Paulo Guerra, coordenador do Programa Nacional de Marcha e Corrida, do Instituto Português do Desporto e Juventude, deixou uma pertinente mensagem: “O desporto e a atividade física devem ser encarados como um bem essencial. Não como um sacrifício. Queremos que a população saia do sofá e se torne ativa, para termos mais saúde, física e mental”.
Texto Firmino Paixão
O antigo atleta Paulo Guerra, de 54 anos, natural de Barrancos, cinco vezes campeão da Europa de corta-mato, atual vice-presidente da Federação Portuguesa de Atletismo (FPA), eleito há cerca de oito meses nos órgãos sociais dirigidos pelo também ex-atleta Domingos Castro, privilegia a proximidade com o interior e com as regiões de menor densidade populacional para descentralização das grandes provas nacionais da modalidade. Em entrevista exclusiva ao “Diário do Alentejo”, Paulo Guerra deu como exemplo a realização, já no mandato deste direção, do corta-mato curto, em Marvão, e do Torneio Nacional Atleta Completo, em Beja, cidade aonde o atletismo nacional regressará nos dias 28 e 29 de junho, com a organização dos campeonatos nacionais de sub/18.
Tínhamos uma justificada esperança de que, tendo um alentejano nos órgãos sociais da FPA, ele fizesse acontecer alguma coisa no nosso território…
Sem sombra de dúvida, é óbvio, que assim deveria ser, e assim foi sempre a minha intenção. Ao longo destes poucos meses que temos na direção da FPA tentei alertar e incentivar, nomeadamente, o presidente, Domingos Castro, para que não se esquecessem deste nosso recanto. Conseguimos trazer o Campeonato Nacional de Corta-Mato para Marvão, também a última edição do Torneio Atleta Completo para Beja, onde regressaremos no final de junho com os campeonatos nacionais de sub/18. Obviamente que fiquei muito feliz, porque a nossa região, o nosso querido Alentejo, também faz parte do calendário nacional federativo.
Certamente que têm contado com o apoio das entidades institucionais…
Sim. Temos de deixar uma palavra de reconhecimento por compreenderem esta grande paixão que nós sentimos pela modalidade. Assim queremos que continue, ou seja, que grandes eventos de atletismo ao nível nacional tenham também o selo do nosso Alentejo. Até para a dinamização da modalidade e para o incentivo dos mais jovens em todos os recantos do nosso país, para que tenham as mesmas possibilidades de verem e de sentirem essa paixão pelo atletismo. Os eventos são extremamente importantes e, por isso, acreditamos que, ao longo dos quatro anos de mandato, iremos diversificar a localização dos eventos nacionais, não só por regiões do País com mais recursos mas, também, pelas regiões menos favorecidas.
A presença dos mais altos dirigentes federativos, nos eventos, também deixa um sinal de proximidade?
Logo desde o primeiro momento em que decidimos abraçar o desafio de nos candidatarmos aos órgãos sociais da FPA vimos que essa proximidade era imprescindível. Nós somos gente do interior, temos isso nos genes. Somos pessoas do campo, não somos “meninos de escritório”. Se existe a possibilidade de estarmos presentes nos eventos, de estarmos próximo das pessoas e estarmos onde as coisas acontecem, então fazemos, como costuma dizer-se, “das tripas coração”, mesmo em prejuízo, às vezes, da vida familiar, e, sim, estamos presentes. Porque é com a presença, com o diálogo, com o face to face, com todos os intervenientes desta bonita modalidade, que conseguiremos aquilatar onde poderão estar, verdadeiramente, os problemas e, em conjunto, delinearmos estratégias para melhorarmos o atletismo português, esta modalidade que é pioneira em vários campos e que tem perdido um bocadinho o comboio para outras modalidades que estão mais na moda, que são mais fáceis, às quais, possivelmente, as redes sociais dão mais destaque. Se todos trabalharmos um pouco em conjunto, acreditamos que o atletismo regressará, de novo, ao pelotão da frente como modalidade desportiva.
O que tem feito a direção nestes oito meses que já levam de mandato?
Queremos estar sempre mais presentes. Queremos dar a maior visibilidade à marca atletismo, que é uma marca com uma dimensão enorme e um grande prestígio. Naturalmente, não nos vamos comparar com o futebol, não temos essa pretensão, pois, em termos de títulos, somos superiores. Agora, em termos de dimensão queremos estar cada vez mais perto dessa modalidade mítica que é o futebol. Mas, para isso, devem contribuir os canais de comunicação, de divulgação, de publicidade, de incentivo e de captação, não só do público, como também, obviamente, de praticantes mais jovens, atrás de quem as suas famílias acabarão por vir. Acreditamos que voltaremos a estar um pouco mais nesse pelotão da frente. Os jovens nunca estiveram tão presos a esse mundo tecnológico que os retira das modalidades desportivas, que faz com que, cada vez mais, as amizades sejam virtuais e não reais, que as brincadeiras do peão, da corrida, do lançamento da pedra deixaram de existir, agora os jogos são todos virtuais. Se não existir um grande esforço coletivo o desporto será cada vez mais sedentário.
Será por isso que, atualmente, não se veem novas versões de Carlos Lopes, de Mamede, dos gémeos Castro, de Paulo Guerra, de Rosa Mota ou de Fernanda Ribeiro, entre outros?
Na verdade, há uns anos houve uma certa travessia do deserto desta modalidade. Mas também é verdade que, nestes últimos anos, naturalmente, fruto do trabalho da antiga direção federativa e de todos os que trabalharam diretamente com esses órgãos sociais, estamos agora verificando que há algum tempo que não tínhamos tão bons resultados, marcas, recordes pessoais, recordes nacionais, em termos de meio-fundo e fundo, como estão a surgir. Um atleta para fazer esses registos não precisa de um ano nem dois, é um trabalho que já vem de trás, por isso, estamos a percorrer um caminho que, em face dos resultados que estamos a verificar nos sub/20 e sub/23, nos faz acreditar que voltaremos a ter atletas lá na frente. Não vamos dizer que vão lutar por medalhas, porque o atletismo hoje é diferente de há 10 anos. Nunca foi tão difícil conquistar medalhas como agora. Muitos dos países europeus estão naturalizando atletas oriundos do Quénia e da Etiópia. Mas poderemos estar entre as principais cinco seleções da Europa e é isso que queremos para o nosso atletismo.