A lei da Reforma Agrária só seria aprovada e publicada em julho de 1975, mas a ocupação de terras já tinha começado antes. Em novembro de 1974, há cinco décadas, o Governo dava pequenos passos no sentido de obrigar os proprietários abstencionistas a tirar rendimento das suas herdades.
Na edição de dia 23 de novembro de 1974, na primeira página, o “Diário do Alentejo” titulava em letras grandes: “Governo vai arrendar herdades no Alentejo” e revelava que o secretário de Estado da Agricultura, Esteves Belo, numa entrevista ao jornal “A Capital”, tinha referido que “de acordo com informações de que [dispunha] no Alentejo havia terras incultas ou subaproveitadas”, e que, por isso, o Governo tinha aprovado “um diploma que prevê que o Estado possa fazer o arrendamento das terras nas quais não haja a necessária, e indispensável intensificação cultural”.
O Governo lamentava que a comunicação social, na altura, não lhe tivesse dado a “relevância que merecia”, mas confiava que o documento já seria suficientemente conhecido, “de forma a que esses proprietários ou rendeiros que estejam a cultivar essas terras saibam que terão de intensificar as culturas, porque, se assim não suceder, o Estado não deixará de intervir”.
O Estado dispunha-se, assim, a “fazer o arrendamento dessas terras, para, directamente ou através de cooperativas de produção, que apoiaremos e estimularemos, obter o maior rendimento, a maior produção, visto que pode esperar-se que em face das necessidades acrescidas a nível mundial, e de certas limitações nos mercados internacionais, as nossas necessidades de abastecimento deverão ser devidamente acauteladas, e não haverá melhor maneira de o fazer do que aumentar a produção nacional”, dizia o governante.
Esteves Belo adiantava até que já tinha tido contactos nesse sentido, nomeadamente, “com proprietários relativamente a duas herdades, e hoje à tarde vou ter nova reunião com vista ao seu arrendamento. Uma tem 3500 hectares e outra 3800. Estas, segundo as informações que temos, não satisfazem os padrões mínimos de intensificação cultural. Independentemente disso, estamos a procurar, através das associações, dos serviços regionais, dos trabalhadores rurais e de uma comissão que anda a percorrer o Alentejo, indicação de propriedades que não estejam devidamente cultivadas”.
Na edição seguinte, o “DA” trazia mais informações sobre o assunto e explicava quem ficaria responsável pela implementação desta política no terreno e que seria o Instituto de Reorganização Agrária (IRA).A esta instituição “foi conferido o direito de tomar de arrendamento as terras incultas ou subaproveitadas, desde que o proprietário que as explore directamente declare, num prazo de 15 dias, após ter sido notificado, não desejar proceder ao seu aproveitamento adequado ou não procedo, no prazo em que lhe for determinado, ao seu aproveitamento”.
E para que não subsistissem dúvidas explicava-se que se consideravam “terras incultas aquelas que, podendo ser economicamente aproveitadas, não são objecto de exploração, bem como as terras cobertas de pastos naturais que não correspondam a uma exploração pecuária organizada, nem suportem uma carga mínima a fixar pelo Governo”.
Como já se disse, alguns meses depois avançariam as ocupações de terras e nasciam as cooperativas e unidades coletivas de produção. Foi o período que ficou conhecido como Reforma Agrária e que só seria interrompido em 1977, aquando da publicação daquela que ficou conhecida como a lei Barreto e que permitiriam a devolução das terras aos seus antigos proprietários.
Aníbal Fernandes