Diário do Alentejo

Júlio Jorge: "A minha pintura é figurativa e caracteriza-se por um grande realismo e minúcia"

07 de agosto 2022 - 13:00
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Júlio Jorge nasceu em Montemor-o-Novo há 63 anos, mas foi criado em São Cristóvão, uma pequena aldeia a cerca de 20 quilómetros da sede de concelho. Sonhou ser artista ainda em tenra idade, mas tornou-se militar de carreira durante 30 anos.

 

Um percurso profissional que lhe adiou o sonho, mas que não o castrou, e, desde há 25 anos, que utiliza a aguarela como técnica para se expressar artisticamente, sendo que, nos últimos 11 anos o faz em regime de exclusividade. Uma exclusividade que lhe permitiu internacionalizar-se, levar a sua arte a vários continentes e ganhar prémios dentro e fora de portas.

 

O pintor aguarelista e autodidata Júlio Jorge já viu as suas obras distinguidas, para além de Portugal, em França, Grécia, Espanha, Itália, Paquistão, Malásia e Estados Unidos da América.

 

É sócio e membro fundador da Aapor – Associação de Aguarela de Portugal, e, em 2020, assume a presidência desta entidade. Desde o ano de 2017 que é team leader por Portugal para o evento FabrianoinAcquarello e conta no seu histórico com vários artigos publicados em revistas internacionais da especialidade.

 

Ei-lo na primeira pessoa.

 

Texto Luís Miguel Ricardo

 

Como pode ser definida a arte pictórica de Júlio Jorge?A minha pintura é figurativa e caracteriza-se por um grande realismo e minúcia.

 

Quando e como foi descoberta a vocação para a pintura?Desenho desde que me conheço como gente. Lembro-me de, por voltas dos cinco ou seis anos, ter pedido às minhas tias para me oferecerem uma caixa de lápis de cor. No entanto, nem sempre conseguimos concretizar os nossos desejos no imediato, e as circunstâncias da vida levaram-me a seguir um percurso bastante diferente daquele que eu tinha imaginado. Contudo, o sonho nunca morreu e cá estou eu a alimentá-lo.

 

Que influências estão na génese do pintor Júlio Jorge?Na pintura, sofri várias influências e, como gosto muito de retrato e da figura humana, destaco pintores como Lucien Freud, Gotfried Hellnwein, Istvan Sandorfi, Lita Cabellut e os grandes Mestres da Pintura Flamenga como Vermeer, Rembrandt, entre outros.

 

Em alguma altura do trajeto artístico foi explorada outra forma de arte para além da pintura?Não, nunca tive essa curiosidade. A pintura preenche-me inteiramente e o facto de fazer aguarela já é por si um desafio constante.

 

Que papel desempenha o Alentejo na arte de Júlio Jorge?Apesar de ter nascido no Alentejo e de ser um apaixonado pela minha região, talvez pelo caráter da minha pintura, não encontro o que quer que seja no meu trabalho que se relacione com os temas, normalmente, associados ao Alentejo. Pinto essencialmente retrato, e as pessoas que pinto, embora sejam alentejanas, poderiam ser de qualquer região do país.

 

Do trabalho desenvolvido ao longo da carreira, algum que tenha sido mais marcante?A série de retratos que iniciei em 2010, a que dei o nome “Olhem para nós, porque nós não somos invisíveis”, e que retrata os mais idosos e pretende chamar a atenção para a solidão em que a maior parte destas pessoas vive.

 

Como são identificados os temas alvo de criação?Normalmente tento abordar temas de cariz social e temas de cariz patrimonial. Em ambos os casos pretendo chamar a atenção dos responsáveis para estas questões. No caso dos retratos, como já referi, gostaria de que quem tem responsabilidades sociais, se sensibilizasse mais com a solidão e o abandono em que muitos idosos vivem. No caso da série que iniciei recentemente, a que dei o nome “As árvores mutiladas”, pretendo chamar a atenção para o facto de se estarem a arrancar árvores, algumas milenares, neste caso, oliveiras, sem qualquer preocupação com a preservação do nosso património.

 

Quais os principais destinos das obras de Júlio Jorge?As minhas obras encontram-se em várias coleções privadas e institucionais, em países como Portugal, Estados Unidos da América, China, Alemanha, Paquistão, Inglaterra, Holanda, Bélgica, Espanha, Itália e Canadá.

 

Alguma vivência inusitada ao longo do percurso artístico?Relembro-me de uma história engraçada, em 2015, aquando de uma exposição coletiva no Museu de Évora. Durante a inauguração, fui abordado por um senhor que disse que estava a pensar adquirir um dos meus trabalhos em exposição, porque a pessoa retratada era uma senhora de Terena, que ele conhecia muito bem e gostaria de lhe oferecer o retrato como presente de Natal. Acontece, porém, que a pessoa retratada era minha tia e é de São Cristóvão. O senhor, na altura, não aceitou muito bem o que lhe disse e saiu um pouco aborrecido e não totalmente convencido.

 

Qual a opinião sobre o estado da arte da «pintura» em Portugal e no Alentejo?Conheço gente nova a fazer coisas muito boas e muito válidas, mas, infelizmente, o estado da arte no Alentejo reflete o estado da arte no nosso país. As autoridades competentes dão pouca atenção a quem quer fazer da arte o seu modo de vida. A exceção vai para alguns lobbies bem instalados, normalmente com ligações políticas, que têm todo o apoio e que absorvem quase a totalidade dos recursos.

 

O que está na “manga” a curto e a médio prazo?Neste momento estou a desenvolver o meu projeto das árvores mutiladas. A curto prazo pretendo fazer uma grande exposição, antológica, que envolva os meus últimos 12 anos de trabalho. Em paralelo, estou também a desenvolver um projeto de aguarelas sobre dança contemporânea.

 

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