubro face à impossibilidade de “ultrapassar alguns dos aspetos” considerados “imprescindíveis” para manter o funcionamento da resposta. Ao “Diário do Alentejo”, o presidente da Cáritas confirmou que as verbas deficitárias protocoladas com a Segurança Social e a falta de cumprimento das características do equipamento foram alguns dos motivos que conduziram a este desfecho.
Texto Ana Filipa Sousa de Sousa
“Nós, Cáritas de Beja, queremos resolver os problemas das pessoas, mas quando não temos ou não nos dão as condições para isso não o conseguimos fazer”. É desta forma que Isaurindo Oliveira, presidente da Cáritas Diocesana de Beja, comenta a tomada de decisão de encerrar o Centro de Alojamento de Emergência Social (CAES), gerido pela instituição desde maio de 2023.
Em declarações ao “Diário do Alentejo”, o presidente dá conta que nos últimos três anos “manifestou de forma preocupada e devidamente fundamentada” ao Centro Distrital da Segurança Social de Beja (CDSS de Beja) e aos sucessivos Governos a “necessidade impiedosa” de se olhar para o modelo de funcionamento do CAES, ou seja, ser uma resposta social de acolhimento de curta duração, que não era respeitado.“O CAES tem por norma receber e alojar todas as pessoas que estejam em situação de emergência, normalmente com problemas associados muito grandes, durante 72 horas [e] a partir do fim das quais as outras estruturas sociais tentarão procurar uma solução, [mas] o que nós detetámos é que muitas vezes essas soluções não existem e, ao não existirem, significa que as pessoas em vez de 72 horas estão um, dois, três ou quatro meses”, ressalva.
Esta situação, segundo o presidente, tem vindo a desgastar a equipa – duas técnicas, uma psicóloga, uma assistente social, três auxiliares e um monitor noturno – que “não tem estrutura para trabalhar com essas pessoas, nomeadamente, ao nível da saúde mental” por longos períodos.
“Depois os turnos tornam-se difíceis, até porque 24 horas por dia e sete dias por semana dá três turnos [por dia], mas esquecem-se de que há folgas e férias e que o referencial é curto. Por outro lado, acontece que durante uma parte significativa do dia, entre as 17:00 e as 00:00 horas, assim como aos fins de semana, só está uma pessoa presente e fomos percebendo que não é possível fazermos um trabalho com o mínimo de dignidade com esta equipa, porque é curta”, descreve Isaurindo Oliveira.
Para além disso, conforme explica o responsável, o financiamento atribuído à Cáritas pela Segurança Social “era curto” e não fazia face às despesas presentes e futuras, uma vez que o novo protocolo a negociar não previa “aumentos para os próximos anos”.
“O protocolo que nos propuseram está relacionado com o ano em que iniciámos [o CAES], não tem atualizações e não tem aumentos para os próximos anos. Portanto, fazendo as contas, olhando para a constituição da equipa e verificando que não foram tidos em conta todos estes reparos, a conclusão a que chegamos é que nós não temos uma estrutura que possa tornar [a resposta] viável”, reconhece.Sem querer apontar o dedo, Isaurindo Oliveira assume que, perante todas estas condicionantes, “nós, Cáritas de Beja, não temos estrutura que aguente fazer um trabalho digno” e, por isso, “como não há a possibilidade de mudar esta estrutura, só temos um caminho, que é encerrar”.
Assim, o presidente da Cáritas de Beja confirma que formalizou no passado dia 1 de agosto o pedido de renúncia do contrato – “com três meses de antecedência” do fim do mesmo – e que, por isso, o equipamento social irá encerrar no próximo dia 31 de outubro.
“À data de hoje temos 11 utentes no CAES, ou seja, a Segurança Social a partir da data do pedido começou a não permitir a referenciação de pessoas para cá e começou a tratar de tentar desviar as pessoas que cá estavam para outras estruturas”, informa.
Recorde-se que durante os três anos em que o CAES funcionou na Casa do Estudante a lotação de 30 vagas esteve “quase sempre esgotada”.
As despedidas
Antes de emitir o comunicado oficial na quarta-feira, dia 10, Isaurindo Oliveira esteve presente numa reunião ordinária do conselho intermunicipal da Comunidade Intermunicipal do Baixo Alentejo (Cimbal) para dar conta da decisão de encerramento.
Em junho de 2023, 10 municípios integrantes da Cimbal tinham decidido financiar parte dos 15 por cento referentes à Cáritas no âmbito da candidatura à Bolsa Nacional de Alojamento Urgente e Temporário do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) do Instituto da Habitação e da Requalificação Urbana.
Recorde-se que a Cáritas de Beja tinha visto ser aprovada nessa altura a candidatura de requalificação do atual edifício do CAES com um valor superior a 923 mil euros, financiado a 85 por cento.
Além da Cimbal, também a Associação de Olivicultores e Lagares de Portugal – Olivum fazia parte das empresas que financiariam a requalificação das instalações da Casa do Estudante.
Em nota de imprensa publicada nas redes socias, a Cimbal deu conta que a não concretização do referido projeto faz com que tenha ficado acordado “a devolução da verba”.
“Da parte dos municípios presentes foi manifestado o desapontamento e a insatisfação respeitante ao encerramento desta resposta, deixando o Baixo Alentejo ‘a descoberto’ no que respeita ao acolhimento de emergência social”, lê-se no comunicado.
Isaurindo Oliveira garante que “todas as estruturas”, incluindo “a parte autárquica”, tinham conhecimento deste problema, que “é muito complicado”, e relembra que este encerramento vem terminar também com a única resposta deste nível no distrito de Beja,
Em comunicado enviado ao “DA”, a Cáritas de Beja recorda que entre 2023 e 2025 o CAES acolheu 365 pessoas “numa resposta 24 horas por dia [e] sete dias por semana”.
Ainda assim, a Cáritas “não descarta a utilização do edificado da Casa do Estudante para outros fins sociais, cujo projeto e análise estaremos sempre disponíveis para avaliar em prol de um território mais inclusivo e que sirva os interesses de todas as partes”.