Diário do Alentejo

O desporto e a cultura

27 de setembro 2024 - 12:00
Trilhos do Outeiro do Circo são uma promoção do Grupo Desportivo e Cultural de MombejaFoto| Firmino Paixão

Vítor Carvalheira (NDC Odemira) e Paula Ramalho (C.B. Reguengos), no trail curto, Paulo Remexido (BTT Salvada) e Marisa Machado (Cocheiros & C.ª), no trail médio, foram os vencedores absolutos da terceira edição dos Trilhos do Outeiro do Circo, na aldeia de Mombeja.

 

Texto e Foto | Firmino Paixão

 

O sol só rompeu o denso manto de nebulosidade lá para as bandas do meio-dia. Uma ligeira neblina refrescava a manhã. Um tráfego pouco habitual, vindo de Beringel ou de Santa Vitória, desaguava na rotunda que encima a avenida 25 de Abril, na aldeia de Mombeja, no concelho de Beja. Lá bem ao fundo, perto do poço de Ferreira, já se erguia o pódio sob o qual se alinhariam as duas centenas de participantes na terceira edição dos Trilhos do Outeiro do Circo. O aroma a cafeína já se sentia pelas frestas da porta do centro de convívio, ali a meio da rua do Norte. Estas organizações sempre impactam positivamente e alteram a azáfama da dona Zezinha, concessionária do espaço, que se rodeia, nestas alturas de menos sossego, pelas duas filhas, muito prestáveis.

À hora prevista, soou a partida para esta que é a oitava e última prova da edição 2024 do Circuito de Trail do Baixo Alentejo, tutelado pela Associação de Atletismo de Beja. Um evento que se associou à promoção de um sítio arqueológico existente ali bem perto, diluindo, e bem, a sua essência desportiva numa vertente também cultural.

Será que os trilhos tentam promover o sítio arqueológico que lhes deu o nome? “Não tentam. Os Trilhos do Outeiro do Circo promovem, mais do que tudo, o que nós temos feito até ao momento”, garantiu o arqueólogo Miguel Serra, um dos investigadores do projeto, enquanto se preparava para a caminhada de 10 quilómetros. Depois, justificou: “Basta ver que hoje estamos perante a maior edição das três já realizadas, com 200 inscritos, mais os acompanhantes. Todos eles levam informação sobre o que é o Outeiro do Circo, um sítio arqueológico aqui muito próximo de Mombeja. Têm toda a informação distribuída, um folheto explicativo, os próprios elementos da organização quando questionados também informam sobre o que é o sítio”. Ou seja, pormenorizou: “Esta é uma forma de promoção não direta, porque não é diretamente produzida pela equipa de arqueologia, mas resulta de um trabalho de anos aqui feito. O que aconteceu foi que a própria comunidade e, neste caso, o grupo desportivo e cultural, e muito bem, apropriou-se do nome e da informação para fazer o seu roteiro e dar o nome a esta prova, o que nos orgulha imenso”.

O envolvimento da equipa de arqueologia é efetivo, revelou. “Temos aqui a equipa original, eu vou estar a participar na caminhada, um outro colega, Eduardo Porfírio, estará no Outeiro do Circo, que é um dos pontos de passagem, e um terceiro, Rafael Ortiz, que veio de propósito de Sevilha, embora mais habituado a fazer ultramaratonas do que estes percursos muito curtos, veio participar no trail dos 25 quilómetros”.

E assim nasceu o desejo de sabermos um pouco mais do sítio onde a organização se inspirou. “O Outeiro do Circo, há três mil anos, era uma espécie de grande lugar central desta região, num período em que Beja ainda não existia. Aliás, existe uma lenda com cerca de 300 anos que associa este lugar do Outeiro do Circo a uma colina entre Beringel e Mombeja, junto ao Monte do Circo”, recordou Miguel Serra. E acrescentou: “Essa lenda diz que ali se tentou criar a cidade de Beja em tempos perdidos, mas por alguma razão se desistiu dessa empreitada, fazendo-se a cidade onde está hoje. Daí o nome da aldeia de Mombeja que derivaria de Montes de Beja por ali se ter tentado fazer a cidade. É uma lenda, claro, mas é uma lenda que tem uma parte bastante correta. É que o Outeiro do Circo é anterior à cidade de Beja, que nasceu depois de este sítio ter sido abandonado”. Portanto, prosseguiu o arqueólogo: “Há cerca de três mil anos temos de imaginar ali no alto daquele cerro, que em Mombeja conhecem por Cerro dos Muros, um nome que associa muito melhor ao que ali se pode ver, era um grande povoado que teria largas centenas de pessoas que viviam, sobretudo, da agricultura e da pastorícia e que estavam ali muito bem defendidos por uma grande linha de muralha, formando um povoado com cerca de 17 hectares e com uma muralha com mais de dois quilómetros de extensão. Era um dos maiores sítios desta época, que conhecemos no Sul da Península Ibérica, e que dominaria estes vastos campos agrícolas aqui em volta e controlava, com certeza, uma vasta região”.

Miguel Serra ainda deixou a nota: “As escavações arqueológicas estão paradas desde 2021, teremos de ver, novamente, quando será possível termos apoio para retomarmos os trabalhos. Desde essa altura que estamos focados num outro tipo de ações, temos um projeto a decorrer, com o apoio do município de Beja e de outras entidades, que se centra na área de estudo, a parte ‘chata’, digamos assim, a parte que ninguém vê, que é a parte de laboratório, fechados nos gabinetes com muito trabalho a fazer a esse nível, mas também de divulgação, em que temos promovido workshops e conferências sobre o Outeiro do Circo e sobre o conhecimento ali produzido”.

 

Classificações Trilhos do Outeiro do Circo

Trail sprinte 15KM | Masculinos

1.º Vítor Carvalheira (NDC Odemira) 1h02’58’’2.º Flávio Bolrão (Barrancos Biogado) 1h04’56’’3.º Alexandre Pimpão (NAR Messejana) 1h05’24’’

 

Femininos

1.º Paula Ramalho (CB Reguengos) 1h13’06’’ 2.º Ângela Ameixa (Trilhos de Ficalho) 1h26’24’’3.º Rosa Ferro (Trilhos de Ficalho) 1h30’13’’

 

Trail médio 25KM | Masculinos

1.º Paulo Remexido (BTT Salvada) 2h02’33’’2.º Pedro Gonçalves (individual) 2h03’33´’3.º Aurélio Sobral (São Francisco Serra) 2h06’38’’

 

Femininos

1.º Marisa Machado (Cocheiros & C.ª) 2h19’47´´ 2.º Ana Ângelo (Barrancos Biogado) 2h38’19´´

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