Diário do Alentejo

“Não há qualquer política, em Beja, para as artes plásticas”

04 de setembro 2020 - 19:30

Contador de histórias, humorista e promotor do livro e da leitura, percorre o país divulgando contos de tradição oral em contextos escolares, bibliotecas, festivais de teatro, feiras do livro. Como narrador já atuou na Argentina, Uruguai, Cabo Verde, Espanha, Macau, Suíça e Luxemburgo. Como humorista conta com centenas de espetáculos apresentados em televisão, auditórios, empresas, centros culturais e festivais. É autor de diversos livros de poesia, romance, infanto-juvenis. É membro do coletivo musical grupo Tais Quais.

 

A Galeria de Arte do Casino Estoril acolhe, até 15 de setembro, o 40.º Salão Internacional de Pintura Naif, considerado o mais antigo do mundo e uma referência desta modalidade pictórica. Jorge serafim apresenta-se, estreante, como um dos artistas plásticos presentes.

 

O que sentiu ao ser convidado para esta emblemática exposição?

Quando recebi o telefonema do diretor da Galeria de Arte do Casino do Estoril, Pedro Carvalho, fiquei felicíssimo. Devo esta oportunidade ao meu amigo, e grande pintor naif, Bento Sargento, de Ficalho. Foi ele que me encorajou a participar. A ele devo a perseverança em acreditar naquilo que eu faço, ao Pedro Carvalho o desafio.

 

Como apresenta as obras que tem patentes na exposição?

São quatro obras: duas referentes às ilustrações que fiz para o livro O Afinador de Memórias e as outras duas, a que chamei “Dom Quixote De La Ansiedade” I e II, já realizadas neste contexto pandémico. De certa forma complementam-se, pois se as primeiras foram elaboradas a partir de um texto, que é denúncia e consequência da perda da memória enquanto fator de preservação de um património físico e humano, as últimas são uma alegoria a uma sociedade que inventa inimigos imaginários, representados por moinhos, cujas velas são feitas a partir de caixas de Benuron. Como se a sociedade fosse movida a energia “ansiolítica”. É uma alusão ao ser humano que vive numa “analgesia” permanente, como que um sonhador amestrado.

 

Como se lhe revela o universo naif que arquiteta?

A partir da observação que faço das pessoas e, obviamente, da reflexão sobre o que me rodeia. Despido de regras e preconceitos, é uma libertação enorme criar algo surreal e onírico a partir da técnica da colagem e usando palavras como mensagens. Com jornais velhos, aguarelas, acrílicos, faturas e outros materiais do quotidiano, construo “vitrais” de palavras com forte teor interventivo e reflexivo.

 

Esta sua vertente de criação plástica, aliada a outras valências artísticas, é a confirmação de Jorge Serafim enquanto “homem dos sete instrumentos”?

É apenas a confirmação dos meus incómodos. Para estes desassossegos tenho de encontrar respostas, formas de os expressar, seja na escrita, nas artes plásticas, no humor, num palco ou no recanto do meu escritório.

 

Para quando uma exposição em Beja?

Não há qualquer política, em Beja, para as artes plásticas. Temos belíssimos artistas plásticos e fotógrafos, nascidos nesta terra, que não têm, aqui, um sítio para expor, perdendo-se assim a possibilidade de fortalecerem a relação umbilical com a cidade que os viu nascer. Os cidadãos também não exigem às entidades, não mexem uma palha pela cultura, preferindo os insultos do futebol. O que explica em parte, muitos dos ventos ansiolíticos que sopram na sociedade portuguesa. O verbo “amorfinar” existe e insiste.

Comentários