Diário do Alentejo

Clube Fluvial Odemirense: O renascer das cinzas

03 de novembro 2021 - 09:00

Um choque enorme. Um sentimento de grande tristeza”. É assim que Ilídio Soares, presidente do Clube Fluvial Odemirense, recorda a trágica madrugada do passado dia 9 de outubro, quando as instalações do clube foram incendiadas deixando em cinzas todo um trabalho de 37 anos.

 

Texto Firmino Paixão

 

Foi uma madrugada dramática, a de sábado, 9 de outubro de 2021. Um dia que ficará na história da canoagem alentejana. As instalações do Clube Fluvial Odemirense foram tomadas pelas chamas e completamente destruídas, provocando um prejuízo estimado em cerca de 200 mil euros. No mesmo dia, conforme noticiado pelo “DA”, a Polícia Judiciária de Portimão deteve numa superfície comercial de Vila do Bispo um cidadão de nacionalidade alemã, de 35 anos, indiciado pela prática desse crime. O Tribunal de Odemira decretou a sua prisão preventiva, encaminhando-o para o Estabelecimento Prisional de Beja. O clube está agora a renascer das cinzas e o seu presidente, que ainda assistiu ao incêndio, elogia a onda de solidariedade que tem sentido em torno do clube.

 

Qual o sentimento de ver o fogo a consumir as instalações do clube? Um misto de tristeza e revolta…

Sim, senti muita tristeza, mas revolta não senti. Ainda vi as instalações e o material a serem consumidos pelas chamas. Eu tinha o despertador para tocar às 7:00 horas, apesar de ser sábado e de não trabalharmos. Mas o telefone começou a tocar cerca das cinco e meia da manhã e eu, logo, logo, pensei que o despertador estaria avariado. Contudo, a insistência era muita. Entretanto, ouvi a campainha a tocar, estranhei, mas fui ver, eram agentes da Guarda Nacional Republicana que foram buscar-me a casa. Quando aqui cheguei já estavam cá muitos amigos e pessoas ligadas ao clube, todos muito tristes. Também o comandante dos bombeiros, que já praticou canoagem e é muito próximo do clube, abraçou-me assim que me viu e começámos ambos a chorar, aliás, eu já vinha a chorar de casa.

 

Tem sentido a solidariedade da comunidade?

Sim, tenho sentido bastante, nem só da comunidade odemirense, também de muita gente por esse País fora. Temos sentido uma solidariedade que é uma coisa fora do comum. Sabemos que uma empresa do Porto que fabrica barcos nos vai oferecer dois, outra empresa vai proporcionar-nos preços muito especiais em embarcações que já encomendámos. Uma pessoa de Aveiro contactou-nos para nos oferecer dois barcos… enfim, tem sido uma coisa formidável.

 

Foi indiciada uma pessoa pela prática desse crime e está em prisão preventiva, mas as motivações não são conhecidas?

Sei lá! Efetivamente, não sei o que o terá levado a fazer isto. Nem sabemos se realmente pegou fogo nisto ou se foi algo acidental, pois era tudo material muito inflamável. A pessoa não era conhecida aqui, nunca a tínhamos visto, ninguém o conhecia, esteve aqui há uns dias de passagem, com uma autocaravana.

 

Quase quatro décadas de esforço para apetrechar e fazer crescer este clube e de repente, ficou tudo em cinzas…

Sim, foi impressionante. Recordarmos todo o trabalho que ficou para trás durante estes anos, todos os sacrifícios que foram feitos e, num ápice, ficou tudo destruído. E nós impotentes para evitar o que quer que fosse, porque as chamas eram muitas, vieram três carros de fogo e mais um autotanque e o incêndio não foi fácil de dominar. Calculamos que os prejuízos sejam na ordem dos 200 mil euros. Tínhamos aqui muitas embarcações de carbono, que agora custam muito mais do que custaram aquelas. Como estão a decorrer obras em frente do hangar, não tínhamos aqui as carrinhas, senão teriam ardido também.

 

A tragédia já faz parte do passado, ficará na memória coletiva, mas o Clube Fluvial Odemirense já está a reerguer-se?

Já! Começámos logo no dia seguinte. Domingo pela manhã reunimos os barcos velhos que estavam na rua, para irem para reciclagem, não arderam e estamos a tentar recuperá-los. São embarcações já ultrapassadas, mas estamos a tentar, de alguma forma, pô-los ainda operacionais, porque no dia 31 de outubro iremos participar na XXIV Subida Internacional do Rio Arade, entre Portimão e Silves, e iremos todos, os atletas, os pais, os dirigentes e os amigos… iremos todos, em força. Vamos mostrar que estamos cá e que não desistiremos. Todos os clubes nos estão a ajudar e as inscrições nessa prova no Arade vão reverter a nosso favor. Temos meia centena de atletas, 25 miúdos na área da formação e os restantes nos diversos escalões competitivos.

 

As necessidades mais prementes serão as embarcações para esses atletas?

Sim, são as embarcações, mas também as pagaias… os pais dos miúdos já se organizaram e adquiriram os coletes todos que faziam falta. Os bombeiros também nos deram os coletes que lá tinham e o município de Odemira vai ajudar-nos a adquirir um grupo de barcos necessário a que façamos as provas. A população de Odemira também nos tem ajudado muito, mas a Câmara Municipal de Odemira, mesmo antes de os atuais eleitos tomarem posse, esteve sempre na primeira linha do apoio ao clube.

 

Num segundo momento haverá necessidade de reconstruir o hangar. Será demolido ou é possível recuperá-lo?

Temos que pôr tudo isto de pé. O que sofreu mais foi o telhado, espero que, até ao final do ano possamos ter o edifício recuperado. Estamos a construir um novo hangar aqui ao lado, com ginásio, balneários para os atletas, uma oficina, este edifício já foi vistoriado pelo técnicos e será um espaço multiusos, com uma copa e um escritório, uma sala de estudo para os miúdos e uma sala de reuniões.

 

Este infortúnio fez crescer uma nova alma, uma nova força, em torno do Clube Fluvial Odemirense?

Penso que sim, sinto que os pais dos nossos miúdos estão muito unidos e muito solidários connosco, a direção também está muito mais motivada, todos juntos temos feito um esforço enorme para ultrapassarmos as dificuldades. A população de Odemira tem sido incansável, nem esperava que as pessoas fossem tão sensíveis para com este clube. Não estávamos à espera de tanta solidariedade e de tanto carinho à nossa volta. Só posso agradecer ajuda toda que temos recebido, estamos muito emocionados com todo este apoio que temos sentido, até de pessoas que sabemos terem poucos recursos.

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