Texto | Luís Miguel Ricardo
Nasceu em Lisboa, em 1974, e viveu em Loures até 1992. O seu primeiro contacto com o universo da música aconteceu aos seis anos quando integrou um coro paroquial. Dez anos mais tarde ingressou no Instituto Gregoriano de Lisboa, percurso interrompido com a mudança para Coimbra, para estudar Economia. Interrompido em Lisboa, mas continuado na cidade dos estudantes, chegando a integrar o coro misto da universidade e o Orfeão Académico de Coimbra. Também durante este período estudou canto e frequentou o Curso Nacional de Música Litúrgica, na vertente de direção coral.
Em 1996, refere ter tomado uma das decisões mais difíceis da sua vida: abandonar a licenciatura em Economia para ingressar no curso de Professores de Educação Musical, em Beja. E foi pela capital baixo-alentejana que frequentou, paralelamente ao curso superior, o Conservatório Regional do Baixo Alentejo, estudando canto, formação musical e coro, e, onde mais tarde, durante o segundo ano da licenciatura, se veio a tornar professora, mantendo-se na entidade até 2008.
Terminada a licenciatura, e volvidos vários anos letivos a lecionar educação musical nas escolas do ensino básico do Alentejo, começou a ter dificuldades de colocação em horários completos e decidiu, em 2011, realizar uma especialização noutra área de formação, concluindo, quatro anos depois, a formação em Educação Especial, área escolar que abraçou em 2017, num abraço que se mantém até à atualidade, apesar de assumir que é na música que se sente mais realizada. E foi nesta valência que participou na criação de dois coros: os Pequenos Cantores de Santa Maria, em Loures, e o Coro Juvenil do Carmo. E foi nesta valência que executou obras musicais de grande relevo. E foi nesta valência que trabalhou com grandes maestros e compositores portugueses.
Eis Helena Almeida, a maestrina do Coro Juvenil do Carmo, na primeira pessoa.
Quando e como surgiu o gosto pela música?
Sempre me lembro de ter algum contacto com a música. Essa experiência vem, essencialmente, da minha participação em coros. Na zona de Lisboa, a atividade coral é intensa e, por várias vezes, o coro que eu integrava foi convidado a participar em iniciativas, com outros coros, de grande dimensão. Lembro-me de com 12 anos ter interpretado uma obra do cónego Ferreira dos Santos, no Mosteiro dos Jerónimos, com um coro de cerca de 400 vozes e uma orquestra. Para uma criança, naqueles tempos, era uma experiência inolvidável. E outras do género se repetiram, com a presença do Presidente da República e de todo o corpo diplomático, a missa com o Papa São João Paulo II, no estádio do Restelo. Todas estas vivências na minha infância e adolescência influenciaram o meu interesse pela música, sobretudo, coral.
Como foi o percurso até chegar a maestrina?
Não me considero uma verdadeira maestrina, na verdadeira aceção da palavra, uma vez que não tenho licenciatura em Direção Coral. Ainda antes de qualquer formação mais específica, comecei a dirigir pequenos grupos. Concluí o curso de Música Litúrgica e fiz alguns workshops e ações de formação. Aprendi, sobretudo, com aqueles maestros com quem cantei e, muito do que sei, tem sido por autoformação. Sempre que posso procuro formação, atualmente um pouco mais facilitada pelas vantagens das tecnologias, uma vez que o facto de ter optado por me instalar em Beja condicionou o meu desenvolvimento formativo nesta área. Ultimamente, tenho tido a oportunidade de trabalhar com o maestro Altamiro Bernardes, que tem uma grande carreira internacional.
Que papel desempenha o Alentejo na arte de Helena Almeida?
O Alentejo acolheu-me muito bem e eu sinto-me uma alentejana de gema, e refiro-me sempre ao “meu” Alentejo. O Alentejo tem uma rica tradição cultural e artística, sobretudo, na área da música, que, ao longo destes 27 anos, tem influenciado a minha expressão musical e a do coro. Onde quer que o coro se apresente, faço sempre questão de levar uma música de cariz tradicional do Baixo Alentejo, para assim também deixar bem vincada a nossa raiz e as nossas tradições.
Como é dirigir “uma multidão de vozes” focadas num mesmo objetivo?
Dirigir uma “multidão de vozes” é muito desafiador, sobretudo, quando se trata de um grupo tão heterogéneo, com idades e vivências musicais bem distintas. É preciso promover a diversidade e a inclusão, escutar cada uma das vozes e trabalhá-las para que resulte uma harmonia coesa e que cada um sinta que faz parte de um todo. E começa logo com a escolha de repertório, pois tem de agradar a quem o interpreta e tem de ter um significado emocional de forma a aumentar a autenticidade e o empenho na execução. É muito gratificante ver o resultado dum trabalho que às vezes é tão difícil e que parece que não vai dar em nada. São muitos os momentos em que me emociono em pleno concerto ou celebração litúrgica.
Coro Juvenil do Carmo, Congresso de Pueri Cantores, Roma 2023. Como foi a experiência?
A participação no congresso, em Roma, foi o culminar de todo um trabalho que temos vindo a desenvolver, sobretudo, na liturgia. Foram dias muito intensos: horários rígidos, várias atividades integradas no congresso, filas para passar a segurança e entrar para a audiência papal e missa de Ano Novo, e a responsabilidade de sermos os embaixadores de Portugal no congresso. Poder partilhar a música, linguagem universal, e celebrar a mesma fé com crianças de 96 coros de todos os cantos do mundo foi uma experiência que ficará marcada para sempre nas nossas vidas e que será um marco na história do coro. Nas palavras que o Papa Francisco nos dirigiu, ele refere que “o canto é beleza e gosto pela vida”. E, ainda, “que os coros ajudam as comunidades a rezar e a abrir o coração a Deus: cantar é um ato de amor e, ao fazê-lo, rezamos com palavras e com música, com o coração e com a voz, com a devoção e com a arte”. É esta fé que queremos celebrar com arte, para maior glória de Deus.