Diário do Alentejo

Baixo Alentejo: Valor médio das pensões é de 335 euros

03 de novembro 2021 - 08:00

O valor médio das pensões da Segurança Social pagas no Baixo Alentejo aumentou 21,2 por cento em 10 anos. O montante é, no entanto, inferior à média nacional, sendo, ainda, o mais baixo da região Alentejo. Comparativamente a 2011, os aumentos mais significativos observam-se nos concelhos de Castro Verde e Aljustrel e os mais baixos em Barrancos e Cuba.

 

Texto Nélia Pedrosa

 

De acordo com dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), atualizados no início deste mês, o valor médio das pensões – invalidez, velhice e sobrevivência – pagas pela Segurança Social no Baixo Alentejo (NUTS III) é de 4690 euros anuais, mais 21,2 por cento do que em 2011 (3870 euros/ano).

 

Este montante é, no entanto, inferior à média nacional (5811 euros/ano), correspondendo a 80,7 por cento desse valor, sendo, ainda, o mais baixo da região Alentejo – Alentejo Litoral (5443 euros/ano), Alentejo Central (5174) e Alto Alentejo (4825). Mensalmente, os pensionistas no Baixo Alentejo recebem, em média, 335 euros. Em termos nacionais, o valor médio anual mais elevado regista-se na Área Metropolitana de Lisboa (7462 euros/ano) e o mais baixo no Alto Tâmega (3827).

 

Os dados disponibilizados pelo INE mostram igualmente que o valor médio anual das pensões é muito assimétrico no Baixo Alentejo, com os montantes mais elevados a serem registados nos concelhos de Aljustrel (5752 euros/ano) e Castro Verde (5486) e os mais baixos em Moura (4300) e Barrancos (3983).

 

Comparativamente a 2011, os aumentos mais significativos observam-se nos concelhos de Castro Verde (39,6 por cento), Aljustrel (30,4 por cento) e Almodôvar (27 por cento) e os mais baixos em Alvito (14,5 por cento), Barrancos (13,9 por cento) e Cuba (11,8 por cento).

 

Este valor médio das pensões pagas no Baixo Alentejo está abaixo do limiar de risco de pobreza (6480 euros/ano), ou seja, o limite do rendimento abaixo do qual se considera que uma família se encontra em risco de pobreza. Este valor foi convencionado pela Comissão Europeia como sendo o correspondente a 60 por cento da mediana do rendimento por adulto equivalente de cada país.

 

O presidente da União Distrital de Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS) de Beja frisa, em declarações ao “Diário do Alentejo”, que os valores médios das pensões referentes ao Baixo Alentejo “incluem, certamente, ainda uma população que exerceu a sua atividade profissional antes do 25 de Abril e só obteve pensão de reforma graças ao regime instaurado no país democrático”. “Muitos deles eram trabalhadores agrícolas, ou donas de casa, que, infelizmente, nunca puderam beneficiar de um sistema de segurança social como o que hoje existe, pelo que nunca lhes foi conferida a possibilidade de fazerem os respetivos descontos para garantir uma pensão mais digna”, especifica Vítor Igreja.

 

Para além disso, situando-se o Baixo Alentejo no interior do País e sendo “constituído por uma população de baixas qualificações e onde a oferta de trabalho existente é, preferencialmente, para atividades indiferenciadas e mal remuneradas, será perfeitamente expectável que as pensões pagas pela Segurança Social sejam das mais baixas do País”, acrescenta.

A “quase inexistência de atividade industrial ou de empresas que requeiram pessoal especializado”, refere ainda o dirigente, “fomenta o afastamento da população mais qualificada e mais jovem, diminuindo a população e agravando o seu envelhecimento”.

 

MINAS JUSTIFICAM VALORES MAIS ELEVADOS EM ALJUSTREL E CASTRO VERDE O presidente da mesa do conselho geral do Núcleo Distrital de Beja da EAPN/Rede Europeia Anti-Pobreza sublinha, por sua vez, que “importa recuar até pelo menos 40 anos (período de início de descontos)” para “se compreender a realidade da região” de então. “A atividade principal era a agricultura, fundamentalmente de culturas de sequeiro, o trabalho era escasso e sazonal, o que levou muitos alentejanos a emigrar ou a procurarem oportunidades no litoral ou na Área Metropolitana de Lisboa”, diz João Martins.

Há quatro décadas, prossegue, “também não existia o rigor fiscal atual, o que levava muitas vezes, quer por interesse da entidade patronal e/ou do trabalhador, a não se declararem trabalhos pontuais, o que acarretou como consequência valores de pensões mais baixas na atualidade”.

O responsável salienta, ainda, que “os trabalhos melhor remunerados dos mineiros justificam que em Aljustrel e Castro Verde os valores das pensões sejam superiores” e que o aumento do valor médio das pensões verificado nos últimos 10 anos poderá justificar-se “com oportunidades crescentes e melhores remunerações decorrentes do Empreendimento de Fins Múltiplos de Alqueva e de as novas atividades económicas, como o turismo, a restauração, entre outras, ganharem mais expressão e proporcionarem melhor remuneração, a par de um melhor controlo fiscal”.

O valor médio das pensões no Baixo Alentejo, “abaixo do limiar de risco de pobreza, é um facto que só surpreende quem não lida diariamente com a dura realidade dos nossos idosos”, afirma o presidente do Secretariado Regional de Beja da União das Misericórdias Portuguesas. E lembra que “há mais de cinco séculos que as Misericórdias se entregam a cuidar dos idosos, dos desfavorecidos da sociedade, ancoradas nos seus valores e raízes, tendo como princípio o que magistralmente em tempos recentes o papa Francisco afirmou, ‘uma comunidade, um Povo, um Estado que não cuida dos seus idosos é um povo sem futuro, porque quem não cuida das suas memórias não tem futuro’”.

Francisco Ganhão sublinha que “por detrás destes números estão pessoas, estórias de vida, a sua grande maioria desenhadas com trabalho de sol a sol, empenho, dedicação e carinho para com os seus descendentes, com o propósito de lhes proporcionar ‘ferramentas’, as quais permitiram a ascensão social e melhores condições de vida. São seres humanos que merecem um tratamento digno, qualidade de vida e cidadania”.

“REPERCUSSÕES PESADAS NA QUALIDADE DE VIDA”

Para o presidente da União Distrital de IPSS de Beja, “é claro e inequívoco que os baixos rendimentos dos idosos têm repercussões pesadas na qualidade da sua vida, quer permaneçam no seio da família, quer já se encontrem numa residência para idosos, ou, ainda bem pior, se viverem isolados”. Normalmente “estes idosos são oriundos de agregados familiares com rendimentos reduzidos, passando a constituir um acréscimo nas dificuldades que as famílias já atravessam, sobretudo, se o idoso necessitar de medicamentos, apresentar dificuldades na mobilidade, ou, ainda, se sofrer algum tipo de doença limitativa da sua capacidade intelectual”.

Vítor Igreja assegura que nas estruturas residenciais para idosos é feito, neste momento, “um elevado esforço para que os idosos possam ter o melhor apoio possível, em função dos recursos disponíveis”. No entanto, as dificuldades de financiamento que afetam estas instituições “estão a atirá-las para a falência ou a obrigá-las a sobreviver no limite das suas capacidades”, alerta.

 

“O modelo de financiamento vigente incorpora uma componente estatal e uma componente familiar, sendo que esta última é proporcional ao valor da pensão do utente. Se o conjunto dos utentes tiver pensões de baixo valor, como acontece no Baixo Alentejo, a fonte de receita das instituições será sempre insuficiente para poder dar cumprimento à sua função social de acolhimento de idosos e dar lugar à prestação de um serviço com qualidade a que todos deveriam ter direito”.

De acordo ainda com o dirigente, “o número cada vez maior de idosos com algum tipo de demência, ou em situação de privação de mobilidade, que os hospitais recusam manter por períodos prolongados, e as famílias não conseguem apoiar, só obtém acolhimento nas estruturas residenciais do setor social”. Contudo, “é apenas sobre estas que recai o acréscimo nos custos com recursos humanos e materiais”.

 

Defende, por isso, “o fomento da qualidade de vida das populações, melhorando a sua alimentação, a prática de exercício físico e a atividade intelectual”. Só deste modo “poderemos garantir uma vida mais prolongada, com mais autonomia, reduzindo as doenças e limitações próprias da idade, e investindo num apoio domiciliário integrado, que mantenha os idosos no seu domicílio durante mais anos de vida, evitando assim o seu declínio precoce, e tornando-os menos dependentes dos serviços de apoio”.

 

COMPLEMENTO SOLIDÁRIO PARA IDOSOS “É FUNDAMENTAL”

O presidente da mesa do conselho geral do Núcleo Distrital de Beja da EAPN/Rede Europeia Anti-Pobreza sublinha que o povo alentejano “é extremamente resiliente e possui orgulho próprio”, pelo que, “não obstante as baixas pensões, e por se estar numa região rural, a grande maioria das pessoas possui ou tem um familiar que tem uma pequena horta, o que apoia e compensa, de algum modo, a vida diária”. De igual forma, é um povo “solidário e nas situações mais extremas, ao nível familiar, encontra-se quase sempre um suporte e auxílio”. João Martins realça, ainda, “uma outra característica do povo alentejano, que é a de se acomodar à sua situação”.

 

Por outro lado, Portugal “é possuidor de um ‘Estado Social’, em que mesmo com baixas pensões ninguém é excluído de entrar num lar ou casa de repouso, sendo que a grande maioria possui acordos com a Segurança Social”. As situações mais críticas, diz, “são sinalizadas e existem mecanismos e entidades de apoio no terreno”. Em seu entender, os complementos solidários para idosos e “outras medidas análogas são fundamentais para os casos de reformas mais baixas”.

 

Sem “a existência das Misericórdias localmente”, garante o presidente do Secretariado Regional de Beja da União das Misericórdias Portuguesas, “a realidade seria cruel para estes pensionistas do distrito de Beja”. Francisco Ganhão frisa que a “experiência adquirida pelo amor ao próximo ao longo de mais cinco séculos [de atividade das Misericórdias]” permite “atenuar os efeitos destas parcas reformas, quer seja através do apoio alimentar que é dado diariamente pelas Misericórdias e IPSS no distrito de Beja, quer da integração destes idosos em vagas de serviço de apoio domiciliário, centro de dia ou lar, assegurando, assim, um tratamento digno, higiene habitacional e pessoal, companhia, socialização (dado que alguns idosos não apresentam ter suporte familiar), animação e actividades socioculturais, para que estejam ativos e assim se retarde o seu envelhecimento abrupto”.

 

COMBATER A POBREZA NA TERCEIRA IDADE

Tendo em conta o valor médio atual das pensões no Baixo Alentejo, o presidente do Secretariado Regional de Beja da União das Misericórdias defende a implementação de “limites mínimos e máximos”: “O mínimo seria equivalente ao salário mínimo nacional, sendo assim possível combater a pobreza na terceira idade. O máximo deveria ser o Estado a propor, sendo que o beneficiário poderia compor a sua pensão acumulando com um seguro poupança reforma. Desta maneira teríamos uma realidade equilibrada e humanista no que diz respeito às reformas atribuídas pelo Estado”. Já o presidente da mesa do conselho geral do Núcleo Distrital de Beja da EAPN considera que o Baixo Alentejo “de hoje e do futuro afigura-se como uma das regiões do País com maior potencial de crescimento económico, potenciador de geração de emprego permanente, muito do qual qualificado, fator que permite e permitirá a oferta de melhores salários”. O aumento previsto do salário mínimo, por outro lado, é um fator que “gradualmente permitirá, num futuro próximo, que os pensionistas venham a usufruir de melhores ‘reformas’”, conclui.

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