Texto Rodrigo Ramos
Tim Marshall é um jornalista britânico, especialista em negócios estrangeiros e diplomacia internacional. No seu currículo contam-se alguns dos meios de informação mais relevantes da sociedade moderna, como o The Times, o The Guardian, o The Independent, o Daily Telegraph e o The Sunday Times. Para além destes, foi editor da SkyNews.
Esteve presente em doze conflitos armados, de entre os quais se destacam as guerras dos Balcãs, que fragmentaram a Jugoslávia e dela fizeram nascer a Sérvia, a Croácia, Montenegro, a Bósnia e Herzegovina, a Macedónia e a Eslovénia; foi também correspondente em Belgrado, durante a crise do Kosovo e, mais tarde, em Jerusalém, onde testemunhou a retirada de Israel da faixa de Gaza.
Marcou ainda presença no Afeganistão, no Iraque, no Líbano e Síria. Foi o último jornalista a entrevistar a primeira-ministra paquistanesa Benazir Bhutto, antes do regresso do exílio e consequente assassinato.
Não é de espantar que Tim Marshall possua impressionantes conhecimentos de geopolítica mundial. Este seu livro, Prisioneiros da Geografia, toma como escopo narrativo o impacto da geografia no processo de decisão de muitos líderes políticos mundiais.
Tim analisa as linhas fronteiriças dos EUA, da Rússia, da China, da Europa, da África, da América do Sul, do Médio Oriente e do Árctico para dar a ver como a geografia moldou o desenvolvimento socioeconómico desses países ou regiões.
A partir desse enquadramento, Tim Marshall identifica as razões que motivaram conflitos passados e antevê a possibilidade de novos conflitos ainda por inventar (publicado inicialmente em 2015, o livro não deixa de nos causar surpresa, quando nos damos conta do número de conflitos antecipados que se vieram a verificar, seja nos termos propostos por Tim ou com algumas nuances).
Parecerá porventura demasiado determinista o entendimento da geografia enquanto um agente modelador – e uma variável independente – das consequências socioeconómicas de um país ou de uma região.
No entanto, uma leitura interessada acolherá com um certo grau de plausibilidade os argumentos que sustentam que o desenvolvimento da Europa e dos EUA se deve à circunstância de ambas as regiões serem atravessadas por uma infinidade de rios navegáveis, fundamentais para as trocas comerciais e desenvolvimento militar; por contraste, na América Latina e em África ocorreu precisamente o inverso: embora sejam regiões providas de muitos rios, estes atiram-se para abismos profundos, na forma de grandes cascatas, enredam-se em emaranhados de selva, são abrigo de agentes patogénicos causadores, de doenças, entre outros impedimentos que não permitiram o desenvolvimento dessas regiões.
No mesmo sentido, explica-se por que motivo a Rússia, com uma extensão incalculável de terreno, procurou expandir-se para Ocidente (se o actual conflito na Ucrânia é ainda motivado por uma propensão expansionista ou se, pelo contrário, advém de uma necessidade preventiva de defesa, em face da presença cada vez mais próxima da NATO, é uma análise que Tim reserva para outras leituras).
O lado Oriental da Rússia é gelado e, por isso, pouco convidativo ao crescimento populacional. Assim deserto e gelado, serve de tampão natural contra possíveis invasões, dado que um qualquer exército invasor teria de marchar por gelo e neve (ou sobrevoar esses milhares de quilómetros), dependendo de linhas de fornecimento de manutenção pouco credível.
Prisioneiros da Geografia tem o potencial para acicatar a ira de muitos académicos, particularmente os especialistas em relações internacionais, mais tendentes a sobrevalorizar outros agentes mais importantes e proactivos para a globalização do que os líderes políticos de um determinado país ou região (parecenos, por exemplo, válida a assunção de que a cultura juvenil, associada ao desenvolvimento tecnológico, pode ultrapassar muitas barreiras determinadas pela geografia, como se viu pela onda revolucionária de manifestações que alastrou pelo Médio Oriente e Norte de África na segunda década deste século e que ficou conhecida como a Primavera Árabe).
No entanto, o princípio orientador que norteia o livro, segundo o qual a política internacional tem sido determinada por uma dinâmica geográfica, não é desprovido de sentido. Análises interculturais ajudam-nos sempre a compreender melhor tanto o outro como a nós e consciencializam-nos de que nós somos o outro do outro.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia