Diário do Alentejo

Os dados definitivos dos Censos 2021 confirmam perda de população no distrito

04 de dezembro 2022 - 09:30
Perspetivas demográficas no horizonte 2031 para o Alentejo apontam para “a muito provável continuidade da diminuição global” e “intensificação do duplo envelhecimento”, afirma investigador
Ilustração | Susa Monteiro/ ArquivoIlustração | Susa Monteiro/ Arquivo

Texto Nélia Pedrosa

 

À data de 19 de abril de 2021, residiam no distrito de Beja 144 401 pessoas, menos 5,5 por cento do que em 2011, segundo os dados definitivos do Censos 2021, divulgados na semana passada pelo Instituto Nacional de Estatística (INE).

 

À exceção de Odemira, todos os concelhos do distrito viram decrescer o seu efetivo populacional na última década. Ao nível das NUTS II, o Alentejo foi a região que mais população perdeu, com um decréscimo de 7,0 por cento.

 

De acordo com o investigador Marcos Olímpio dos Santos, “as perspetivas demográficas no horizonte 2031 para o Alentejo no seu todo, ou somente para os três distritos, apontam para a muito provável continuidade da diminuição global, bem como da intensificação do duplo envelhecimento”.

 

O distrito de Beja perdeu 5,5 por cento da sua população na última década, passando de 152 758 residentes, em 2011, para 144 401, em 2021 (menos 8357 pessoas), segundo os dados definitivos do Censos 2021 – XVI Recenseamento Geral da População e VI Recenseamento Geral da Habitação, divulgados na semana passada pelo Instituto Nacional de Estatística (INE).

 

Como já tinha sido avançado aquando da divulgação dos dados provisórios do Censos 2021, em agosto do ano passado, Odemira foi o único concelho do distrito de Beja, e também a nível nacional, a apresentar um aumento populacional nos últimos 10 anos – 13,3 por cento –, contabilizando, em 2021, 29 538 habitantes, um fenómeno para o qual contribui a imigração.

 

No lado oposto situa-se Barrancos, o concelho do distrito, e também do País, que registou a maior perda populacional em relação a 2011 (21,6 por cento), passando a 1438 pessoas. Seguem-se, também com decréscimos superiores a 10 por cento, os concelhos de Mértola, com -14,68 (passando para 6206 residentes), Vidigueira, com -12,76 por cento (para 5175), Moura, com -12,59 por cento (para 13 258), Serpa, com -11,94 por cento (para 13 757), Cuba, com -10,35 por cento (para 4373) e Ourique, com -10,21por cento (para 4839).

 

Almodôvar registou uma descida de 9,89 por cento, contabilizando, em 2021, 6712 habitantes, e Alvito um decréscimo de 8,95 por cento, passando a 2280 residentes. As taxas de variação populacional mais baixas do distrito verificam-se em Aljustrel, com -4,14 por cento (passando para 8874 residentes), Castro Verde, com -5,54 por cento (para 6873) e Ferreira do Alentejo, com -6,92 por cento (para 7684). O concelho de Beja apresenta uma taxa de variação de -6,86 por cento, tendo passado de 35 854 residentes, em 2011, para 33 394 (menos 2460), em 2021.

 

Em termos gerais, o Alentejo foi a região que mais população perdeu na última década, com um decréscimo de 7,0 por cento, contabilizando, em 2021, 704 533 pessoas. Dos três distritos alentejanos, Portalegre é o que apresenta a maior redução populacional nos últimos 10 anos, com -11,5 por cento, passando de 118 506 para 104 923 residentes, perdendo, assim, 13 583 habitantes. O distrito de Évora, por sua vez, perdeu 8,6 por cento da sua população, tendo passado de 166 726 habitantes, em 2011, para 152 444, em 2021.

 

O INE sublinha que “a evolução demográfica da última década ao nível de município permite verificar que os territórios localizados no interior do País perdem população e que os que registam um crescimento populacional se situam predominantemente no litoral, com uma concentração em torno de Lisboa e no Algarve”.

 

A recolha dos Censos 2021 teve lugar entre 5 de abril e 31 de maio de 2021 e os dados referem-se à data do momento censitário, dia 19 de abril.

 

“Em vários concelhos, o número anual de falecimentos é, pelo menos, o dobro de nascimentos” Marcos Olímpio dos Santos, sociólogo, investigador do Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais (CICS. NOVA.UÉvora), sublinha, em declarações ao “Diário do Alentejo”, que o decréscimo populacional ocorrido na década de 2011-2021 “no Alentejo em geral (considerando a Lezíria do Tejo) e, em particular, nos 43 concelhos dos distritos de Beja, Évora e Portalegre, é a continuidade de uma tendência que teve início em quase todos esses concelhos há cerca de 70 anos, na década de 50 do século XX, quando o pico demográfico foi atingido na região”.

 

De acordo com o investigador, a “perda deve-se, essencialmente, ao desequilíbrio verificado no movimento natural (diferença entre falecimentos e nascimentos), uma vez que, em vários concelhos, o número anual de falecimentos é, pelo menos, o dobro de nascimentos”, e também “ao desequilíbrio nos movimentos migratórios”, dado que “o número de habitantes de territórios do Alentejo que saem e fixam residência no exterior é superior ao número de pessoas provenientes do exterior que fixam residência nesses territórios”.

 

O decréscimo populacional decorre, assim, reforça, “de um penalizador duplo movimento: natural e migratório”.

 

Marcos Olímpio dos Santos acrescenta que no âmbito do movimento natural constata-se que uma das explicações para a diminuição populacional “decorre do facto relacionado com o número de nascimentos por cada mulher em idade fértil, que deveria ser no mínimo de 2,1 crianças por mulher (limiar de substituição de gerações), se situar, no Alentejo, nos 1,43 em 2020”.

 

Esta “descompensação do movimento natural não tem sido, no entanto, mais acentuada”, frisa, “porque a taxa de mortalidade ter vindo a ser travada, quer devido à diminuição da taxa de mortalidade infantil, quer devido à diminuição da taxa de mortalidade em geral, ocasionada pelo aumento da esperança de vida, nomeadamente, da população idosa”.

 

DECRÉSCIMO POPULACIONAL TERÁ IMPLICAÇÕES NA DISPONIBILIZAÇÃO DE SERVIÇOS PÚBLICOS 

Os movimentos migratórios, por sua vez, estão “muito relacionados com as (des)vantagens comparativas (localização, recursos naturais) e competitivas (qualificação da população, dinâmica da base económica) dos vários territórios, pois os beneficiados pelas referidas vantagens são mais atrativos para fixar e atrair população, enquanto os menos beneficiados se encontram desprovidos de trunfos que possibilitem, no mínimo, manter a sua população”.

 

O concelho de Odemira, prossegue o investigador, “por usufruir de algumas dessas vantagens comparativas, como o clima adequado e disponibilidade de água, entre outras, teve a possibilidade de, numa conjuntura favorável, presenciar o crescimento da agricultura intensiva que tem florescido devido ao afluxo de mão de obra, proveniente de alguns países asiáticos, a qual desempenha tarefas não qualificadas e cujas condições de vida são em muitos casos deficitárias”.

 

O sociólogo sublinha, no entanto, que o aumento populacional ocorrido naquele concelho entre 2011 e 2021 “poderá não ser tão significativo até à realização dos próximos Censos, em 2031, ou, então, numa conjuntura desfavorável, diminuir mesmo, ainda que em número reduzido, pois algumas das condicionantes à expansão da agricultura intensiva já se estão a fazer sentir, como é o caso da água disponível”.

 

“Em todo o caso, as perspetivas demográficas no horizonte 2031 para o Alentejo no seu todo, ou somente para os três distritos, apontam para a muito provável continuidade da diminuição global, bem como da intensificação do duplo envelhecimento (diminuição de crianças e jovens e aumento de idosos), não se afigurando crível que o aumento de imigrantes possa contribuir para reverter, significativa e generalizadamente, uma tendência que se afigura inexorável, devido, por um lado, aos condicionalismos estruturais endógenos (pirâmide etária envelhecida, reduzida natalidade) e, por outro, a condicionalismos estruturais exógenos (entre os quais uma recuperação lenta da economia mundial)”, afirma.

 

Por conseguinte, acrescenta, o decréscimo populacional que atinge o Alentejo, “e que, provavelmente, se irá manter ao longo dos próximos nove anos, ainda que desigualmente distribuído, terá como implicações a continuada redução do designado limiar da procura, o que afetará a já decrescente disponibilização de alguns serviços públicos, nomeadamente, na educação e na saúde, mas também a dificuldade de oferta de postos de trabalho por parte do setor privado empresarial e, neste particular, de postos de trabalho qualificado”.

 

Perante o cenário atual, caberá, assim, “aos intervenientes com responsabilidades a nível regional, sub-regional e local – dos setores público, privado e de organizações da economia social –, pugnarem pela maximização dos resultados a obter através do cumprimento do estabelecido nos instrumentos de intervenção que vão ser implementados até 2030, promovendo e participando em iniciativas que contribuam para alargar o conhecimento sobre o decréscimo populacional verificado no Alentejo”, diz.

 

Marcos Olímpio dos Santos sublinha que a imigração, “muito noticiada nestes últimos anos em relação ao Alentejo, sobretudo, não por bons motivos, é um dos contributos para atenuar esse desafio, que talvez não tenha ainda sido suficientemente debatido”. No seu entender, há questões fundamentais a ter em conta, nomeadamente, “que imigrantes queremos? Quantos queremos? Para que funções? Como vão ser integrados?”.

 

A concluir, o investigador do Centro Interdisciplinar de Ciências diz que, “se a imigração advinda do exterior poderá ser um contributo para atenuar o decréscimo populacional no Alentejo, o reforço de contributos proporcionados pelas políticas públicas é um imperativo incontornável, nomeadamente, apoio a casais jovens, apoio ao empreendedorismo jovem, apoio à deslocação e criação de empresas, mas também o apoio à imigração interna, favorecendo a deslocação para territórios de baixa densidade de população ativa proveniente, sobretudo, dos grandes centros urbanos”.

 

EXISTEM NO ALENTEJO 219 IDOSOS POR CADA 100 JOVENS 

Segundo os resultados definitivos do Censos 2021, o aumento da idade média, na última década, foi transversal a todas as regiões NUTS II, sendo que o Alentejo foi a região que apresentou o valor mais elevado – 47,4 anos.

 

Os mesmos dados dão conta que a região apresenta o segundo índice de envelhecimento mais alto de Portugal Continental, a seguir ao Centro, com 219 idosos por cada 100 jovens. No distrito de Beja, Mértola, Ourique e Almodôvar são os concelhos que apresentam os índices de envelhecimento mais elevados: 418,32, 342,59 e 299,59 respetivamente.

 

O Alentejo regista, igualmente, o índice de rejuvenescimento mais baixo: por cada 100 pessoas que saem do mercado de trabalho, apenas ingressam 66. No que concerne ao nível de escolaridade, em 2021, 52,6 por cento da população residente com 15 ou mais anos tinham concluído o ensino básico; 24,2 por cento o ensino secundário ou pós-secundário; e 14,7 o ensino superior.

 

Os dados mostram, ainda, que 72 por cento da população com ensino superior completo possuíam licenciatura, 16,9 por centro mestrado e 7,7 por cento bacharelato.

 

O nível de doutoramento compreendia apenas 2,2 por cento do total da população com ensino superior. A taxa de analfabetismo no Alentejo situava-se nos 5,4 por cento. Apesar de ter diminuído em relação a 2011, é o valor mais elevado ao nível das NUTS II.

 

CONCELHOS DO ALENTEJO LITORAL TAMBÉM PERDEM POPULAÇÃO 

Os quatro concelhos do Alentejo Litoral que integram o distrito de Setúbal – Alcácer do Sal, Grândola, Santiago do Cacém e Sines – perderem 4955 habitantes na última década, com destaque para a quebra de 14,82 por cento em Alcácer do Sal, que passou de 13 046 habitantes, em 2011, para 11 112, em 2021. Ainda de acordo com os dados definitivos do Censos 2021, Grândola passou de 14 826 para 13 822 residentes (-6,77 por cento), Santiago do Cacém de 29 749 para 27 772 (-6,65 por cento) e Sines de 14 238 para 14 198 (-0,28 por cento).

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