Diário do Alentejo

“Alguém aqui não está a falar a verdade”, diz deputado do PSD

19 de dezembro 2025 - 08:00
PSD e PS solicitam audições parlamentares com diferentes interlocutores, no âmbito do esclarecimento da diminuição da verba inicial para a linha do Alentejo

No âmbito da questão da reprogramação financeira do Programa Alentejo 2030, nomeadamente, no que diz respeito à retirada de cerca de 60 milhões de euros, da dotação indicativa inicial, para a linha do Alentejo e, particularmente, para o troço Casa Branca-Beja, esta semana foi fecunda em declarações de âmbito político, trocas de acusações e pedidos de esclarecimentos. O ministro das Infraestruturas e Habitação veio a público garantir que “a obra de mais de 400 milhões de euros” será realizada, contudo, o PSD, por iniciativa de Gonçalo Valente, deputado social-democrata eleito pelo círculo de Beja, havia já requerido uma audição ao presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Re-gional do Alentejo, ao secretário de Estado das Infraestruturas e ao presidente das Infraestruturas de Portugal, de forma a serem obtidas explicações sobre um processo que muitas dúvidas tem levantado, sublinha o parlamentar. Por motivos semelhantes, também o PS solicitou, cinco dias após o requerimento do partido do Governo, uma outra audição, ainda que dirigida a interlocutores diferentes.

 

Texto | José SerranoFoto | Ricardo Zambujo

 

Por iniciativa de Gon-çalo Valente, deputado social-democrata eleito pelo círculo de Beja, o PSD entregou no passado dia 11, na Assembleia da República, um requerimento para uma audição ao presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regio-nal do Alentejo (CCDR Alentejo), ao secretário de Estado das Infraestruturas e ao presidente das Infra-estruturas de Portugal (IP). Em causa está a revisão, em baixa, da dotação indicativa inicial de 80,6 milhões de euros para uma dotação proposta de 20 milhões de euros, no âmbito da medida de reprogramação financeira do Programa Alentejo 2030, nomeadamente, no que diz respeito à valorização da linha do Alentejo e, particularmente, no troço Casa Branca-Beja (recorde-se que o investimento total da empreitada é de cerca de 400 milhões de euros), que, nas últimas semanas, tem suscitado um adensar de dúvidas, inquietações e acusações entre diversas entidades e personalidades políticas da região, colocando-se em causa o comprometimento do projeto pela eventual retirada, ao mesmo, de mais de 60 milhões de euros. Desta forma, a IP aponta à CCDR Alentejo a unilateralidade da decisão, apresentando-a com “um grau adicional” de risco para o projeto. O deputado Gonçalo Valente questiona o rumo dos 60 milhões de euros retirados à dotação inicial, com a distrital do seu partido a acusar o presidente da Comunidade Intermunicipal do Baixo Alentejo (Cimbal) de instrumentalizar a informação sobre o processo. Por seu turno, o responsável por esta comunidade, António José Brito, afirma a necessidade de o Ministério das Infraestruturas clarificar o assunto, salientando que “a eletrificação da linha” não pode continuar a ser “sucessivamente adiada e marcada por incertezas”, e António Ceia da Silva, presidente da CCDR Alentejo, a referir ao “Diário do Alentejo” (“DA”) não ter nada a comentar, uma vez que “a reprogramação ainda não está aprovada em Bruxelas”.

 

A troca de comunicados Da tinta mais recente que o assunto tem feito correr abundantemente assinale-se a dos seguintes comunicados. Dia 14: a Direção Regional do Alentejo do PCP “denuncia e deplora as manobras de ilusionismo político que visam desviar a atenção do que é essencial e alijar responsabilidades mútuas de PS e PSD nos atrasos desta intervenção”, considerando que a decisão de reduzir “em 60 milhões de euros a verba do Programa Alentejo 2030 para esta intervenção foi tomada no quadro da sua reprogramação, com aprovação no Comité de Acompanhamento do Programa”, do qual fazem parte, refere a missiva, a IP, o Governo, “por via de diversos departamentos da administração central”, e as comunidades intermunicipais da região. “É, pois, imperativo”, acentua o documento, “que face às trocas de acusações e manobras, se clarifique qual o pronunciamento em sede de comité de acompanhamento de cada uma destas entidades”, sendo “também importante sublinhar que no momento da decisão (setembro/outubro) não se ouviu uma única palavra por parte do PS ou do PSD”. Dia 15: a Federação do Baixo Alentejo do Partido Socialista, expondo a necessidade de serem esclarecidas e justificadas “as motivações desta revisão das dotações do Alentejo 2030”, transmite que “o Governo da AD continua empenhado em travar ou em adiar a execução de projetos fundamentais para o desenvolvimento do Alentejo” e que “da noite para o dia, e no silêncio dos gabinetes, fazem-se desaparecer milhões de euros” do financiamento “do projeto estratégico de modernização/eletrificação da linha ferroviária do Alentejo”. Exigem ainda os socialistas, na mesma nota de imprensa, que o ministro das Infraestruturas, “sem recurso ao habitual barulho causado pelo seu testa de ferro na região e deputado eleito”, clarifique todo o processo de revisão das dotações financeiras do Programa Alentejo 2030, “ordenado pelo ministro do Planeamento e Coesão que mandou cumprir critérios que ele próprio estabeleceu à CCDR Alentejo”. Também no dia 15, Gonçalo Valente, alegadamente como forma de resposta aos comunicados anteriormente referidos, observou: “PS e PCP estão completamente de cabeça perdida. Deveriam estar contentes por todas as partes envolvidas neste processo irem responder na Assembleia da República às dúvidas que todos temos, mas, não, o receio dos protegidos do PS serem responsabilizados por nos roubarem 60 milhões de euros e o PCP querer fazer prova de vida é mais importante, mostrando, mais uma vez, a sua subserviência ao partido em detrimento da região”. O que interessa, através desta audição, diz o deputado do PSD, é “que as coisas fiquem esclarecidas de forma cabal, olhos nos olhos, doa a quem doer”. Ainda neste dia, 15, pródigo em declarações, a Cimbal, após a reunião ordinária da sua assembleia intermunicipal, emitiu uma “tomada de posição”, na qual os seus eleitos manifestam “preocupação com a retirada da verba de 60 milhões de euros previstos para a requalificação e eletrificação da ferrovia da linha do Alentejo” e consideram como “inaceitável que o Baixo Alentejo possa vir a perder verbas que são fundamentais para a execução deste projeto”, solicitando ao Ministério das Infraestruturas e Habitação e ao Ministério da Economia e Coesão Territorial esclarecimentos sobre como se “prevê a concretização do referido projeto”.A fechar as declarações de segunda-feira, o jornal on line “O Digital” informava que Miguel Pinto Luz, ministro das Infraestruturas e Habitação, à margem da cerimónia de consignação da empreitada de modernização da linha de Vendas Novas, garantiu que a modernização da linha ferroviária Casa Branca-Beja será concretizada, independentemente da redução de financiamento comunitário decidida no âmbito do Programa Alentejo 2030. Esclarecendo que foi a CCDR Alentejo que tomou a decisão “de retirar um conjunto de fundos de um projeto que a IP estava a desenvolver”, não cabendo ao Governo “fazer uma avaliação” sobre essa decisão, o governante afirmou: “Vamos fazer a obra de mais de 400 milhões de euros com a qual estávamos comprometidos. E essa será uma realidade e não fugiremos a essas responsabilidades”.

 

Audição parlamentar: diferentes perspetivas Já em posteriores declarações ao “DA”, Gonçalo Valente acentua o benefício da futura audição requerida pelo PSD – “acredito que a mesma venha a ocorrer em janeiro, dado o carácter de urgência com que foi pedida” –, de forma a se obterem resposta claras, “havendo a hipótese de contraditório entre as partes”, às seguintes perguntas: “Por que é que houve esta reprogramação do Programa Regional Alentejo 2030? Quem é que tomou a decisão desta reprogramação? Para onde é que vão ser canalizados os 60 milhões de euros que a ferrovia perdeu? De que instrumento financeiro chegará essa verba quando atingirmos o grau de maturidade necessário para executar a obra?”. Estas questões, diz o deputado do PSD, permitirão dar oportunidade à CCDR Alentejo, à Infraestruturas de Portugal e ao Governo, “sentados à mesma mesa, de explicarem o que aconteceu”, porque, enfatiza, “alguém aqui não está a falar a verdade”.Também António Car-neiro, deputado do Chega pelo círculo de Beja, concorda, “evidentemente”, com o pedido de audição apresentado pelo PSD, uma vez que “há esclarecimentos a dar”, nomeadamente, por parte do Governo, “que tem a sua responsabilidade política”, e da CCDR Alentejo, “entidade que decidiu a requalificação do programa, conjuntamente com o [a Autoridade de Gestão do] Alentejo 2030”, devendo estas entidades esclarecer “como é que chegaram à decisão de retirar 60 milhões de euros” e “o que é que está a acontecer com esse dinheiro que foi retirado”.Já Pedro do Carmo, deputado do PS eleito por Beja, manifesta o que considera ser a irrelevância da pretendida audição. “Acho que isso não vai trazer nenhuma novidade, não vai esclarecer nada”, diz o deputado socialista, expondo que a clarificação da medida de reprogramação financeira do Programa Alentejo 2030 só acontecerá “após se ouvir o ministro [Adjunto e] da Coesão Territorial, ou seja, quem gere os fundos”, para se perceber em que base assentaram “as orientações técnicas que deu, para que essas alterações fossem efetuadas – e nesse sentido tomarei iniciativas. Tudo o resto são manobras que não visam esclarecer o assunto”, declara.Em consonância com as declarações prestadas ao “DA” por Pedro do Carmo, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista solicitou, no dia 16, a audição do ministro da Economia e da Coesão Territorial, do ministro das Infraestruturas e Habitação e da vogal executiva do Programa Regional do Alentejo, “com vista ao esclarecimento do enquadramento do financiamento da modernização da linha ferroviária Casa Branca- -Beja, dos impactos das opções adotadas na execução do projeto e das medidas previstas para assegurar o cumprimento dos objetivos de coesão territorial e de desenvolvimento regional”.

 

Cuba solicita reunião com ministério e IPA Câmara Municipal de Cuba, na pessoa do seu presidente, João Duarte Palma, solicitou, no dia 16, terça-feira, com carácter de urgência, a marcação de uma reunião com o ministro das Infraestruturas e Habitação e com o presidente da Infraestruturas de Portugal. O objetivo do encontro pretendido será o “de abordar questões consideradas prioritárias no âmbito das acessibilidades rodoviárias e ferroviárias”, nomeadamente, as que dizem respeito à reprogramação da verba prevista no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) para a modernização da Linha do Alentejo, “que resultou numa redução drástica do valor previsto para a intervenção”, o que, tratando-se “de uma infraestrutura determinante” para “o desenvolvimento económico e social do concelho”, muito preocupa “o município de Cuba”, observa o autarca.

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