Diário do Alentejo

DIGO EU...: Na dúvida, é saudade

13 de outubro 2025 - 08:00
Ilustração | Susa Monteiro/Arquivo

Texto | Jorge MartinsIlustração | Susa Monteiro/Arquivo

 

Mais do que uma arte, a música é uma expressão. Nela encontramos expressa, das mais variadas formas e nas mais diferentes línguas, esta saudade que, não tendo paralelo em tradução, digo-vos eu, terá uma expressão universal. São muitos os títulos e os poemas que a evocam.

Tão inesperada como recorrente. Tão distante como presente. Tão difícil como real. O que é, afinal, a saudade?

Como se traduz? Como se sente? A quem se atribui a responsabilidade de o sentir? É um sentimento? Um estado de espírito? Uma crença? A saudade está-nos coração.

Mas a sua expressão oral tende a banalizá-la.

Será possível ter saudade de um prato que comemos, na mesma medida em que o temos de alguém que partiu para não voltar? Será possível sentir saudade de outros tempos que nos marcaram, com a mesma intensidade que o temos por um amigo que não vemos há anos? Existirá um medidor de saudade? Poderá esta ser colocada na gaveta da saudade, qual transtorno obsessivo-compulsivo, por cores que associamos a diferentes escalões? Sinto que podemos confundir, muitas vezes, saudade com falta. E isso pode tirar poder a esta emoção (será isso, então, a saudade?) em detrimento do impacto que a falta nos traz.

O que podemos fazer quando esta confusão se instala? É importante esclarecer para nós próprios ou deixamos só fluir? Haverá alguma hipótese de serem uma e a mesma coisa?

Talvez a saudade seja um estado da alma e a falta seja uma certeza.

Mas qual das duas é mais fácil suprir? Como compensamos cada uma delas? Quanto do que nos faz falta deixa saudade?

Ter saudade tem de ser visto, sem exceção, como uma “coisa” boa. Será sempre um sinal de que o motivo para ela surgir nos é suficiente e positivamente marcante e, mais, que nos diz o quanto baste para provocar esta sensação (aqui está mais uma tentativa de lhe atribuir um rótulo).

Poderá a saudade ser sempre uma expressão emocional ligada à ausência? E como racionalizar esta expressão para o caso desta ausência não ser possível de compensar? É aqui que passamos ao nível da falta?

Existirá uma linha de tempo razoável para podermos admitir a chegada da saudade? Ou podemos viver um momento de forma tão intensa que, ainda ao vivê-lo, nos permitimos a ter saudade mesmo antes de terminar?

Hoje trouxe para aqui mais questões do que respostas, é certo.

Porém, deixo uma certeza: fazes-me (muita) falta.

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