Diário do Alentejo

Crónica de Vanessa Schnitzer: "Desafios da existência"

22 de dezembro 2021 - 14:40

“Neste momento em que parecemos viver numa idade média, torna-se fundamental encontrar a Luz. Viver é arte de persistir, resistir as intempéries da vida, superar as provações do dia a dia, sobreviver” (Roberto de Faria de Gusmão).

 

E neste contexto pandémico-depressivo ameaçado pela insegurança, em que cada ser corre o risco de cair numa armadilha ao virar da esquina, iludimo-nos com uma espécie de ideal pós pandémico, que nos daria um novo mundo, mais solidário, mais humano, ambientalmente mais favorável. Desenganemo-nos. Mergulhamos num mundo distópico, que se encontra no auge da pós-modernidade dominada pela apologia do tecnológico, em que as oportunidades mascaram os oportunismos de toda a espécie. A vida do ser humano passa a ser totalmente devassada e manipulável, estando à mercê do interesse dos oligopólios.

 

Num mundo em ruínas em que as utopias, a religiosidade e as ilusões humanistas naufragam, o ser humano tem de voltar a encontrar um sentido para a existência. Urge encontrar o caminho que nos leve de novo a um santuário, um lugar onde a vida não seja irreversível, onde exista a possibilidade de voltar à estaca zero e iniciar de novo o processo, renascer. Um lugar onde a pessoa se permita subtrair da ditadura das utilidades e do digital e possa voltar aos sentidos.

 

A grande ameaça que paira sobre as nossas cabeças em pleno século XXI, segundo Ana Maria Jorge, diretora da Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa, não serão as patologias virais mas as neuronais, naquilo que o heterónimo de Fernando Pessoa, Álvaro de Campos, atribuiu ao Homem contemporâneo no poema “Estou cansado”.

 

O Homem de hoje está mais frágil, mais vulnerável e está isento de mecanismos para cuidar de si mesmo. Perdidos nesta selva entrelaçada, urge encontrarmos o caminho que nos faça regressar a nós mesmos, para assim resgatarmos o valor das pequenas coisas, como o inestimável valor da amizade, que sustenta o sentido da nossa jornada. Com amigos, jamais seremos pobres. Como diria Fernando Pessoa: “Os velhos amigos são como os velhos vinhos, são os melhores”. E quando na companhia de ambos, somos afortunados e resistimos melhor aos desafios deste tempo.

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