Manuel Amado está representado com “Janela Aberta II”, uma obra datada de 1989, onde a sua formação em arquitetura é marcadamente notória: “A janela, possibilidade de ligação entre espaços diferentes, entre sombra e luz, interior e exterior, jogo de linhas estruturais com uma estética sedutora”. A luz como a sombra e o silêncio dos espaços desabitados, interior e exterior, recantos e divisões são recorrentes nos seus quadros, numa pintura que se lhe reconhece muito própria, refere fonte do Novo Banco Cultura.
De Roberto Chichorro, único artista vivo deste grupo cujas obras estão patentes no Museu de Barrancos, pode ser apreciado um quadro sem título que evoca um mundo “de cores vivas, do azul-turquesa à cor de laranja”, povoado de pássaros, gaiolas e uma figura humana. “A sua obra, ancorada nas memórias do seu universo moçambicano e no conhecimento da pintura europeia, é uma narrativa poética de histórias imaginadas entre uma infância africana e a descoberta de pintura de Mondrian, Malevitch ou Chagal”.
Luís Noronha da Costa, artista plástico considerado percursor de arte contemporânea, também estudou e exerceu arquitetura. Mas, simultaneamente, na mesma época (década de 60 do século passado), iniciou uma carreira brilhante na pintura. O uso da pistola de ‘spray’ deu uma marca diferenciada às suas obras. Nesta mostra permanente, apresenta uma sem título.
Da obra, também sem título, de Francisco Relógio, diz-se descobrir “reminiscências do grafismo de Fernand Léger, ou das arquiteturas imaginárias de Maurits Escher, visíveis no desenho de janelas sobrepostas que” compõe o cabelo da figura. A tendência ou gosto ‘pop art’ é observável “na sinalética integrada na composição”, conjugando-se com o “universo de origem, expresso no apontamento da paisagem alentejana e na paleta cromática de ocre e amarelos”.
A ARTE REFLETE A VIDA
Dos artistas contemporâneos com trabalhos expostos no Museu de Barrancos, Francisco Relógio é o único nascido no Baixo Alentejo. Francisco Pedro Relógio, nasceu em 1926 em Vila Verde de Ficalho, terra-fronteira no concelho de Serpa. Com apenas 13 anos fixa residência em Lisboa, indo estudar para a Escola Industrial Fonseca Benevides. Estávamos em 1939. No país vizinho chegava ao fim a Guerra Civil, não sem antes deixar as suas marcas no jovem português revelado artista, segundo ele próprio afirmou em entrevista à televisão pública (RTP 1), em 1978, num programa intitulado “Perfil”, de autoria de Alexandre O’Neill e Rui Brito, e realização de Jaime de Brito. Acrescentava ainda a propósito: “Penso que no meu trabalho, essas raízes que marcaram a minha adolescência estão presentes, denunciando a tragédia que os meus olhos viram”.
Francisco Relógio inicia a carreira nas artes em finais dos anos 40, passando por uma fase ligada ao movimento neorrealista – da pintura mural figurativa de grandes proporções. Mais tarde irá enveredar por uma linha identificada com o surrealismo. Diz-se que teria um “traço muito próprio, com inspiração provável nas pinturas astecas”, sendo essencialmente “um grande desenhador”. O historiador e crítico de arte José Augusto França escreve que, as suas figuras, “encadeadas numa obsessiva ocupação do espaço, podem jogar decorativamente em grandes superfícies, com efeitos ilusórios por vezes curiosos, num gosto estabelecido entre a ‘arte nova’ e a ‘pop’ arte’”.
Nos anos 50, a pintura e o desenho do artista baixo-alentejano vão definir-se por “construções” frequentemente “labirínticas, povoadas de figuras estilizadas, que ocupam todo o espaço”. Em “A Arte em Portugal no século XX,” o crítico de arte defende que as obras de Francisco Relógio “revelam também, a nível de formulação gráfica, influências de [Jules] Fernand Léger [pintor francês que se distingue como pintor e desenhador cubista], enquanto os conteúdos, nos levam para referências ligadas ao neorrealismo”. Criativo em diferentes áreas, em 1963, e já depois de ter recebido uma bolsa da Fundação Calouste Gulbenkian (de 1959 a 1961), “começa a trabalhar em murais e no estudo das técnicas de azulejo”, realizando painéis de mosaico para várias entidades de norte a sul do país. Em Lisboa, podem ser encontrados vários, mas o mais conhecido é o que está no edifício do Banco Nacional Ultramarino em Maputo, capital de Moçambique. Os murais encontram-se em diversos espaços públicos e privados.