Um despacho da presidência do Instituto Politécnico de Beja (IPBeja) veio determinar a convocação de “eleições para o conselho geral [CG], de forma a repor a legalidade da sua composição”. Poucos dias depois, o CG emitiu um comunicado em que diz estar “em plenitude de funções, não podendo essa situação, de facto e de direito, ser afetada por despacho da presidente” do IPBeja.
Texto | Marco Monteiro CândidoFoto | Ricardo Zambujo
No passado dia 1, a presidência do IPBeja publicou o despacho n.º 294/PIPB/2025, em que declara a “invalidade administrativa” do CG da instituição. O documento, assinado pela presidente do IPBeja, Maria de Fátima Carvalho, dá conta – depois de elencar os pressupostos de representatividade no CG, constituído por 21 elementos, representantes dos docentes (11), dos estudantes (três) e do pessoal não docente (um), mas também “personalidades externas de reconhecido mérito não pertencentes à instituição, com conhecimentos e experiência relevantes para o instituto” (seis) –, que, neste momento, e desde 9 de dezembro de 2024, a composição do CG “não respeita as exigências vertidas na lei e nos estatutos, não estando assegurada nem respeitada a imposição de que os representantes dos professores e dos investigadores sejam mais de metade do número total de membros do órgão”.
Dezembro de 2024 Para compreender o fundamento do despacho da presidência do IPBeja de setembro de 2025 é necessário recuar cerca de 10 meses, até início de dezembro de 2024. Recorde-se o que foi publicado no “Diário do Alentejo” (“DA”) no final desse mesmo mês, a esse propósito: “A reunião do passado dia 9 do conselho geral do Instituto Politécnico de Beja ficou marcada pela renúncia de três dos quatro elementos efetivos (mais os quatro suplentes) que representavam a Escola Superior de Tecnologia e Gestão (Estig) naquele órgão. O motivo? A recusa, pelos seus pares, de cooptação da pessoa apresentada pela lista. Elementos que a constituem dizem que a decisão ‘fragiliza a posição do órgão prejudicando a sua dignidade e a do próprio IPBeja’.
O presidente interino do conselho geral [o docente da instituição, Rogério Ferrinho] refere que ‘a Estig não deixou de ter representação’ e que o órgão ‘tem condições para funcionar’”. Em resumo, na altura, foi isto que aconteceu.
Foi já na segunda semana de janeiro deste ano que as seis personalidades cooptadas (e externas à instituição) tomaram posse, integrando o novo conselho geral do IPBeja, formado no final de 2024. E foi desse grupo que saiu o atual presidente do órgão, Nuno Canada, que exerce funções de presidente do conselho diretivo do Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (Iniav) desde 2013.
Setembro de 2025 Feito que está o resumo dos acontecimentos que envolveram o CG do IPBeja no final de 2024 e no início de 2025, avancemos até ao presente. Segundo o despacho da presidência da instituição de ensino superior, é, precisamente, por não ter sido resolvido, no tempo que decorreu até agora, a questão da representatividade dos docentes e investigadores no CG – “carecido da representatividade de uma das escolas do instituto” –, “semelhante circunstância inquina a legalidade de todas as deliberações do conselho geral que sejam tomadas sem que na sua composição seja respeitada a exigência legal (…)”.
No documento é sublinhado que “é de todo insustentável” que a situação assim se mantenha, com a presidência liderada por Maria de Fátima Carvalho a referir que o CG foi “informado da necessidade de respeitar a exigência vertida na lei para a sua composição e para a ilegalidade das decisões tomadas com uma composição não respeitadora dessa mesma lei” através de “diversas comunicações”.
Em jeito de conclusão, e “não tendo sido reposta a legalidade da composição” do CG – que tem continuado a reunir sem atender a esse pressuposto, segundo o despacho emanado –, a “decisão de convocar novas eleições” será a “única forma de suprir a irregularidade da composição do conselho geral e restabelecer a regularidade do seu funcionamento”, acrescentando ser o que está previsto nos estatutos do IPBeja, e que “mereceu a concordância da tutela”, ou seja, do Ministério da Educação, Ciência e Inovação.Entretanto, na noite da passada segunda-feira, dia 8, o conselho geral do IPBeja enviou um comunicado, ao qual o “DA” teve acesso, à comunidade académica da instituição, dando conta que se encontra “nos termos legais, estatutários e regimentais aplicáveis, em plenitude de funções, não podendo essa situação, de facto e de direito, ser afetada por despacho da presidente” do IPBeja. Acrescenta ainda que, durante este mês, deverá iniciar-se o processo eleitoral para a presidência do IPBeja, tendo inclusivamente, enviado para a referida presidência, em julho, o correspondente “calendário eleitoral e a comissão de acompanhamento”.
Quanto à situação da representatividade no CG, este sublinha que, também em julho, terá solicitado à presidência do IPBeja que “fossem repetidas as eleições na Estig, ”, com vista à substituição dos membros que renunciaram ao CG, não obstante a sua legitimidade e dinâmica não serem afetadas, fruto do número de elementos e do modelo de decisão do mesmo. No entanto, mesmo assim, segundo o comunicado, entendeu o CG dar à Estig oportunidade “de completar a sua representação, dando assim um sinal de boa vontade e de procurar contribuir para uma dinâmica positiva e saudável”.
O comunicado do CG conclui, dizendo que “já deu conhecimento à tutela do despacho n.º 294/PIPB/2025, de 1 de setembro, fundamentando a ausência de legalidade do mesmo, bem como da deliberação deste conselho comunicada à presidência do IPBeja para que o processo eleitoral” da presidência da instituição “tenha início neste mês de setembro”. E acrescenta que a “sustentabilidade do IPBeja” poderá ser colocada em causa com a ausência de “uma dinâmica positiva, solidária e construtiva entre os diversos órgãos, as diferentes escolas e todo o pessoal docente e não docente, sendo responsabilidade da equipa de gestão do IPBeja fazer o que estiver ao seu alcance para este desígnio”.
O que dizem os intervenientes? O “DA” tentou contactar o presidente do CG, Nuno Canada, no sentido de perceber os contornos da questão que opõe o órgão presidido por si e a presidência do IPBeja, obtendo a resposta, por e-mail, de que não teria “novos elementos a acrescentar em respeito à comunicação interna desta semana”.Maria de Fátima Carvalho, a propósito das duas visões distintas da situação, referiu ter “muito pouco a dizer acerca desse tema”, sublinhado que apenas lhe compete, enquanto presidente do IPBeja, “propor a legalidade da instituição a partir dos estatutos”, não comentando “e-mails das outras pessoas”. “A presidência verificou uma ilegalidade do conselho geral. Advertiu várias vezes para essa ilegalidade o próprio conselho geral e atuei de acordo com os estatutos, mais nada. Não posso dizer mais nada”.
Sobre a posição do Ministério da Educação, Ciência e Inovação, Maria de Fátima Carvalho assegura que “a ilegalidade foi posta à tutela, a tutela respondeu e nós demos-lhe a solução que apresentámos. Eles concordaram e nós avançámos com o despacho”.Sobre o facto de se terem passado cerca de 10 meses entre a situação, propriamente dita, e o despacho agora publicado, a presidente do IPBeja reitera que o CG “foi várias vezes advertido da situação” e que “teve nove meses para repor a situação”. Não o tendo feito, Maria de Fátima Carvalho refere que cabe “à presidente atuar de acordo com os seus poderes e para que a legalidade exista na instituição”. Acrescenta ainda, quando questionada, que não há qualquer impasse neste momento. “Está lá dito no despacho o que é que eu vou fazer. É claro que eu vou marcar as eleições, como é óbvio. O despacho está dentro das competências da presidente e a presidente vai atuar de acordo com o que disse no despacho. Não tenho mais nada a dizer”.
Por fim, e sobre se esta situação poderá ter algum impacto no momento das eleições para a presidência do IPBeja, previstas para o final deste ano, Maria de Fátima Carvalho diz que sim, já que tudo “é em sequência”. No entanto, termina, acentuando: “O meu mandato previa-se acabar no final do ano. Mas é bom que fique bem claro: o conselho geral é que não repôs a legalidade. Não é a presidência que tem a culpa. Entendamo-nos bem no meio disto”.