Diário do Alentejo

Os êxitos, as emoções e os sonhos de um atleta nascido na “Aldeia”

26 de agosto 2022 - 14:00
A paixão pelo atletismo...
Foto | Liliane AmaroFoto | Liliane Amaro

O aldenovense Ricardo Paixão disputou, recentemente, os Campeonatos do Mundo de Atletismo Master, realizados na cidade finlandesa de Tampere, onde conseguiu o 4.º lugar nos 1500 metros e o 5.º nos 800 metros, em ambos os casos, a uma pequena distância dos pódios.

 

Texto Firmino Paixão

 

Nascido há cerca de 36 anos em Vila Nova de São Bento, iniciou-se no atletismo no clube da sua terra natal, mas, depois de se ter juntado à diáspora alentejana na grande Lisboa, representou, entre outros emblemas, o Sporting, o Benfica, Os Belenenses e, atualmente, o Vitória de Setúbal.

 

Porém, o Alentejo e a “Aldeia” permanecem no seu coração. “O Alentejo, e a minha terra, são o meu maior orgulho e a verdade é que uma das razões porque ainda me mantenho no atletismo é querer cada vez mais títulos, para projetar o nome da minha terra, Vila Nova de São Bento. Orgulho-me que me conheçam na minha terra e que as pessoas que me viram crescer e treinar nas ruas daquela ‘aldeia’, muitas vezes de noite, sintam que valeu a pena andar ‘a fugir feito maluco’”.

 

A oportunidade de competir na Finlândia abriu-se-lhe após ter sido vice-campeão da Europa, na distância de 1500 metros, em Braga, reconhecendo porém que nunca pensou “manter um nível competitivo e a prolongar a minha forma, até aos 36 anos, nas especialidades de 800 e 1500 metros, que são provas muito rápidas”.

 

E recordou que: “Após duas paragens no atletismo federado, e depois de ter arrumado as sapatilhas, pensava ter terminado a minha carreira, mas eis que surgiu a oportunidade de participar em competições como veterano”. Contou, então, que “na primeira experiência internacional no meu escalão, nos europeus em Braga, consegui o 4.º lugar nos 3000 metros e 2.º nos 1500”.

 

Surpreendido com o grau de exigência destas provas e, entusiasmado com a sua disponibilidade física para lhe corresponder, Ricardo Paixão revelou que “tinha uma ideia errada do que era o atletismo master, pensava que era para ‘velhos’. Enganei-me eu e está enganado quem pensa assim”.

 

O subchefe do Regimento de Sapadores Bombeiros de Lisboa (RSBL), lamenta, contudo, que, “no nosso país, as instituições responsáveis não nos dão o devido valor, em muitos outros países o fazem, mas Portugal, como sempre, continua na cauda do mundo em vias de desenvolvimento desportivo há muitos anos, e sem fim à vista. O erro começa logo pela educação nas escolas e com o curto tempo de atividade física disponibilizado às crianças” acusou o atleta.

 

AS DIFERENTES CONQUISTAS

O seu palmarés é riquíssimo. No plano distrital, ainda no Alentejo, conquistou tudo o que existia para conquistar.

 

Depois, já dedicado às distâncias de 800 e 1500 metros, conseguiu dois títulos europeus (Huelva, 2016) em representação do RSBL, campeão europeu de 3000/Obstáculos e campeão da europeu de meia maratona por equipas (2018, Gibraltar), campeão do mundo de Bombeiros em 800metros/1500metros e 3000m/obstáculos, na cidade de Lisboa, em 2022, não apenas no escalão M35, mas com um registo para vencer em todos os escalões.

 

Contudo, comentou: “Tenho títulos desde iniciado a veterano, de campeão regional, campeão nacional, campeão da Europa e do mundo, nestas distâncias que o meu primeiro treinador, António Casaca, descobriu que eram as que eu tinha mais vocação. Mas é difícil a um desportista ter o palmarés completo. Procuro enriquecer o meu curriculum ao máximo e com qualidade, para deixar uma herança desportiva aos meus filhos e à minha terra natal”.

 

A meta, na Finlândia, era naturalmente uma medalha, garantiu. “Numa final, não há mais nada para pensar a não ser as medalhas ou até ouvir o hino nacional, mas sabe sempre a pouco correr uma final e ficar ali tão perto do pódio”.

 

Porém, foi o que aconteceu, não tanto nos 800 metros, mas nos 1500, onde mais um pouco e caía uma medalha. O que terá faltado, Ricardo? “Vou responder começando pelo que não faltou: estava confiante, motivado, e acreditava na medalha, dei o meu melhor, fiz também, nesta prova, a minha melhor marca da época, infelizmente, não consegui. O que faltou? Faltou-me ritmo de competição para as provas de 1500 metros, corri mais vezes, e com qualidade, os 800 metros”.

 

O balanço, porém, é positivo. “Claro, eu corri um campeonato do mundo, não corri um escolar ou um distrital, onde me iniciei há 25 anos. Aqui estavam os melhores atletas do mundo do meu escalão”. Cinco anos depois de ter disputado o Mundial de Bombeiros em Los Angeles, igualou os resultados de 2017, afinal, “uma incrível semelhança, competições distintas, mas na minha estreia em mundiais em ambas igualei os lugares, nem tinha reparado nisso”.

 

O atleta projeta afastar-se do atletismo daqui por quatro anos mas, até lá, seguramente, vê-lo-emos mais vezes a lutar pelos objetivos.

 

“Continuarei a lutar nos masters, espero estar presente nos campeonatos do mundo de pista coberta, na Polónia, em março de 2023, e ter mais alguns apoios. Espero continuar bem de saúde, com estabilidade familiar, emocional e profissional para levar em frente as minhas ambições. Já fui campeão do mundo de Bombeiros, falta-me ser campeão do mundo de atletismo federado”.

 

Vamos ver, Ricardo, mas, e que apoios permitem dar asas a esses sonhos? “As instituições que representamos, e que nos representam, não nos apoiam. Procuramos apoios individuais, e suportamos todas as despesas, por referirem que é do interesse pessoal. Obviamente, pois tudo na vida passa em parte pelo interesse pessoal, mas aliado a isso está a minha bandeira, estou ali a representar Portugal, não estou a representar o meu clube, nem a minha casa. Até parece que, a partir de uma certa idade as pessoas deixam de ser válidas”.

 

O outro desafio, para além do desporto, também passa pelo altruísmo: “Continuo como Sapador Bombeiro, profissional do RSBL, dou o meu contributo na salvaguarda da cidade de Lisboa e todos os que por ela passam e lá vivem, ou de qualquer pessoa que necessite em qualquer lugar. Servir o próximo, aqueles que no dia-a-dia se deparam com os percalços da vida. Lá estarei para ajudar no que puder, para os deixar numa situação melhor do que aquela em que os encontrei”.

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