Diário do Alentejo

“Aeroporto de Beja: juntem-se, porra!”

05 de agosto 2022 - 11:00
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Fernando Caeiros e José Lopes Guerreiro lançam desafio a autarcas da região. Pedro do Carmo critica ANA e promove Baixo Alentejo junto de companhias aéreas.

 

Na semana em que foi noticiado que a decisão sobre a solução para o novo aeroporto de Lisboa poderá demorar mais um ano, a infraestrutura aeroportuária de Beja voltou a receber três voos charters e inúmeros privados.

Também a semana passada o deputado Pedro do Carmo escreveu uma carta a várias companhias low cost a promover o destino alentejano e dois autarcas históricos do Baixo Alentejo fizeram publicar um artigo sobre o assunto, num jornal de expressão nacional, com o título “Aeroporto de Beja: juntem-se, porra!” 

 

Texo Aníbal Fernandes

 

O arranque da construção do novo aeroporto de Lisboa vai atrasar, pelo menos, um ano. Na sua última edição, o “Expresso” noticiou a exigência de uma nova Avaliação Ambiental Estratégica (AAE) que porá em perspetiva as várias hipóteses, quer do ponto de vista ambiental, quer do ponto de vista económico e social.

 

Isto resulta da posição da nova liderança do PSD – e do consenso procurado por António Costa sobre o assunto – mas também da legislação europeia, considerando o atual Governo que é o caminho “juridicamente mais seguro”. O semanário do grupo Impresa avança que o novo estudo será realizado pelo Laboratório Nacional de Engenharia Civil – um organismo público – permitindo, assim, não ser necessário o lançamento de um concurso público internacional para a tarefa, o que iria atrasar, e muito, a conclusão do estudo.

 

Em princípio, os projetos a avaliar serão apenas as três hipóteses há muito faladas: Portela + Montijo como complementar; Montijo + Portela como complementar; e Alcochete. No entanto, nada impede o Governo de juntar à lista outras soluções como, por exemplo, Beja, mas isso iria, segundo fonte do Governo citada pelo “Expresso”, adiar ainda mais a decisão.

 

MANUTENÇÃO E CARGA

António Ceia da Silva, presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) do Alentejo, que no verão de 2012 integrou o Grupo de Trabalho para o Aeroporto de Beja, mantém a opinião que tinha na altura:

 

“O aeroporto de Beja, tal como está, é vocacionado para a manutenção de aeronaves e para serviço de carga” e é por aí que se podem “criar dinâmicas empresariais e muitos postos de trabalho”, a exemplo do que se passa “por toda a Europa” com diversos aeroportos destinados a este tipo de serviços.

 

No entanto, o atual presidente da CCDR Alentejo disse ao “Diário do Alentejo” (“DA”) que a conclusão da autoestrada e a eletrificação da ferrovia “podem criar condições” para a utilização da infraestrutura também porpassageiros.

 

Também o deputado do PCP, João Dias, que há três semanas reuniu com a direção da ANA - Aeroportos de Portugal, considera que “o investimento público tem de andar à frente do privado”. “O aeroporto, neste momento, tem características que o vai impor por ele próprio”, diz, acrescentando que “falta o resto, as acessibilidades”. O deputado comunista não descarta a utilização da pista de Beja para o uso de passageiros, mas lembra que, para isso acontecer, tem de haver “investimento da ANA e do Governo”. “O aeroporto faz falta, mais que não seja, para exportar os frescos produzidos na região”, conclui.

 

PEDRO DO CARMO ESCREVE A LOW COST

 

Pelo seu lado, Pedro do Carmo escreveu à Ryanair, EasyJet e Transavia, três companhias que operam em outros aeroportos nacionais.

 

“O Aeroporto de Beja está confrontado com a ausência de vontade para a valorização desta infraestrutura aeroportuária, depois da suspensão de ligações rodoviárias que a tornariam ainda mais relevante como alternativa às existentes em Lisboa e em Faro” e considera “inaceitável a ausência de uma estratégia para a valorização da infraestrutura de Beja”.

 

O deputado socialista diz que a localização de Beja “não é muito diferente das existentes noutras cidades europeias em que operam companhias aéreas com voos comerciais”, e defende que o Baixo Alentejo deve ser ponderado como “alternativa”.

 

Pedro do Carmo sublinha ainda o potencial turístico da região e recorda que “o aeroporto de Beja dispõe de um terminal de passageiros, de carga e de manutenção de aeronaves” e “está preparado para receber todo o tipo de operações com um elevado nível de eficiência, estando sob gestão da ANA - Aeroportos de Portugal, detida pela Vinci Airports, na sequência da privatização de 2012 pelo Governo de então”.

 

“Neste contexto, face à ausência de valorização do aeroporto de Beja por quem o gere e deveria valorizar ainda mais como infraestrutura aeroportuária do país, vimos pela presente reafirmar junto da[s] vossa[s] companhia[s] aérea a ponderação da sua utilização em alternativa aos destinos que já utiliza em Portugal, com evidentes ganhos para a operação aeroportuária da empresa”, concluiu.

 

PSD DISTRITAL CONTESTA O PSD

Num comunicado assinado pelo presidente da Comissão Política Distrital de Beja, manifestou-se “perplexo” com a carta escrita por Pedro do Carmo, afirmando que a privatização do aeroporto de Beja aconteceu na sequência do “memorando de entendimento com a Troika, aquando da bancarrota em que o governo socialista deixou Portugal”, e que “o governo do PSD/CDS” apenas se limitou a concretizar.

 

Gonçalo Valente aponta ainda “contradições” entre a carta de Pedro do Carmo e uma recente entrevista do presidente da Câmara de Beja (ver última edição do “DA”), afirmando que enquanto o deputado do PS defende a utilização da infraestrutura por voos de passageiros, o autarca bejense aceita que a “a solução deve passar pela manutenção e carga”.

 

O dirigente do PSD acaba a atacar o Governo liderado por António Costa que “está há sete anos” no poder e que para além de “estudos de impacto ambiental e promessas ocas” ainda não encontrou “soluções para o aeroporto”.

 

Em declarações ao “Diário do Alentejo”, Pedro do Carmo considera que o “aeroporto de Beja está a cumprir os objetivos para que foi criado” e que é o de ser “um aeroporto militar – cada vez mais – com utilização civil. O que eu defendi é uma solução de complementaridade. Aquilo que eu fiz com a carta que escrevi foi, perante algumas companhias aéreas, promover as vantagens que Beja e a região oferecem, algo que a ANA não tem feito”.

 

JUNTEM-SE, PORRA!

Há duas semana, no jornal “Público”, os ex-autarcas Fernando Caeiros e José Lopes Guerreiro fizeram publicar um artigo em que defendem que “cabe aos atores alentejanos, muito especialmente às autarquias - através das comunidades intermunicipais do Alto Alentejo, do Baixo Alentejo, do Alentejo Central e do Alentejo Litoral -, aos deputados eleitos pelos círculos eleitorais de Beja, Évora, Portalegre e Setúbal, aos representantes da economia, à CCDRA, à ERT (Turismo do Alentejo e Ribatejo) e aos demais agentes e organizações da sociedade civil alentejana a responsabilidade de desencadearem uma ação concertada que cumpra o objetivo de a região se fazer ouvir quanto à pertinência que tem a utilização do aeroporto de Beja, para, com custos comportáveis e num prazo aceitável, contribuir para a mitigação dos constrangimentos do Aeroporto Humberto Delgado”.

 

O artigo, que foi dos mais lidos e mais comentados na edição online do jornal, também desafiava o bejense Carlos Moedas, atual presidente da câmara municipal da capital, a desempenhar “um papel relevante” para “afirmar Lisboa em posição cimeira na corrida pela descarbonização e pelo combate à poluição sonora num grande centro urbano, como advém de existir um aeroporto dentro da malha citadina”.

 

Os autores do texto afirmam que a sua intervenção deve ser lida “dentro do espírito de cidadania ativa que a todos compete, lançando algumas questões”, nomeadamente: se não é pertinente perspetivar a construção de um “novo e moderno aeroporto, concebido para um largo horizonte temporal, suficientemente longe e suficientemente perto da capital, dentro da Área Metropolitana de Lisboa? E concluem que Alcochete é a melhor localização.

 

“Então, por que razão o aeroporto de Beja é chamado à discussão, uma vez que Alcochete é a solução? Simplesmente porque Beja existe, é verdade: existe mesmo, com duas pistas de aterragem cuja extensão faz inveja a qualquer infraestrutura similar nas maiores cidades do mundo, com acessibilidades facilitadas, segurança máxima e impactos ambientais reduzidos comparativamente a outras soluções, para além das excecionais condições climatéricas, de luminosidade e orográficas que foram determinantes para a escolha do local enquanto base militar. Um aeroporto que, no curto prazo, poderá ser adaptado para uma nova função de complementaridade do principal aeroporto nacional e do aeroporto de Faro, função que, embora diminua de importância no médio prazo, sempre poderá continuar a assegurar, sem custos adicionais para o erário público que não os derivados do redimensionamento da estrutura de acolhimento de passageiros e de aeronaves, bem como na infraestrutura ferroviária e rodoviária, cujos investimentos (peanuts, como agora soe dizer-se) — na ordem dos 20 milhões de euros/ano no próximo triénio em OE, considerando o apoio não reembolsável dos fundos europeus estruturais”, escrevem os ex-presidentes de Castro Verde e Alvito.

 

Os signatários, dizem ainda que a solução Montijo “muito dificilmente dará em tempo oportuno um contributo paraaliviar a pressão na Portela”, acrescentando que “o reforço das valências atuais do aeroporto de Beja, quanto à utilização civil”, terá “impactos consideráveis no turismo, na agroindústria e na manutenção aeronáutica”, e será “polarizador de atividades fundamentais à coesão territorial”.

 

E rebatem o argumento da distância/tempo: “as milhas entre Beja e Lisboa são bem mais compridas do que as milhasentre Paris e o aeroporto Beauvais-Tillé (1.15 horas), Barcelona e o aeroporto de Girona (1:15 horas) e Frankfurt e oaeroporto Hahn (2:10 horas), ou ainda, conforme testemunhos muito atuais, entre o centro de Londres e Stansted (2:30 horas), questionam.

 

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