Diário do Alentejo

“Que não seja por isso…”

06 de outubro 2025 - 09:15
Teresa Fernandes (Cautchú/Odemira) é a primeira mulher a treinar uma equipa sénior masculina de andebol
Foto | Ricardo ZambujoFoto | Ricardo Zambujo

“O Cautchú refletiu sobre a possibilidade de formar uma equipa sénior com os miúdos que terminam a formação e com antigas glórias de outros tempos. Mas havia um problema. Não tinham treinador. E então é aí que eu apareço e digo: ‘Que não seja por isso…’. Eu irei convosco, acompanho-vos, distribuo o jogo, na presunção de que vocês também saberão o que estão na fazer”.

 

Texto e Foto | Firmino Paixão

 

A professora Teresa Fer-nandes nasceu em Odemira há 46 anos. Licenciou-se em Educação Física na Universidade do Algarve e daí em diante revelou uma invulgar disponibilidade para a prática desportiva. E mais do que disponibilidade, uma determinação e uma capacidade para enfrentar desafios. Em terra, na natureza que tanto aprecia, no rio ou no mar, pagaiando contra a ondulação da costa atlântica, e, agora, a fazer história numa modalidade em que já tinha sido pioneira no seu concelho, o andebol. Tudo começou ainda muito jovem, recorda. “Tive uma infância e uma adolescência desde logo muito ligada ao desporto, porque o meu pai era jogador do Odemirense e, por influência dele, comecei a gostar de desporto. Ainda muito pequena, comecei a fazer corridas nas comemorações do 25 de Abril em Odemira.

Antigamente faziam corridas com triciclos, depois passei a praticar atletismo, porque, nessa altura, a oferta não era muito variada, basicamente, para nós raparigas, só existia o atletismo e o futebol e, mais adiante, comecei a fazer canoagem no Clube Fluvial Odemirense, porque o meu irmão também andava lá a remar e eu fui atrás dele. Passei um bocadinho por tudo o que existia na altura que, basicamente, eram estas três modalidades”.

Os tempos de hoje são outros, vincou a “super atleta”: “Atualmente os jovens são uns afortunados por terem tanta oferta desportiva, mas foi também graças à nossa geração que o conseguiram. Mas eu cresci feliz, os meus pais conseguiram proporcionar-me tudo o que era necessário para que eu me sentisse feliz”.

Ora, quem nasce perto do mar, normalmente, aprende a nadar, admitiu: “Fui criada um bocadinho perto do mar, aprendi a nadar no rio Mira, um pouco por causa da canoagem, mas passava sempre os verões no Almograve. Entretanto terminei o 12.º ano e o meu pensamento estava só em ser professora de educação física. A minha mãe ainda me chateou, porque ela trabalhava no centro de saúde e quis influenciar-me a seguir para enfermagem, até porque tinha notas para isso. Ainda fiz os pré-requisitos mas na altura de preencher a papelada apontou tudo para a educação física”. E assim foi. Mas nós conhecemos Teresa Fernandes há uns bons anos, em Longueira, numa prova da Secção de BTT Os Duraizos, que venceu, à semelhança de muitas outras em que participou. “Nessa altura eu estava em alta.

 

Nesse ano conquistei tudo o que havia para conquistar ao nível do BTT. Salvo erro, estávamos em 2014, fui campeã nacional e venci a Taça de Portugal de Ciclismo de Estrada, nas disciplinas de fundo e contra-relógio, fui campeã nacional de maratonas em BTT e também em cross country, ou seja, arrasei tudo ao nível do meu escalão”.

O tempo mudou, surgiram outros desafios, mas a bicicleta ainda não está pendurada. “Não, de forma nenhuma, tenho uma grande paixão pelo BTT.

 

A bicicleta de estrada, sim, essa está pendurada. Tenho imenso medo, porque as nossas estradas estão cada vez mais degradadas e os condutores mais imprudentes”, por isso, deixou o lamento: “Conheci alguns colegas que, infelizmente, já cá não estão para contar as suas histórias de vida e tenho imenso medo. Essas coisas mexem muito com a nossa cabeça, sobretudo, quando temos filhos. Claro que no BTT também tudo pode acontecer, mas aquele contacto com a natureza é sempre diferente. Agora pratico apenas para desfrutar da modalidade e do meio ambiente. Mas ainda faço aqui as provas concelhias”.

A vida não para, nem a dinâmica de Teresa desacelera, e, mais recentemente, vimo-la num kayak, a pagaiar nas águas tranquilas do rio Mira. “A canoagem foi outra das paixões de criança e o Clube Fluvial Odemirense é um clube da minha terra, um clube do meu coração e eu ajudarei sempre o Fluvial em tudo aquilo que eu puder. Neste ano também fui campeã nacional de maratonas no escalão de masters em canoagem de mar. Em tudo aquilo que eu achar que ainda tenho capacidade de concretizar nunca olharei para trás, darei sempre um passo em frente. Porém, no último ano já não tenho feito canoagem. Começava a ser muita coisa e a idade já não perdoa”. Como a idade não perdoa, perdoe-nos Teresa a ironia, vai estrear-se oficialmente no Torneio de Abertura da Associação Regional de Andebol como treinadora da equipa sénior masculina do clube.

 

Serão duas estreias, a da equipa sénior masculina e a da sua treinadora, a primeira mulher a fazê-lo no distrito. Vai voltar a fazer história: “Não sei precisar se serei a primeira, mas já que o afirma, mas sinto que estou sempre do lado da história. Foi um desafio do clube. Existiam aqui miúdos que acabavam o seu percurso formativo e de progressão nos sub/18 e que não iriam ter continuidade competitiva”.

Quanto aos objetivos para a temporada, deixou claro: “Para já ainda não são muito ambiciosos. Tudo tem um princípio. Mais adiante logo veremos. É evidente que para criarmos uma equipa sénior temos de ser ambiciosos, mas temos de dar tempo ao tempo, a ideia do clube passa pela formação e pela progressão entre escalões. Para já sentimos que isso dará visibilidade ao clube e que os atletas desta equipa, que são treinadores da formação, estarão a dar o seu exemplo aos mais jovens e a garantir uma perspetiva de continuidade no clube aos que acabem o seu percurso formativo. Mas a ambição está cá”.

Comentários