Diário do Alentejo

Alexandre Catarino: "Ouvir música criada por mim é ouvir um Alentejo positivo, contemplativo, sonhador e criativo"

23 de dezembro 2022 - 11:00
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Nasceu em Beja há mais de quatro décadas. E foi pela capital do Baixo-Alentejo que cresceu, que estudou, que se fez homem, que se tornou assistente social, e que se fez apaixonado pela arte, pela cultura, pela música. E foi nesta última valência cultural e artística que mais se notabilizou, fundando várias bandas e participando e apoiando vários projetos musicais. Como principais trabalhos realizados, destacam-se os projetos Malino e Tango Paris. Eis Alexandre Catarino na primeira pessoa.

 

Texto Luís Miguel Ricardo

 

Quando e como o gosto pela música começou a ganhar protagonismo?Inicialmente foi através dos discos do meu pai, das bandas que se ouviam nas rádios, dos videoclips e espetáculos que passavam na televisão. Já na adolescência, através da descoberta mais aprofundada do boom chamado rock e igualmente de tantos outros estilos musicais. Passei a assistir ao maior número possível de espetáculos pelo país, quer em salas, quer em festivais, e a partir daí começou a loucura de querer subir para os palcos. E assim aconteceu.

 

Quem são as referências musicais de Alexandre Catarino?São tantas e depende muito do estado de espírito e do que estou a criar no momento. Sempre ouvi muitas bandas de rock, no entanto, cada vez mais, a world music e a música instrumental levam-me a descobrir bandas dos quatro cantos do mundo, tornando-se referências no meu trabalho e composição musical.

 

Dos projetos realizados, há alguns a destacar?Malino e Tango Paris merecem destaque, na minha opinião, pelas dezenas de espetáculos realizados por todo o país, pelas excelentes críticas e grande simpatia por parte do público. Destaco estas duas bandas que fundei, pela qualidade e forma como conseguem criar paisagens sonoras que nos transportam em viagens que valorizam o Alentejo. Os videoclips de ambas as bandas assim o comprovam. É uma forma de, por um lado, divulgar o riquíssimo património histórico local, ao som da música que faço, e assim temos lançado inúmeros videoclips. Neste processo, muitos são os cenários entre campos, ruas, edifícios e pormenores retratados, enquanto veículo que expressa, em imagens, aquilo que é o verdadeiro trabalho da banda. Aliado ao trabalho musical, o vídeo e a fotografia acabam por estar de “mãos dadas”.

 

E que projetos são estes?São bandas de sonoridade instrumental compostas apenas por dois elementos cada e são diferentes nas suas características musicais. Tango Paris soa a um Western que transporta a alma lusitana para um filme na planície alentejana, que poderia ser igualmente na planície americana, ou até mesmo, num grande desfiladeiro. Os Malino são uma dupla de guitarristas que conjuga a world music com rock flamenco, com concertos repletos de energia, num ambiente de festa, mas convidativo a uma contemplação interior. Assim, as cordas das guitarras serpenteiam melodias e choques de percussão, num verdadeiro convite à dança. E é desta forma que os Malino têm tido uma atividade constante e atuado de norte a sul do país. Deixo o convite a todos os leitores para nos seguirem nas redes sociais. Para tal, basta pesquisar por Malino (ou Malinoband) ou por Tango Paris e deixarem o vosso gosto.

 

Como surge o repertório nestes projetos musicais onde intervém Alexandre Catarino?A criação musical surge normalmente através da composição de frases na guitarra e a partir daí desenvolve-se a ideia inicial até culminar na música. A criação é um processo inacabado porque estamos constantemente a recriar, a melhorar e por isso estou habitualmente a compor mais e mais. O reportório é depois repensado para que em palco possa ter o melhor resultado possível e aceitação por parte do público. As músicas são todas originais e não existem vozes, porém, já aconteceram algumas colaborações com vozes.

 

Que opinião sobre o universo musical que evolui na região do Alentejo?Temos hoje o maior número de vozes e de artistas do Alentejo em grandes palcos pelo país e pelo mundo fora, principalmente pelo trabalho desenvolvido em prol do fado e do cante alentejano. No entanto, comparativamente ao que acontecia há uns anos, existem hoje muito menos bandas na nossa região, reflexo do que se passa pelo país e pelo mundo, e muitos são os fatores que explicam este decréscimo. É fundamental que existam apoios para a criação de novas oportunidades para os artistas do Alentejo.

 

Que papel desempenha o Alentejo nos projetos artísticos de Alexandre Catarino?Quando se nasce e cresce numa região, naturalmente que é toda uma influência que se torna intrínseca ao trabalho desenvolvido. As longas paisagens alentejanas, o campo, a planície, a seara e as estradas, sempre me influenciaram na composição musical, pelo que, ouvir música criada por mim é ouvir um Alentejo positivo, contemplativo, sonhador e criativo.

 

Estar no Alentejo alguma vez representou um constrangimento para o cimentar da carreira?Diria que antes sim, mas agora não. Ultimamente realizo em média cerca de 15 a 20 espetáculos por ano e muito raramente toco em Beja. No passado acontecia o inverso, ou seja, os espetáculos aconteciam maioritariamente em Beja e arredores. Nunca imaginei tocar de Bragança a Faro praticamente todos os anos. É o reflexo de que a música não tem barreiras e que aquilo que fazes é muitas vezes apreciado por pessoas que nem sequer conheces, que são de longe, mas que te seguem, que vão aos teus espetáculos e que te convidam a tocar por todo o país.

 

E momentos inusitados experimentados ao longo do percurso artístico?Tantos. Em milhares de quilómetros de estrada, de norte a sul, existem sempre coisas caricatas. Mas entre muitos momentos, destaco dois: estava a tocar num festival de dança e o público dançava tanto e saltava tanto, que o vestido de uma jovem caiu e a mesma continuou a dançar como se nada fosse; num outro concerto tocava numa cavalariça antiga, com eletricidade através de um gerador a gasolina, que a meio do concerto parou. A banda deixou de se ouvir e a luz tornou-se inexistente. Mas eis que alguém se lembrou da causa, e foi lá colocar mais combustível, e assim prosseguimos com o espetáculo.

 

Quais os sonhos artísticos que moram em Alexandre Catarino?Continuar a criar música, a pisar muitos palcos, a editar discos e videoclips, a percorrer quilómetros para fazer mais noites de espetáculos e realizar uma mega tour europeia e mundial.

 

O que está na manga?Neste momento estamos a produzir e a gravar o próximo CD dos Malino, assim como, encontra-se em preparação o novo ano de espetáculos.

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