Diário do Alentejo

Saiming: "“ ‘AMI I DI LÁ’ retrata a emigração de toda a comunidade guineense na diáspora”

12 de maio 2022 - 11:30

Saiming nasceu em Cátio, região sul da Guiné-Bissau, há 25 anos, mas está radicado em Portugal desde o ano de 2012 e a residir em Beja há dois anos. O seu percurso no universo da música começou ainda na capital do seu país de origem, em Bissau, quando aos 13 anos participou em vários concursos da área.

 

A sua chegada a Portugal ficou marcada pela formação da dupla "Saiming & Junnex", uma banda onde emergiam músicas originais em estilo Hip-Hop, R&B, kizomba e Afro. Mais tarde, seguiu a carreira a solo num estilo mais Afro acústico, criando originais e dando voz às músicas guineenses de outras épocas. Uma opção de carreira que, em 2017, lhe valeu o convite para atuar na Gala de Miss Guiné-Bissau Portugal, que se realizou no Tivoli, em Lisboa. Uma participação repetida no ano seguinte, no teatro Politeama. Em 2019 foi eleito Artista Revelação Guineense, pela Best of Guiné-Bissau Awards, na categoria de música. Ao longo da carreira, já marcou presença em eventos diversos, com destaque para:  a festa da interculturalidade Saberes e Sabores, no Seixal; Festivais nos Bairros; Festival de Telheiras; e em Santarém, no aniversário dos Bombeiros Voluntários de Pernes.

 

Contudo, foi por terras alentejanas que deu início ao seu novo desafio musical – fazer a fusão da música afro, acústica em banda com músicos de características Rock. Uma experiência que, de acordo com Saiming, apresenta resultados fantásticos e que em breve serão do conhecimento público.

 

Para além da música, o futebol é outra das paixões de Saiming, ocupando a posição de Guarda-Redes e atuando na primeira divisão distrital de Beja, na ACD Penedo Gordo. Para trás, no seu histórico futebolístico, ficaram equipas como Águias da Musgueira (juniores), Águias de Camarate (juniores), Clube Atlético Cultural (seniores), Águias de Camarate (seniores 2 épocas), CD Olivais e Moscavide - Parque das Nações (seniores), Sobral de Monte Agraço (seniores), Águias de Camarate (seniores) e Despertar Sporting Clube (seniores 2 épocas).

 

A sua atividade profissional é desenvolvida na área social, na qual já leva sete anos de experiência. Em Beja, desempenha as funções de monitor no Projeto Shave-E8G, pertencente ao Programa Escolhas, onde é responsável por atividades que trabalham a inclusão social, de que são exemplos a Oficina de Futebol de Rua, Sala de Estudo Comunitário, entre outros, referindo fazer uso da sua arte para trabalhar e motivar os jovens. 

 

Texto Luís Miguel Ricardo

 

Como te caracterizas enquanto músico?

Um artista versátil capaz de se adaptar a vários estilos musicais, mas com mais destaque para músicas românticas acústicas, afro, quizomba e R&B.

 

Quando e como o gosto pela música começou a ganhar protagonismo?

Dei os primeiros passos na música ainda na capital Bissau, quando frequentava o 1º ciclo da escola. E a paixão começou com as professoras portuguesas que estavam em Bissau a fazer voluntariado e que ensinavam músicas do "Cante Alentejano" e outras músicas populares portuguesas. Aos 13 anos comecei a participar em concursos musicais e fui evoluindo até gravar a primeira música original em grupo, na altura, num estilo hip hop e a cantar rap.

 

Quem são as referências musicais de Saiming?

Eu tenho várias referências, mas destaco a dupla brasileira Leandro e Leonardo, Anselmo Ralph e José Carlos Schwarz.

 

Dos trabalhos realizados algum que justifique destacar?

Estou a lançar um EP com 6 faixas musicais, cada faixa com o seu videoclipe. Devido a questões financeiras, não consegui ainda terminar tudo, mas já estão disponíveis três faixas no Youtube. Queria destacar a faixa "AMI I DI LÁ" (Eu sou de lá). Este tema é uma das faixas do meu 1º EP – CELEBRAÇÃO - e retrata os meus 10 anos de emigração e de toda a comunidade guineense na diáspora, que partilha do mesmo sentimento de regressar a casa e reencontrar a família, os amigos, depois de terem partido em busca de um sonho ou de melhores condições de vida. É um bocadinho a minha história contada na música e no videoclipe.

 

Como surge o repertório nos projetos musicais de Saiming?

Normalmente sou eu que escrevo e faço composições das minhas canções originais, mas com banda tocamos alguns covers, onde pegamos em músicas clássicas da Guiné-Bissau e damos outra "roupagem" com uma fusão entre Afro e Rock. Eu também toco guitarra, o que faz com que esteja sempre a criar músicas e a escrever letras. Também já cantei uma música que foi escrita pelo meu ex-colega da dupla, o "Junnex". Foi ele também quem escreveu uma parte da letra da música "Confissão", que atualmente tocamos em banda e à qual demos uma outra "roupagem", e eu apenas acrescentei parte da letra e o refrão.

 

Sendo natural da Guiné-Bissau, como vens desaguar ao Alentejo?

Eu vim parar a Beja, porque conheci uma pessoa com quem decidi partilhar a vida na altura e também porque precisava de um novo desafio e de mudança de ares. O facto de ter conseguido um emprego em Castro Verde, numa casa de acolhimento, poder seguir a carreira futebolística e ter qualidade de vida, também contribuíram bastante para esta mudança. Infelizmente, não segui com a pessoa, mas decidi ficar e fazer a vida em Beja.

 

Que papel desempenha o Alentejo nos projetos artísticos de Saiming?

Neste momento, o Alentejo desempenha um papel fundamental nos meus projetos artísticos, uma vez que tenho a banda cá. 

 

Estando tu na pátria do cante coral consegues equacionar uma fusão entre a tua música e o cante alentejano?

Foi das primeiras coisas em que pensei e até cheguei a contactar com algumas pessoas que fazem parte dos grupos de cante alentejano para fazer uma fusão, mas, na altura, sem sucesso. Atualmente tenho essa ideia na cabeça, mas falta encontrar alguém que alinhe nisso.

 

Que diferenças, em termos de oportunidades artísticas, encontras entre o “lá” e o “cá”?

No meu país sinto que não tenho muitas oportunidades, nem reconhecimento a nível interno. Penso que seja pelo facto de estar a viver fora e conhecer poucas pessoas que me possam ajudar na divulgação. Na diáspora, atualmente, já sinto que tenho tido mais reconhecimento e mais pessoas a seguirem o meu trabalho, devido aos concertos recentes que fiz. No Alentejo, sinto que as pessoas valorizam mais esse meu lado artístico, quer sejam portuguesas ou a comunidade imigrante, embora ainda não tenha tido muitos concertos por cá.

 

Alguma situação inusitada experimentada durante o percurso artístico?

O momento mais curioso que me vem logo à cabeça foi ter ido cantar a uma discoteca em Lisboa e, no final, quando achei que ninguém tinha gostado, apareceu a organizadora da gala de Miss Guiné-Bissau Portugal, que me perguntou se eu era guineense, dizendo que não me conhecia e que queria convidar-me para atuar na gala, e, sem eu nada pedir, ofereceu-me um cachet. Foi o meu primeiro cachet.

 

Como tem sido vivido este período de “stand by” no mundo?

Durante este tempo fui fazendo a música como passatempo e esperando o surgimento de convites para concertos, para poder ganhar alguma coisa e gravar músicas novas. 

 

Quais os sonhos artísticos que moram em Saiming?

Neste momento, é conseguir fazer um hit que todo o "Portugal" possa vir a cantar.

 

E o que está na manga?

Atualmente estou-me preparando para lançar as três novas músicas e tenho planos de fazer um concerto em nome próprio.

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