Para duas famílias que vivam no distrito de Beja, em concelhos diferentes, mas com o mesmo consumo anual de água, a diferença de preço pode ultrapassar, em alguns casos, os 350 euros. O estudo foi efetuado pela Deco Proteste – Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor, que diz que “estas desigualdades não são claras” e critica a ausência de “tarifas adaptadas a famílias numerosas”, o que agrava, ainda mais, a situação.
Texto | Aníbal FernandesInfografia | Inês Cortes
Se vive em Aljustrel e a sua família tem um consumo de água anual de 180 metros cúbicos, a fatura mensal é de pouco mais de 19 euros. Já uma família com o mesmo nível de consumo que habite no concelho de Beja verá a sua conta com a água ultrapassar os 50 euros por mês.
Estes dados, que foram divulgados pela Deco Proteste no final de novembro, revelam que, a nível nacional, existem disparidades que podem atingir os 500 por cento de diferença: um consumo de 10 metros cúbicos (m3) mensais em Amarante custa 494,47 euros anuais, enquanto em Vila Nova de Foz Coa a fartura é de apenas 94,09 euros para a mesma quantidade de água consumida.
No distrito de Beja (ver infografia) o concelho que cobra o preço mais elevado é Beja (430,68 euros por 120 m3/ano e 606,48 euros por 180 m3/ano). Aljustrel é aquele onde o preço da água é mais barato (176,91 euros por 120 m3/ano e 231,95 euros por 180 m3/ano). Os valores apresentados incluem a taxa de saneamento e de resíduos sólidos.
Para a Deco Proteste, as razões para valores tão díspares “não são claras, uma vez que estes não se justificam apenas por diferenças de investimentos”, diz Mariana Ludovino, uma responsável da associação, criticando, ainda, o facto de “poucos municípios oferecerem tarifas adaptadas a famílias numerosas, agravando ainda mais as desigualdades”.
Pelo seu lado, a Entidade Reguladora dos Serviços da Água e Resíduos (Ersar) defende que “o preço cobrado deve servir para, no mínimo, cobrir os custos suportados pelas entidades gestoras com a prestação dos serviços num cenário de gestão eficiente”. Ora isso também não está a acontecer em alguns casos, alerta a associação dos consumidores, sublinhando “a insustentabilidade financeira de alguns serviços”.
No último “Relatório Anual dos Serviços de Águas e Resíduos em Portugal”, relativo a 2022, a Ersar avisava que os serviços de saneamento e de resíduos ‘em baixa’ mantinham “uma situação de não recuperação de gastos”, o que podia “colocar em causa a sustentabilidade dos sectores”.
No entanto, um decreto-lei aprovado no mês de outubro, em Conselho de Ministros, vai permitir à Ersar, a partir de 2026, intervir mais diretamente na definição de tarifários, competência que tinha perdido em 2021 – Governo de António Costa –, mas que, agora, o Ministério do Ambiente restaurou.Ou seja, são repostas as normas dos estatutos da Ersar de 2014 que lhe davam a capacidade de “regulamentar” as tarifas nos sistemas municipais, independentemente de serem de gestão direta ou concessionada, e de “aprovar regulamentos tarifários” – em vez de apenas emitir “recomendações tarifárias”. Para a Deco, esta decisão vai levar à “harmonização tarifária num futuro não muito distante”.
Beja é a mais cara O tarifário cobrado pela Empresa Municipal de Água e Saneamento (EMAS) de Beja é o mais caro do distrito, situação que veio confirmar a posição já detida em 2022, aquando da divulgação do mesmo estudo efetuado pela Deco nesse ano.
Rui Marreiros, vice-presidente da Câmara de Beja e presidente do conselho de administração da EMAS, em declarações ao “Diário do Alentejo”, explica o diferencial do tarifário praticado no seu concelho com o facto de grande parte dos outros municípios do distrito “terem um modelo de gestão direta, o que significa que a água é subsidiada”. Em Beja, e seguindo as recomendações da Ersar, isso não se verifica, já que o preço reflete os custos da operação, de forma a garantir a sustentabilidade das empresas e capacidade financeira para intervir na manutenção da rede, onde as perdas são cerca de metade do registado no resto do distrito.
Rui Marreiros diz que o serviço prestado pela EMAS é de “alta qualidade”, que a empresa é “sustentável” e que “está obrigada uma gestão eficiente e transparente”. No entanto, no concelho de Beja existe a tarifa social automática, para famílias mais desfavorecidas, uma tarifa para famílias numerosas e o cartão do idoso que chega a proporcionar descontos de 50 por cento na fatura.
Entretanto, Carmona Rodrigues, presidente do conselho de administração do Grupo Águas de Portugal, acionista maioritário da Águas Públicas do Alentejo, durante as XV Jornadas da Fenareg, que tiveram lugar no Fundão, nos passados dias 26 e 27 de novembro, mostrou-se disponível para assinar um protocolo com a Associação Nacional de Municípios Portugueses para ajudar com meios “técnicos e conhecimento” na recuperação da rede “em baixa” de forma a minimizar as perdas de água que são muito elevadas.