Diário do Alentejo

Edgar Matias foi campeão da Europa de masters e terceiro classificado no mundial

13 de agosto 2023 - 13:00
A sofrer e a sorrir…
Foto | Firmino PaixãoFoto | Firmino Paixão

“A corrida liberta-me”. Este é o lema do super atleta melidense Edgar Matias, campeão europeu em masters 40, individual e por equipas, vice-campeão europeu em veteranos absolutos, terceiro classificado no campeonato do mundo de masters 40 e oitavo classificado em absolutos.

 

Texto Firmino Paixão

 

E já não é coisa pouca. Mas o palmarés deste atleta, de 44 anos, do Grupo Desportivo de São Francisco da Serra, que também já representou o Grupo Desportivo e Cultural do Portos de Sines e do Algarve, vai muito para além destas duas participações em competições internacionais.

 

São, aliás, inúmeros os triunfos, e os pódios, conquistados, amiudadamente, noutras provas que valoriza com a sua presença.

 

Os triunfos nunca são exclusivamente seus, partilha-os, invariavelmente, com a família, com o treinador, Rui Dolores, e com a enorme e entusiástica franja de amigos que mobiliza à sua volta, dedicação que retribui com enorme simpatia. Aliás, essa é uma característica que o define. Sofre com a dureza dos desafios, mas sorri perante as dificuldades que enfrenta.

 

Edgar Matias também é um atleta solidário. Há cerca de três anos, também no início de um tórrido mês de agosto, lançou-se numa aventura solidária: correr, a sós, os 65,2 quilómetros que separam a praia do Canto do Mosqueiro, na costa norte de Sines, da marina de Troia, com o intuito de angariar fundos a para o Lar de Idosos da Casa do Povo de Melides. Quase seis horas de sofrimento, pelas areias douradas da costa atlântica. Sofreu, sofreu bastante, mas, no final, sorriu de felicidade perante o sucesso da aventura. Um areal que é, tão só, “a passadeira vermelha” da sua enorme dedicação à corrida.

 

“Sou natural de Melides, como tal, qualquer cantinho desta costa diz-me sempre alguma coisa. Esta costa atlântica diz-me muito, é a minha zona, estou com a minha gente, as minhas pessoas, sinto sempre um prazer enorme em ter a família presente, os amigos também, e isso deixa-me profundamente grato”.

 

Corre em estrada, em areia e faz trail. Um atleta multidisciplinar que quase não consegue definir qual é a “sua praia” (sem ser a de Melides, porque essa está-lhe no coração). “Gosto, essencialmente, de correr. É essa a minha paixão. Ainda assim, confesso que a corrida em estrada e, principalmente, a distância de maratona são as minhas provas favoritas”.

 

O passado recente da carreira do atleta melidense tem sido marcado por constantes subidas ao pódio, um percurso glorioso, digamos.

 

“Tem sido um percurso marcado por algumas vitórias, das quais destaco a minha participação no Campeonato Europeu de Maratona em Masters 40, uma competição que decorreu no Funchal e onde conquistei o título europeu e, mais adiante, fui à Polónia disputar o mundial da mesma categoria e classifiquei-me no terceiro lugar. Foram duas participações que muito me orgulham, pela sua relevância, e atendendo à insuficiência de apoios que nós temos, em comparação com comitivas de outros países”, lamentou.

 

“No atletismo master conseguem-se coisas incríveis, temos muitos bons atletas, mas é pena que o apoio não seja maior. Temos excelentes atletas no nosso país e só não conseguimos resultados mais brilhantes, muitas vezes, por falta de apoios”. Duas deslocações que, estamos a ver, lhe terão saído do bolso: “Claro, também saiu do meu bolso, mas quem corre por gosto não cansa. Mas também sou sincero, ainda nunca tentei trabalhar muito esse aspeto dos patrocinadores, mas, no futuro, terei de fazer alguma coisa por isso”.

 

Um título europeu e um terceiro mundial são performances que não se adquirem de um dia para o outro. Edgar começou a correr tarde, em 2017, mas está a chegar lá primeiro que muitos outros. Qual é a receita?

 

“Muita resiliência, muita humildade, muita entrega, treinos diários e um grande apoio da família, são aquelas coisas que ninguém vê mas que só nós é que sentimos. É, por isso, que, a cada momento, a cada metro, a cada quilómetro, existe um mar de enormes emoções. No fundo, as provas acabam por ser a parte mais fácil, a preparação é que dói, faz-nos sofrer, porque temos o nosso trabalho, somos amadores, temos a família, fazemos uma ginástica tremenda se quisermos ter bons resultados, treinos bidiários, corre-se para o trabalho e do trabalho para casa, temos a família à espera, temos de recuperar, são muitas emoções para uma só pessoa. Por isso é tão gratificantes conseguir bons resultados”. Resultados que, seguramente, o focarão na conquista de um título mundial ou não? “No próximo ano haverá um novo campeonato mundial de maratonas em masters, não sabemos ainda onde se realizará. Portanto, a minha participação dependerá de conseguir viajar, ou não, para o país onde se organizará e, eventualmente, de arranjar patrocínios para me ajudarem nessa logística. Gostaria muito de participar, mas primeiro terei de saber onde é que ele irá decorrer”.

 

A esposa é a sua fã incondicional, por isso se diz que atrás de um grande homem está sempre uma mulher ainda maior: “O apoio familiar é fundamental. A minha esposa é uma pessoa que faz com que tudo isto seja possível. Ajuda-me muito, de outra forma não seria possível”.

 

O clube, esse, é a sua outra paixão. “O São Francisco da Serra é um clube fantástico, cheio de gente muito boa, muito amiga, gente que me acolheu muito bem e que, tendo tão pouco, consegue fazer coisas enormes. É esse o milagre. Essas pessoas também têm de ser parabenizadas pelo esforço que fazem para não deixarem morrer o atletismo. São os pequenos clubes que mantêm a modalidade viva e dinâmica”. Um clube do qual Edgar Matias rejeita ser a maior referência.

 

“Não sou. Nunca pensei nisso. Procuro honrar e dignificar a camisola, representar o clube o melhor que consigo, embora gostasse de ser um exemplo para os mais jovens, isso gostava, mas nunca me senti uma referência. Neste clube todos os atletas são referências, cada um à sua maneira, claro. Damos tudo o que temos dentro de nós, só podemos é sentirmo-nos felizes e recompensados”.

 

Mas é o atleta mais titulado… “Sem dúvida, mas eu não vejo as coisas por aí. Pelo contrário, sinto que as grandes referências deste clube são os dirigentes que permitem que o São Francisco e os seus atletas se mantenham em atividade e não o deixam fechar portas”. Esta é mesmo de campeão…

 

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